O GURI - CHICO BUARQUE
Existem poucos poetas capazes de emocionar tanto quanto Chico Buarque. Unanimidade nacional, o velho Chico, já pelos sessenta, continua no batente, fazendo shows de norte a sul do país, com seu jeito tímido e suas canções inesquecíveis. Uma delas, "O guri", de 1981, continua emocionando platéias onde quer que seja entoada. Lembro como se fosse hoje o dia em que a ouvi de "verdade" pela primeira vez. Digo de verdade porque "O guri" é aquele tipo de música que não pode ser ouvida somente com os ouvidos, ela precisa ser ouvida com o coração. Como a maioria das pessoas, eu conhecia o refrão grudento "olha aí, é o meu guri, olha aí/olha aí, é o meu guri", mas nunca havia prestado atenção na letra como um todo. Confesso que me deu um nó na garganta quando finalmente compreendi que a música conta a história de uma mãe pobre e analfabeta que vê a foto do filho na primeira página de um jornal e fica toda orgulhosa, sem saber que ele, na verdade, foi assassinado e jogado no matagal, por ter se tornado marginal. A inocência daquela mãe que não percebe (ou não quer perceber?) que o único filho vai aos poucos descambando para a marginalidade é tocante. Chico Buarque sabe, como poucos, dizer tudo sem ser explícito, utilizando a sua sensibilidade de poeta para nos fazer refletir. É a arte em seu estágio mais sublime. Se você ainda não ouviu "O guri" com o coração, faça isso. Garanto que você também vai se emocionar.