COTIDIANO
Maria Joaquina chegou em casa afogueada com o rosto em brasa por causa do calor infernal que estava fazendo naquele fim de manhã. Sentada na primeira cadeira que encontrou, gritou a plenos pulmões para que Amélia lhe trouxesse um copo d’água bem gelada e mais uma garrafa, porque um copo não seria suficiente para abrandar o mal-estar.
Enquanto sorvia já em pequenos goles, o terceiro copo d’água geladíssima com cubos de gelo dentro, despejou quase num só fôlego toda a maratona que fora sua ida ao centro da cidade.
- Você sabe Amélia que eu não gosto de sair de casa, principalmente numa sexta-feira, mas eu tinha que ir buscar os aviamentos para as roupas que terei que entregar amanhã que é o dia da festa da padroeira.
O centro estava um horror. Gente saindo pelo ladrão em todas as lojas da Rua do Comércio. Quando terminei as compras fui para o ponto do ônibus e só consegui subir no terceiro.
Parece que todo mundo resolveu sair de casa hoje.
Quando desci no ponto, lá em baixo a rua estava movimentada como se fosse véspera de Natal.
O Soldado Valério, com aquela barriga enorme, plantado no meio da rua, apitando como um desesperado para todo mundo, como se a gente fosse automóvel para obedecer aos apitos dele.
O caminhão de Zé Francisco carregado com material para a feira, estava parado na porta do Bar de Almeida, atravancando o trânsito naquela rua estreita como diacho onde os carros não podem passar dos 40km por hora, se não o Soldado Valério multa na hora.
Eu acho que ele gasta um talão daqueles por dia.
Aqueles meninos de Dona Gertrudes, que mais parecem uns gorilas grandes, gordos e fortes, estavam fazendo o descarrego do caminhão e Neco da verdura levando as caixas para dentro do bar na maior preguiça do mundo, parou para ver aquela sirigaita desocupada, a Lilinha, com aquele cachorro fedorento preso numa guia fininha, com a roupa apertada que, eu tenho certeza, precisou da ajuda do corpo de bombeiros para poder vestir e aqueles peitos de vaca turina quase do lado de fora da blusa e os bestas dos homens, todos, parando para ver ela desfilar com um salto tão alto e fino que eu não sei como aquela criatura consegue se equilibrar. Só mesmo pela graça de Deus.
Quem estava na porta do bar era aquele morador de rua que de vez em quando vem aqui pedir comida e você dá.
Estava bêbado feito um gambá e ficou parado na com a cara de besta, olhando para a bunda de Lilinha.
Eu vou tomar um banho antes de almoçar, porque eu tenho coisa mais importante para fazer do que comentar a vida dos outros...
Você já almoçou?