MAI, A GAROTA SENSITIVA volume 1: fuga desesperada
MAI, A GAROTA SENSITIVA volume 1: fuga desesperada
Miguel Carqueija
Esta edição não parece um mangá, pelo aspecto sujo das páginas parece mais umas antigas revistas brasileiras de terror. Além disso a leitura é da esquerda para a direita, ou seja, a editora brasileira não seguiu o formato original como se usa no Japão.
Eu comecei tardiamente a acompanhar o fenômeno dos mangás, por isso não tive conhecimento direto dos detalhes, quando essas publicações começaram a sair no Brasil. Com certeza, em 1992 mangá no Brasil ainda era uma novidade.
Outra coisa que, a meu ver, torna esse mangá estranhável, é o estilo da história e os traços ocidentalizados. Não temos aqui aqueles desenhos facilmente reconhecíveis como japoneses, parecem mais os “comics” norte-americanos ou até os faroestes italianos.
O enredo fala de uma adolescente dotada de poderes telecinéticos sendo perseguida por uma organização secreta. Faz lembrar o filme “As chamas da vingança”, com Drew Barrymore, que protagoniza uma jovem caçada pelas forças de segurança dos EUA por causa de seu poder pirocinético. A diferença é que Mai Kuju, de 14 anos, é perseguida por uma sociedade secreta, a Aliança da Sabedoria (sic), que aparentemente tem grande domínio sobre o mundo. Isto é, aliás, um clichê muito comum nessas histórias de situações extremas: um grupo secreto e com grandes poderes paranormais ou tecnológicos ou bélicos que controla em grande parte os acontecimentos: a Umbrella de “Resident evil”, a Dokuseisha ou a Biblioteca Britânica de “ROD”, as “manzonas” de “Capitão Harlock”, a Garra da Pantera de “Cutie Honey”, ou até a Caos na série cômica do Agente 86.
A história já adianta que Mai é herdeira de um poder milenar da família Mihiro, que passa apenas pelo ramo feminino, e que Maki, mãe de Mai, morreu por causa desse poder.
Resenha do volume 1, com seis episódios, do mangá “Mai, a garota sensitiva”, de Kazuya Kudo (roteiro) e Ryoichi Ikegami (arte). Editora Abril, São Paulo-SP, 1992. Editora Shogakukan, Japão, 1988.
“Papai, o senhor nunca se dispôs a me contar nada sobre ela, apesar de todos os meu pedidos.”
(Mai Kuju, diante da sepultura de sua mãe.)
“Papai, quem eram aqueles homens? Por que atacaram a gente? Era atrás de mim que eles estavam? FALE, pai!”
(Mai Kuju)
Mai é órfã de mãe e a personagem mais simpática da trama. Seu pai, Shuishi Kuju, me parece um imbecil, pois não conta à menina as coisas que ela deveria saber para sua própria segurança. Ele foge com ela e faz de tudo para protegê-la, mas evita responder às insistentes perguntas de Mai, que inclusive teve de deixar tudo para trás, até a escola e suas colegas. Isso é irritante. E pelo jeito não adianta recorrer à polícia: essas organizações secretas são tão poderosas que até as autoridades constituídas se submetem; mais adiante é a própria polícia quem bloqueia os caminhos na tentativa de cercar Mai e seu pai, para espanto de um policial ao saber que estão atrás de uma menina. Os agentes que perseguem a dupla são da Kaieda Pesquisa de Informações, organização associada à Aliança da Sabedoria.
Shuishi conhece artes marciais desusadas há 300 anos, fato que chama a atenção do sinistro Senso Kaieda, um velho que pratica artes de samurai e é impiedoso. Ao identificar a técnica de luta de Shuishi como “tokaguchi”, deduz que fugiram para o santuário (budista, ao que parece) de uma região montanhosa.
O dado mais grotesco, porém, é o monstro humano conhecido como Tsukiro, um humanoide selvagem de uns 5 metros de altura, mantido prisioneiro nos subterrâneos do cais de Harumi, em Tóquio (???). Kaieda, que consegue controlar o monstro, não tem escrúpulos em utilizá-lo na caça a Mai e seu pai. É tudo porém muito inverossímil, e eu imagino que algumas coisas serão mais explicadas em volumes posteriores.
Anotando que Kaieda, apesar de todo o seu poder, parece chefiar apenas a tal Kaieda, estando abaixo da Aliança da Sabedoria, cuja sede é nos Alpes Suíços e cujo chefe parece ser um sujeito careca de tapa-olho.
Em tempo: as hostes de mal só têm homens como agentes (todos de paletó, menos Kaieda com sua túnica de monge) e a história não tem o menor traço de humor, é mortalmente séria e em estilo mais norte-americano que japonês.
Rio de Janeiro, 21 e 22 de março de 2023.