A origem das línguas românicas
Resenha do capítulo: A origem das línguas românicas
O latim vulgar era o latim essencialmente falado pela grande massa
popular menos favorecida e quase que inteiramente analfabeta do Império
Romano. Foi propositalmente ignorada pelos gramáticos e escritores romanos
porque era tida como indigna de consideração. Distinguia-se do latim culto
falado (e por extensão do latim clássico ou literário) em todos os aspectos
gramaticais. Era mais simples em todos os níveis, mais expressivo, mais
concreto e mais permeável a elementos estrangeiros. Continuou se
transformando ao longo dos séculos até que em mais ou menos 600 d.C. já
constituía os primeiros “romances” (ou seja, as primeiras manifestações das
línguas românicas, muito próximas ainda do latim vulgar) e depois, a partir do
séc. IX, as línguas românicas.
Sabe-se que as características gerais básicas do latim vulgar já se
apresentavam desde o fim da época republicana ou desde o começo do
período imperial, isto é, desde o século I a.C.ou no máximo desde o século I
d.C. Mas é muito comum datarem-se dos séculos III ou IV da era cristã
numerosas inovações atestadas pelo conjunto das línguas românicas.
O latim vulgar é, na verdade, um latim popular que existiu em todas as
épocas da língua latina. Esse latim pertencia a uma população que era muito
pouco ou nada escolarizada e que, portanto, não poderia ter sido influenciada
pelos modelos literários e pela escola (cf. Herman, 1967: 16). O latim vulgar
não sucede ao clássico; teve origem nos meios plebeus de Roma e cercanias,
sendo essencialmente, como afirma Maurer Jr. (1959:5), “o latim falado pela
plebe romana, embora muito de seus característicos se infiltrassem no seio da
classe média e até das classes mais altas, sobretudo na época imperial.” Uma
vez que se trata de uma variedade de formas, que se ligam ao latim falado
(mas não exclusivamente), não se pode considerar que existam realmente
textos em latim vulgar.
Apesar da variabilidade cronológica, social e geográfica, o latim vulgar
possuía uma homogeneidade suficientemente extensa para que fosse
entendido em seu vasto território. Havia uma unidade no latim vulgar, que fazia
dele uma espécie de koiné latina.
O latim vulgar tinha peculiaridades gerais suficientes para dar-lhe um
aspecto mais ou menos definido em oposição ao sermo urbanus e ao sermo
litterarius. O latim vulgar representava a língua do povo comum, da plebe
romana, enquanto o latim clássico era um produto da sociedade aristocrática. A
enorme oposição social entre essas duas classes se refletia na língua que era
capaz de explicar as diferenças no vocabulário e na sintaxe. O latim clássico,
apesar de ter-se originado em um latim vivo e falado, é, em geral, mais
conservador e arcaizante do que o latim vulgar. O latim vulgar é fruto de uma
população heterogênea, que empregava mal a língua latina, corrompendo-a.
A distância que separava o latim vulgar do latim culto era a princípio
pequena, mas já podia ser vista a partir do séc. IV a.C. O vocabulário era, em
boa parte o mesmo, sobretudo o que servia para o uso da vida cotidiana:
coisas, animais, plantas, etc. O latim vulgar nunca se isolou completamente da
língua literária, pois sempre houve um convívio constante entre todas as
classes, através do teatro, às vezes pela escola e, mais tarde, pela Igreja.
Portanto, existiu sempre uma contribuição limitada, porém contínua, da língua
clássica para a popular. Vestígios fonéticos, morfológicos, sintáticos e ainda de
um vocabulário semelhante à língua clássica também ocorrem nas línguas
românicas. Trata-se de sobrevivências de uma época em que o latim vulgar
ainda conhecia essas formas, perdidas depois na maior parte do território.