“As guerras do Brasil” e o resgate da História
“As guerras do Brasil” é o título de uma minissérie documentário da Netflix que deve ser vista por todos os brasileiros. São cinco episódios curtos, que nos apresentam pontos de vista que não correspondem à História oficial sobre cinco temas: a colonização e o massacre dos povos originários (os indígenas); a escravidão e o massacre dos negros; a Guerra do Paraguai; a revolução de 1930 que marcou o fim da “República Velha”; a “universidade do crime”, como é chamada a formação de falanges e comandos de criminosos no sistema previdenciário em vigor no país. A seguir algumas passagens desses episódios.
Sobre os povos originários, cuja população poderia chegar a quarenta milhões, e que até hoje chamamos de índios, que para os colonizadores povoariam as Índias, o documentário nos relata como foram vítimas até de inéditas guerras biológicas, dizimados pela varíola e outras doenças propositalmente disseminadas. E o papel dos bandeirantes, heróis oficiais que na verdade eram mercenários cruéis a serviço de inescrupulosos e ambiciosos poderosos.
Sobre a guerra aos negros trazidos da África, o documentário relata o esforço de exterminar os quilombos que se formaram após a “invasão” holandesa, que chegaram a reunir dezenas de milhares de negros foragidos e livres em bem organizadas comunidades. Os negros, essenciais para a economia da cana de açúcar, não eram considerados gente, mas animais de serviço.
Sobre a Guerra do Paraguai, episódio que me pareceu que poderia ter sido melhor esclarecido, nos relata o papel do Brasil ao dar início à guerra, quando interveio no governo do Uruguai. E a obstinação em prosseguir a guerra contra um país já destruído e com uma resistência enfraquecida liderada por um tirano ensandecido. O que não nos explica é o interesse da Inglaterra em deflagrar uma guerra que ao mesmo tempo lhe abriu rentáveis mercados de armas e equipamentos e aniquilou um país que ameaçava emancipar-se e atrapalhar-lhe interesses econômicos e geopolíticos.
Sobre a revolução de 1930, o documentário relata o movimento tenentista que a antecedeu, iniciado em 1922 com a “revolta do Forte de Copacabana”, quando dezoito verdadeiros heróis enfrentaram milhares de soldados num embate simbólico. Os dezoito mártires protestavam contra as fraudes eleitorais e a política viciada dominada por oligarquias que desprezavam o país e o povo. Foram massacrados, mas seu heroísmo iniciou o movimento tenentista que muito contribuiu para o fim da “república velha”.
O episódio “universidade do crime” nos relata a história da origem das falanges e comandos do crime organizado, que dos presídios alastrou-se para as periferias pobres, as polícias e a política. É uma história que vai muito além dos presídios e do crime comum.
Todos os episódios parecem transmitir-nos uma única mensagem: as guerras do Brasil permanecem declaradas nos dias de hoje. Não se trata de luta de classes, mas guerra de classes. Uma guerra de mais de quinhentos anos.
Publicado no blog http://perrengasprincesinas.blogspot.com/