TROPA DE ELITE: A CARA DA SOCIEDADE BRASILEIRA
O filme “Tropa de Elite”, do cineasta José Padilha, teve grande repercussão na época do seu lançamento, em 2007, sobretudo depois que cópias piratas chegaram às ruas, mesmo antes da sua estréia no circuito comercial. Na época, uma pesquisa realizada pelo Ibope apontou que cerca de 11 milhões de brasileiros já teriam assistido ao filme a partir do acesso a uma das milhares de cópias piratas que enchiam o mercado de todo o país. Segundo o Datafolha, 77% dos moradores de São Paulo já conheciam o filme.
O vazamento para o mercado pirata e para a internet não foi suficiente para acabar com a ansiedade do público e o “Tropa de Elite” estreou no circuito comercial em primeiro lugar, mostrando uma excelente performance nas bilheterias de todo o país. Em apenas quatro dias nas salas de cinema, o filme já havia sido visto por mais de 950 mil brasileiros desde a sua estréia no dia 12 de outubro.
Na primeira semana de exibição já registrava uma das maiores médias por sala no ano, com mais de mil espectadores por sala, somente no Rio de Janeiro e em São Paulo. Na época o Datafolha realizou uma pesquisa e constatou que a opinião pública achou o filme bom: 80% dos entrevistados o avaliavam como ‘excelente’ ou ‘bom’.
A crítica internacional e nacional também valorizaram bastante o trabalho do cineasta José Padilha. Tropa de Elite ganhou o ‘urso de Ouro’ de melhor filme, no Festival de Berlim (2008). Também foi considerado o melhor filme no Festiva hola Lisboa (2008) e conquistou o Grande Prêmio Vivo do Cinema Brasileiro (2008). Arrebatou tudo (ou quase tudo): melhor direção (José Padilha), melhor ator (Wagner Moura), melhor ator coadjuvante (Milhem Cortaz), melhor fotografia (Lula Carvalho), melhor maquiagem (Martin Macias Trujillo), melhor montagem (Daniel Rezende), melhor som (Leandro Lima, Alessandro Laroca e Armando Torres Jr.), melhores efeitos especiais (Phil Neilson e Bruno Van Zeebroeck) e melhor longa metragem nacional.
Retrato dos problemas brasileiros
O filme, na verdade, é semelhante a tantos outros trabalhos que focam suas câmeras no registro da violência urbana. Tropa de Elite não foge à regra e nesse enredo nada pacífico, mostra as ações também nada amistosas do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e da Polícia Militar do Rio de Janeiro.
Depois de assisti-lo atentamente, por duas vezes, faço questão de emitir a minha opinião sobre o mesmo, embora não seja eu um especialista em crítica cinematográfica. É um trabalho bem elaborado do “novo cinema social brasileiro” e chamou tanto a atenção porque retrata, justamente, muito dos problemas sociais que afligem a população.
Lembro-me que antes do burburinho de Tropa de Elite, frissons semelhantes ocorreram anos atrás, quando dos lançamentos de outros filmes com temáticas parecidas. Foi assim em 2002, com o “Ônibus 174” (também dirigido pelo cineasta José Padilha), um documentário sobre o sequestro de um veículo coletivo na zona sul do Rio de Janeiro, em 12 de junho de 2000. O fato voltou a se repetir no mesmo ano, com a estréia de “Cidade de Deus”, dirigido por Fernando Meirelles, que aborda a exclusão social e o tráfico de drogas nas favelas brasileiras.
Não há como negar que Tropa de Elite é um dos melhores filmes nacionais dos últimos tempos. Ao procurar discutir abertamente e sem meias-palavras as questões-tabus do nosso cotidiano e os assuntos incômodos que afligem a todos os brasileiros - como a violência, o desrespeito às leis, o abuso da autoridade, a violência praticada contra crianças e adolescentes, o tráfico e o consumo de drogas por parte das classes média e alta brasileira - o filme deixou muita gente perplexa e sem fôlego, principalmente àquelas que sempre fizeram questão de ignorar tudo isso e admitir apenas a existência de um mundo que na verdade é irreal. O filme mostra todas essas verdades e por isso choca, constrange, gera comentários.
Outras verdades que não podem continuar sendo escondidas, a exemplo da violência desmedida e a corrupção na corporação policial, também são mostradas. Porém, não há como negar que maus profissionais existem e problemas dessa natureza ocorrem em todos os segmentos. Cabe ao Estado e as corporações construírem os mecanismos legais para afastar os maus profissionais das repartições públicas, da Polícia e do nosso convívio.
O melhor de tudo é que o filme nos convida a refletir sobre o momento social pelo qual o país passa; convida-nos a discutir a fragilidade e a quebra das relações familiares. Leva-nos a observar criticamente a hipocrisia da sociedade, que não admite que o usuário de drogas é um financiador direto dos grupos e das organizações criminosas que comandam o tráfico e patrocinam a violência.
Na época do lançamento do filme, as cenas em que há uma crítica clara aos usuários de substâncias ilícitas, atribuindo-lhes a culpa pela expansão do tráfico de drogas e da violência urbana, geraram um grande debate. A maioria contestava o ponto de vista do cineasta. Mas Padilha está certo! Isso está claro e a sociedade precisa entender de uma vez por todas que quem consome drogas ilícitas está (mesmo) colocando dinheiro nas mãos dos traficantes e avalizando as ações de violência.
Concluímos que este trabalho prende o telespectador pela emoção que passa. É uma peça artística que nos convida à reflexão e (ainda) pede um urgente debate sobre a ausência de políticas públicas de segurança e de controle do crime organizado, de educação, de saúde e de assistência social; um conjunto de ações que pode mudar esse quadro. Pelas verdades mostradas, Tropa de Elite tornou-se um dos filmes brasileiros mais comentados nos últimos trinta anos.