Resistência de um povo: Defesa, direitos e preservação dos Quilombolas em Belo Horizonte
Uma realidade meramente não conhecida, os quilombos mantém suas tradições próximas ao centro de Belo Horizonte. Estes descendentes conservam as tradições de origem africanas bem próximas do Centro da Capital Mineira, mas o que há de revoltante nesta história é que sua área de preservação está sendo tomada por grandes empresários que alegam ser dono de boa parte do terreno e que as casas onde moram estão desabando e não podem continuar no local onde habitam. Suas tradições vêm de Manzo, Ngunzo e Kaiango. A comunidade continua lutando por igualdade e enfrenta um grande desafio: o de manter o terreiro religioso, interditado por ameaça de desabamento.
Segundo pesquisas da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais, o terreno pertence à Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão, o que inviabiliza a realização de obras por parte da Prefeitura. Para fugir de ameaças a comunidade que descende de quilombolas, que são escravos que fugiram para viverem em liberdade está de mãos dadas e se mobilizando. As primeiras mobilizações para a sua criação ocorreram em 2004, durante o primeiro Encontro de Comunidades Negras e Quilombolas (ECNQ). Segundo dados da Federação permitiu um primeiro contato entre lideranças das comunidades quilombolas e delas com autoridades governamentais das esferas federal, estadual e municipal e organizações não governamentais.
Em 2004, foi realizado o 1º Encontro das Comunidades Negras e Quilombolas de Minas Gerais, organizado pela Fundação Cultural Palmares e pelo Instituto de Defesa da Cultura Negra e Afro descendentes “Fala Negra” em Belo Horizonte, com um apoio muito grande do CEDEFES, do CONSEA, da prefeitura de Belo Horizonte e do IDENE. Nesse encontro, os participantes discutiram seu direito ao território cultural bem como as políticas públicas direcionadas aos remanescentes de quilombo no país. Representantes das setenta e duas comunidades presentes no encontro criaram uma Comissão Provisória Quilombola, com eleição de representantes por região do estado, com a finalidade de representá-los na luta por seus direitos.
De acordo com a Federação do Estado de Minas Gerais às atividades de mobilização e integração do movimento, a Federação, com o apoio do CEDEFES e de outras entidades, realizou, no final de março de 2007, em São João da Ponte, município situado no Norte do Estado, o II Encontro das Comunidades Quilombolas do Estado de Minas Gerais. Durante o encontro, houve o entendimento, entre os quilombolas de que a regularização de seus territórios é essencial para que a sua cidadania e diversidade étnicas sejam preservadas. Assim, a principal reivindicação surgida no encontro foi a titulação das terras quilombolas, pois constatou-se que das 450 comunidades existentes no Estado, apenas uma obteve o título de sua terra, e essa, lamentavelmente, se encontra submersa.
Em novembro de 2009, a Federação N´golo realizou o III Encontro das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais em Contagem, Minas Gerais. Além da Federação, o Encontro contou com o apoio e organização do CEDEFES, do Escritório de Direitos Humanos do Estado de Minas Gerais, do Instituto de Terras de Minas Gerais e do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate a Fome. O III Encontro das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais foi fruto da articulação dos movimentos sociais e quilombolas que acontece em Minas Gerais desde o início dos anos 2000. Esta articulação de entidades governamentais e não-governamentais ajudou na formação e fundação da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais N´golo.
O III Encontro surgiu da demanda da Federação e da articulação do CEDEFES com as entidades parceiras e financeiras para que o evento tivesse condições de acontecer. As comunidades quilombolas vivem um período conturbado, onde o Estado está acuando e cerceando cada vez mais os direitos já adquiridos nos últimos anos. Ao mesmo tempo, neste momento, as comunidades estão saindo da invisibilidade social e política. A metodologia foi gestada juntamente com a diretoria da Federação Quilombola N'golo e outras lideranças que objetivava um evento que propiciasse o fortalecimento e a organização da entidade (N'golo). Estiveram presentes 230 representantes quilombolas de 76 comunidades de várias regiões do Estado de Minas Gerais.
Aqui deixo o significado de N’golo. O nome N’Golo possui origem africana. Como uma dança ritual dos mucopes em Angola, região sul da África, N’Golo também é popularmente conhecido como “dança da zebra”. Com base nos movimentos realizados por esse animal quando os machos, em um combate violento, disputam entre si sua fêmea, N'Golo se constituiu como uma dança ritual dos jovens homens mucopes para conquistar suas esposas. Em função do tráfico negreiro para o Brasil, muitos foram os conhecedores dessa dança ritual que vieram para cá. A necessidade de resistir à escravidão, no entanto, fez com que percebessem que os seus movimentos, marcadamente de pernas, poderiam ser utilizados como luta e combate pessoal. Assim, o N’Golo ficou conhecido no Brasil como a dança ritual que deu origem à capoeira, tendo sido difundido como símbolo de resistência e luta dos afro-descendentes. O nome N'golo foi sugerido pelo padre antropólogo D´jalma Antônio da Silva.
O que dificulta as comunidades Quilombolas de Belo Horizonte é que a Federação ainda não possui uma sede própria e seus recursos ainda são insuficientes para realizar as atividades desejadas. No entanto, a trajetória dessa organização apenas deu seus primeiros passos. A expectativa é que, através da articulação e da organização dos próprios quilombolas, sua luta adquira maior visibilidade e força política.
No início do texto abordei uma realidade não conhecida do povo Belo “Horizontino”, já que você leitor, chegou até aqui conheça um pouco dos Quilombos existentes perto de nossas vidas, e que fazem parte do nosso dia-a-dia. São elas as três principais comunidades de Belo Horizonte dos Luizes, no bairro Grajaú; de Mangueiras, na região do bairro Ribeiro de Abreu, e a Manzo Ngunzo Kaiango, no bairro Santa Efigênia. Nesses territórios sobrevivem valores e heranças culturais de ex-escravos e africanos estes três quilombos já são reconhecidos pela Fundação Palmares como sendo Quilombos Urbanos. A comunidade de Mangueiras tem como um grande representante no qual tive a honra de conhecer, o Maurício... Esta comunidade está situada em área urbana do município de Belo Horizonte, na região nordeste da cidade, às margens da rodovia para Santa Luzia.
Como eu já mencionei, foi uma grande experiência que tive em conhecer esta história de luta, participei de seminários e da temporada FAN mais conhecido como Festival de Arte Negra que já está em sua oitava (8º) edição neste ano de 2015. Ressalto que grandes são as lutas deste povo, e grandes foram as conquistas, mas muito ainda há de ser feito, pois o reconhecimento dos quilombos como patrimônio imaterial certamente ajuda na luta dessas comunidades pela posse e propriedade da terra, mas não define a questão territorial. Segundo Françoise Jean O Registro Imaterial apenas reconhece aqueles territórios como sendo culturais caracterizados por serem ocupados por um grupo étnico que compartilha de uma cultura específica e de matriz africana. Pra ficar bem mais claro o que os quilombos precisam é o título da terra que há anos é pleiteado junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Para as dez famílias que ocupam o lugar há mais de 40 anos, que hoje tem apenas 380 m2. Se dizem que a medida que a cidade cresce, ela avança sobre o quilombo. Por isso, a comunidade perdeu boa parte do seu território e, hoje, a maioria reside fora daqui. Mas o Registro de Patrimônio Imaterial é importante, principalmente para todos os que ali habitam, pois a cidade cresceu e os tornaram bem urbanos. No entanto é uma forma de proteger e preservar, até que se faça a regularização do território. Vale a pena conferir esta grande história de luta próximo aos moradores de Belo Horizonte.
Sineimar Reis