Deathdisco: violência surreal

Se há algo que chama a atenção no mangá Deathdisco, de autoria de Atsushi Kaneko, é a violência insana e surreal que permeia toda a história. A narrativa começa quando dois chefões do submundo estão negociando e um alerta o outro (que está ficando ambicioso demais e esmagando seus oponentes) que ele se tornou alvo da Guild, uma organização criminosa que recruta assassinos, chamados de reapers*, para eliminar um determinado alvo, o qual é denominado “cabeça”.

O que logo vemos em seguida são cenas que prendem a atenção: os reapers, usando fantasias bizarras, vão aparecendo com a intenção de eliminar a cabeça. Seus métodos assassinos são os mais inusitados mas, como toda história que tem um protagonista, esta também não poderia ficar sem um e a reaper protagonista é uma menina sinistramente esquisita, chamada Deathko, que aparenta ter entre dez e doze anos, tem uma aparência gótica, com cabelo metade negro e metade branco, o que a deixa meio parecida com a Cruela de 101 dálmatas e anda vestida de negro, carregando uns balões negros e acompanhada de um morcego de pernas muito compridas.

Deathko, como os outros reapers, usa métodos insanos para ceifar a cabeça. Ela também odeia a tudo e todos e não desiste até eliminar o alvo, valendo-se de todo tipo de dispositivo, como bonecas explosivas e objetos afiados escondidos em brinquedos. Ela vê os demais reapers como estorvos e detesta vê-los em seu caminho, fazendo de tudo para afastá-los, como usar inseticida para deixa-los tontos.

Porém, logo após matar, a menina cai numa espécie de letargia ou depressão e não come nem dorme, só se animando quando a Guild anuncia que ela recebeu a missão de eliminar uma nova cabeça.

Neste mangá cheio de esquisitices, Deathko vive em um castelo sombrio que parece saído de um filme do conde Drácula junto com uma senhora grotescamente obesa que vive sentada em um sofá cercada de caixas de pizza e outras comidas nada saudáveis e um mordomo que é encarregado de leva-la e trazê-la de volta das missões assassinas. Esse mordomo, aliás, parece uma versão caricaturada do conde Drácula, pois tem uma cabeça enorme e desproporcional em relação ao corpo diminuto.

Os três vivem uma relação estranha. A menina, Deathko, diz que odeia os dois e a mulher, chamada Madame M, diz que Deathko é apenas um lixo inútil que só serve para matar e que, fora isso, é um corpo inerte. O mordomo, chamado Lee, considera a menina um fardo que só lhe dá trabalho.

Se há algo que, além da violência extrema, chama a atenção nesse estranho mangá, é o fato de que não termos simpatia especial por ninguém. A gente quer saber o que vai acontecer, claro, mas não torcemos para Deathko matar a cabeça nem para que o alvo escape. Como os alvos selecionados pela Guild (pelo menos nos dois volumes lançados no Brasil) são bandidos e pessoas de péssimo caráter, também não torcemos para que escapem da fúria assassina de Deathko ou de qualquer outro reaper. Queremos, simplesmente, saber como vai terminar.

Também ficamos curiosos para entender que relação Deathko tem com Madame M e Lee. Como a mulher e a menina se encontraram? Pensamos nisso principalmente porque Madame M parece saber bastante sobre como a Guild funciona e diz que não cuida de Deathko, simplesmente a contratou.

Entre as qualidades de Deathdisco, podemos mencionar o ritmo ágil, o traço do desenho e o suspense que sentimos ao término dos volumes. Entretanto, os diálogos são um pouco superficiais, o que pode desagradar ao leitor mais exigente. Quanto aos personagens, não sentimos simpatia por eles. Não há mocinhos e vilões. Não simpatizamos com as cabeças, por serem bandidos, nem com os reapers, por agirem movidos por motivos escusos.

Assim como Pulp fiction, de Quentin Tarantino -um filme onde todos os personagens eram bandidos – Deathdisco só tem personagens de caráter duvidoso e a própria protagonista não é exceção. Quando não está na ativa, parece apenas uma menina mórbida e doentia, que exala uma aura sinistra. Mas, quando mata, ela faz jus ao título de reaper, personificando a morte.

*reaper significa ceifador em inglês. Usamos o termo ceifador para nos referir à imagem da morte como um esqueleto com uma foice.

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