Uma pequena santa moderna

UMA PEQUENA SANTA MODERNA
Miguel Carqueija

Resenha do livro condensado “Os olhos de Janis Babson”, de Lawrence Elliott, publicado na revista “Seleções” (edição brasileira da publicação norte-americana “Reader’s Digest”) de novembro de 1963. Editora Ypiranga S.A., Rio de Janeiro-RJ.

Esta é a envolvente história real de uma menina católica do Canadá, e a família morava no subúrbio de City View, em Ottawa. O pai de Janis era soldado da Polícia Montada. A família era grande: o pai, Ruby, a mãe, Rita, e cinco irmãos: Charmaine, irmã mais velha, e mais Roddy, Karen, Timmy e Sally.
A família era muito feliz até a chegada da leucemia em Janis. A narrativa segue então ao longo dos poucos anos que restam à menina. É o relato pungente da cruz de uma pequena santa, que trouxe alegria ao mundo em sua curta vida e aceitou a morte com a força de sua fé.


“Tinha apenas oito anos quando se soube a triste notícia. Entretanto, no tempo de vida que lhe restou, acumulou um legado muito maior do que poderia imaginar. Pungente viagem ao coração de uma meninazinha extraordinária.”

Estas linhas introduzem à história que começa no inverno de 1959, no mês de janeiro (inverno, é claro, no hemisfério norte).
Janis era muito religiosa, com aquela alegria típica das pessoas católicas. Estava no terceiro ano primário e disputava o primeiro lugar da classe com Elizabeth Hayes. Havia sua melhor amiga, Tricia Kennedy, que morava na mesma rua, onde também existiam Suzie e Ronnie, e o colégio (Escola São Nicolau).
Segundo o autor do livro, Janis “Preocupava-se em saber se os passarinhos tinham o que comer no inverno, e pensava na avó, lá longe, em Fort William”. E sabia dizer coisas bonitas:
“Por que é que as pessoas têm de ser ruins umas para as outras? Eu gostaria de ser a melhor amiga para todo o mundo.”
O drama se desenvolve de forma gradual. A leucemia avança aos poucos e parece recuar con o tratamento intensivo. Aos poucos também Janis vai se desapegando até compreender enfim qual o seu mal, pois a meu ver erradamente, procuraram ocultar. A coragem da garota é notável diante da morte próxima.
Nunca é demais lembrar que ela era católica e portanto, apesar da pouca idade, acreditava em Deus, na redenção trazida por Jesus Cristo, portanto ela cria em um sentido para a vida.
Ela tinha até força para dar força às outras crianças.
Foram anotadas diversas frases marcantes da menina:


“Estou começando a me sentir um paliteiro. Mas quando se vira a cara para o outro lado e se pensa em outra coisa, quase não dói.” (sobre as enfermeiras que frequentemente tiravam sangue de seus dedos)

“Santa Teresa é minha irmã mais velha no Céu, assim como você é minha irmã mais velha na terra.” (para Charmaine)

“Não fique triste. Eles estão agora no Céu. Devem estar felizes.” (diálogo com a mãe, referindo-se a pequenos amigos que conheceu no hospital)

“Neste momento estou chorando pelos meus queridos, muito queridos pais, pois sinto muitas saudades aqui no hospital. Acho que nunca mais na vida vou deixar passar pela minha cabeça um mau pensamento a respeito deles, porque agora sei o amor que lhes tenho.” (de seu caderno)

“Se vier alguém e eu estiver dormindo, não vá embora!” (de um papel que ela colocou no peito antes de cochilar no hospital, já na última fase)

“Eu tenho rezado tanto para melhora, mamãe, e nunca entendi porque não melhorava. Agora sei... é porque não era da vontade de Deus que eu melhorasse. Ele me quer.”

As últimas palavras desta santa menina parece terem sido estas:

“Ai, isto será o Céu? Mamãe! Papai! Venham depressa!”

O que terá visto Janis logo antes de morrer?
Ela doou seus olhos e este exemplo, que repercutiu na mídia, resultou em que o Banco de Olhos de Ottawa passou a receber muitas doações: “inspirados pela doçura e bondade de uma menina, os homens e mulheres de Ottawa tomam a iniciativa que um dia dará vista a muitas centenas de pessoas cegas.”
Curiosamente, segundo a revista, trata-se da “condensação de um livro a ser publicado brevemente” e não já publicado como o usual. Mas a revista é de 1963.
Estará Janis Babson, algum dia, nos altares?

Rio de Janeiro, 14 de novembro de 2019 e 6 de janeiro de 2020.