ESCRAVA MÃE E REFERÊNCIAS A OUTRAS OBRAS

Ambientada no século XIX, a telenovela Escrava Mãe, de autoria de Gustavo Reiz e exibida pela RecordTV em 2016, é uma pré-sequência da telenovela A Escrava Isaura, da mesma emissora, exibida em 2004, ambas baseada no romance A Escrava Isaura de Bernardo Guimarães, publicado em 1875.

Além das referências à telenovela A Escrava Isaura, como a pensão em que todas as mulheres têm nomes de flores, a escrava que tem inveja da protagonista, o escravo que alimenta uma paixão não correspondida pela também protagonista, Escrava Mãe apresenta, de acordo com a minha interpretação, várias referências a outras obras literárias, como serão descritas a seguir.

Logo no início da produção, podemos perceber o romance de Teresa de Avelar e Guilherme Gomes do Amaral ao estilo Romeu e Julieta, de Shakespeare, mas sem o final trágico, pois suas famílias são rivais. Falando em Teresa de Avelar, a personagem é coxa, ou seja, possui uma deficiência na perna, o que pode nos lembrar a Eugênia, personagem do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, que também apresenta deficiência similar.

Outra obra literária que pôde ter sido referenciada em Escrava Mãe é A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo, personificada em Tomás Gomes do Amaral, que é inconstante no amor, assim como Augusto do referido romance que possui as mesmas características.

Além da Literatura, a telenovela apresentou personagens históricos como Catarina Gama de Luccock, que era escrava e se tornou condessa ao se casar com um conde. Tal personagem pode estar relacionada a Chica da Silva, uma escrava que foi comprada por um comendador e contratador de diamantes, de acordo com registros, Chica não chegou a se casar oficialmente com o comendador, mas usufruiu do luxo da elite e conseguiu distinção social.

Filipa Gomes do Amaral, filha do coronel Quintiliano, costuma se vestir de homem e sair escondida de casa. Tal personagem lembra Maria Quitéria, uma das heroínas da guerra da Independência do Brasil na Bahia, que se vestiu se passou por homem para entrar nas Forças Armadas, tornando-se a primeira mulher a entrar no Exército. O nome da personagem também pode ser uma referência a Maria Felipa de Oliveira, também relacionada à Independência da Bahia, em que há uma narrativa tida como fato histórico que conta que Maria Felipa liderou um grupo para lutar contra os soldados portugueses, resultando em embarcações queimadas e na famosa surra de cansanção que deram nos soldados, fato que permanece no imaginário popular até hoje.

Nos capítulos finais, apareceu o Cavaleiro da Mancha, uma pessoa misteriosa que resgata os escravizados das fazendas e leva para um quilombo. Logo de início, parece ser uma referência o Dom Quixote de La Mancha, obra de Miguel de Cervantes publicada em dois volumes, em 1605 e 1615, com a diferença de que o Cavaleiro da Mancha da telenovela não é derrotado e espancado nos embates como acontece com Dom Quixote e não tem um ajudante como Sancho Pança.

Além desse, Quasímodo, um personagem do romance O Corcunda de Notre-Dame, de autoria de Victor Hugo e publicado em 1831, é coxo e corcunda, características que ocasionaram no abandono por parte dos seus pais na porta da Catedral de Notre-Dame, sendo adotado pelo arquidiácono. Na telenovela, é referenciado na figura de Belchior, um homem que ajudar uma menina a se esconder na floresta e possui características semelhantes, sendo também uma possível referência ao personagem de mesmo da telenovela A Escrava Isaura, da mesma emissora, exibida em 2004.

Enfim, como exposto acima, a telenovela conecta bem o contexto da produção com as referências literárias, tornando-se assim muito atrativa e provocando a curiosidade em ler as obras originais.

Evaí Oliveira
Enviado por Evaí Oliveira em 23/01/2022
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