Hannibal - 1ª Temporada
Antes de tudo: haverão SPOILERS ao longo do texto, portanto siga por sua conta e risco.
Sou fã de carteirinha do Dr. Hannibal Lecter desde os onze ou doze anos de idade, quando vi ele se levantar da maca de uma ambulância em movimento, tirar a "máscara" que estava usando e sumir no mundo depois de alguns assassinatos offscreem. Quem leu os livros, sabe que depois disso o bom doutor veio ao Brasil fazer algumas cirurgias plásticas para não ser incomodado pelo FBI, Interpol, CIA e outras agências de segurança ao redor do mundo, tendo em vista que estava entre os dez mais procurados do planeta (ao lado de um Osama Bin Laden ainda não muito famoso, pré Torres Gêmeas).
A ordem correta de leitura dos romances é a seguinte:
- Hannibal - A Origem do Mal
- Dragão Vermelho
- O Silêncio dos Inocentes
- Hannibal
A série da NBC encarrega-se de mostrar fatos que são apenas mencionados no segundo livro (pela ordem cronológica listada acima), com algumas variações, e o faz com méritos: somos apresentados ao agente especial Will Graham, que é o cara em se tratando de traçar perfis psicológicos de assassinos para o FBI.
Will também é o que alguns círculos científicos chama de eideteker (indivíduos com memória fotográfica e capazes de assumir o ponto de vista de qualquer pessoa). Num desses casos, ele acaba precisando da ajuda do Dr. Hannibal Lecter, brilhante psiquiatra forense e colaborador do FBI, que de imediato se interessa pelo "caso" de Graham (a cada colaboração com o Bureau, Will fica mais "contaminado", tanto pela cena do crime que foi obrigado a visitar como pelo vislumbre da mente do assassino que ajudou a capturar - por vezes ele mesmo acaba cometendo mentalmente as atrocidades, dada a empatia com o criminoso). Acaba surgindo entre esses dois personagens uma relação de coleguismo, amizade e posteriormente viram médico/paciente. Só que não é um bom negócio ser paciente do Dr. Lecter...
Quem está familiarizado com os livros sabe que apesar de realmente gostar e admirar Will, Hannibal não hesitaria um milésimo de segundo em acabar com sua raça para garantir seu segredo: deliciosas refeições (por vezes banquetes para vários convidados) preparadas com carne humana.
Já no primeiro episódio, Lecter mostra suas garras ao ligar para o até então suspeito de vários assassinatos em série para lhe avisar que a polícia estava em seu encalço, causando um banho de sangue em seguida - exatamente o que faltava para que a frágil condição de Will ficasse ainda pior, o que lhe rende uma queda vertiginosa em direção aos confins mais sombrios de sua mente, condição que se estende até o último episódio da temporada, com muitas visitas a mentes perturbadas e sangrentas cenas de crimes que precisam ser desvendados, custe o que custar.
A série é perfeita? Não, nada o é. Mas eu confesso que estava pessimista com as primeiras imagens liberadas, e a qualidade final acabou me surpreendendo positivamente. Todo o elenco está muito bem, e Mads Mikkelsen rouba a cena toda vez que aparece como Lecter (como tem de ser, afinal a série é dele!).
O "dom" de Will, aliado a presença de um personagem icônico como Hannibal Lecter, já garantem vários pontos positivos. Não é só mais uma série de investigação policial (como um CSI da vida) ou daquelas que se apoiam no carisma do vilão (Dexter), e talvez o único ponto negativo de destaque seja para aqueles que leram os livros e sabem onde a história termina.
Ou não: bem mais lá pra trás, eu disse que havia um aprofundamento no que vimos no livro Dragão Vermelho, bem como algumas variações (ênfase em VARIAÇÕES). Eu já disse que haveriam SPOILERS aqui? Pois bem: nos livros, Will e Hannibal não tem tempo de estreitar muito suas relações. Logo que põe os olhos em Lecter, graças ao seu "dom" (e uma gravura), Graham sabe que está de frente com o Estripador de Chesapeake, que por sua vez percebe que foi identificado. Ambos saem gravemente feridos do sangrento encontro, com a diferença que Will vai viver a beira mar com a esposa e o enteado, depois de se recuperar, enquanto Lecter é preso e sentenciado a prisão perpétua. Lá pela metade da série, temos uma releitura desse trecho: Miranda Lass, pupila de Jack Crawford (o chefão da Divisão de Ciência e Comportamento do FBI) passa exatamente pela mesma situação, só que acaba sendo morta por Lecter, numa das cenas mais legais da série.
Outra "releitura" é o caso do médico cirurgião psicopata Dr. Abel Gideon que, preso, assemelha-se muito ao Hannibal visto no livro/filme O Silêncio dos Inocentes - inclusive com direito a cena da enfermeira (mencionada nos dois últimos livros e mostrada pela "câmera de segurança" de Ridley Scott no filme Hannibal).
Outra mudança digna de nota é a troca de sexo de dois personagens em relação aos livros. O Dr. Alan Bloom, apenas mencionado na literatura, na série torna-se a bela Dra. Alana Bloom, amiga de Hannibal e interesse amoroso de Will que participa ativamente da ação em alguns episódios. O mesmo vale para o repórter mal caráter Freddy Lounds, que de jornalista obeso de tablóide torna-se uma blogueira mal caráter e ruiva. No livro/filme Dragão Vermelho, Lounds tem um doloroso final nas mãos de Francis Dolarhyde, o próprio Dragão Vermelho - que é quem força Jack Crawford a tirar Graham da aposentadoria.
A presença um tanto quanto prematura de Freddy Lounds aguça nossa curiosidade para o que nos reserva as próximas temporadas (a segunda está garantida). Dois personagens que torço para ver mais bem definidos pelo formato de série são o próprio Francis Dolarhyde e Mason Verger. Não sei se Clarice Starling se encaixaria na proposta, talvez acabem adiantando a aparição dela em relação aos livros. Se for bem feito, acho que não haveria problema algum.
Se você não conhece os livros, eu recomendo, mas pode dedicar umas horas do seu precioso tempo para essa série, pois ela acaba se sustentando muito bem por si só.