“As margens de um crime” (In the eletric mist)
“As margens de um crime” (In the eletric mist)
Crime é esse titulo, sinceramente.
Um filme de Bertrand Tavernier, com Tommy Lee Jones, John Goodman, Peter Sarsgaars, Mary Steenburgen, Ned Beatty e o próprio Bud Guy interpretando um violeiro proscrito do Mississipi, e etc., com esse titulo, sinceramente, e o espectador corre o risco de sequer chegar na margem da prateleira dos lançamentos.
Estamos aqui para servir a causa. Ou nas palavras do próprio Peter, como um famoso ator de cinema bebum falando para a filha do Tommy Lee: pessoas precisam de segurança tanto quanto precisam do que o cinema lhes oferece.
Sampa, cine Belas Artes, 1981. Quando conheci o trabalho do senhor Bertrand Tavernier. Tratava-se de uma mostra de cinema francês. Sujeito sério.
“In the eletric mist”, Tavernier usou a fita métrica dos alfaiates e nos deu um policial noir sob medida, com todas as cores das cercanias de Nova Orleans e seus pântanos.
A última vez que fizeram um policial desse naipe foi “A Piscina Mortal”, com Paul Newman, em 68. Bom para a época, hoje um tanto datado, não faz sombra sobre a vestimenta do Bertrand.
Tommy Lee encena o detetive com alguns pensamentos na primeira pessoa do singular e muita determinação.
John Goodman está na outra ponta, vestindo a carapuça do ex mafioso nativo que foi e voltou como “produtor de cinema”.
Meninas são aliciadas para a prostituição e desaparecem. Quando reaparecem, estão desmembradas. Na linguagem elegante proposta o espectador é poupado das cenas. Menções, uma aqui outra ali. Mais as menções de crimes antigos e de antigas traições. A cultura noir investiga filosofando.
“Vou te dizer as duas maneira de lidar com a idéia de compreensão”, diz Tommy Lee para a mulher, na beira do lago:
1. Se você não olhar, nunca verá.
2. Se você olhar um pouco menos, verá muito mais.
Planos e ou enquadramentos perfeitos, câmeras sem zigue zague, trama bem bolada deslizando num roteiro sem deslize.
É o que se espera na meia idade. Filme noir refrigerado, os clichês estão ali como ingredientes de um prato típico. A questão é como dispô-los para somar, não cansar e ainda por cima despertar interesse. Conseguiram. Baseado no livro “In the eletric mist with the confederate dead”, de James Lee Burke, dada altura a fala do começo fará um enorme sentido: os mortos passam a reivindicar, com tanto direito quanto os vivos.