Café Filosófico

A televisão brasileira, apesar de ter se dobrado a invencionices e modismos e volta e meia encenar programas americanos como o Big Brother Brasil, ainda tem excelentes programas. Falo aqui do Café Filosófico CPFL da TV Cultura – ponto de encontro de renomados intelectuais que instiga reflexões sobre o ser, a vida, a arte; promovendo, assim, amplo conhecimento. A ideia primordial é partir da filosofia e psicanálise, usando as teorias e conceitos de Freud, Jung, Lacan, Sócrates, Platão, Descartes, Schopenhauer, Nietzsche, Spinoza e outros para discutir temas da atualidade. Os conflitos contemporâneos são dessa forma tratados por especialistas como Maria Rita Kehl, Flávio Gikovate, Renato Janine, entre outros.

No sábado, dia 25 de novembro de 2012, o Programa Café Filosófico trouxe ao ar a entrevista concedida por Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, que recebeu a CPFL Cultura em sua casa, na cidade de Leeds, Inglaterra, em julho de 2011. Tido como um dos mais conhecidos pensadores da atualidade, tive o prazer de conhecê-lo neste programa.

Os muito jovens que me perdoem – elenco aqui os jovens cientistas, doutores e pesquisadores de modo geral, mas ouvir um senhor falar sobre a história e experiência pessoal aliada ao amplo conhecimento de anos de estudo é gratificante. O senhor Bauman nos apresenta uma análise da mudança da solidez dos valores modernos para um mundo líquido, fluido, leve, caracterizado pela fragilidade dos laços humanos e medo dos vínculos.

Zygmunt inicia sua fala nos colocando diante de um pensamento complexo, pois que hoje há (segundo o sociólogo é a primeira vez que isso acontece na história) uma real necessidade de construirmos uma comunidade não local, mas uma comunidade da humanidade, dado que somos interdependentes e vivemos como se pertencêssemos a um único país. Multiplicamos – o homem do século XXI – as relações, as conexões, as comunicações, agora temos que enfrentar esse problema.

Viver nessa sociedade pós-moderna é muito complexo. De acordo com Bauman, nessa sociedade moderna – chamada por ele de sociedade líquida – há forte presença do individualismo o que torna cada vez mais frágeis os laços humanos, as pessoas formam grupos de amigos nas redes sociais com um clic, quando o interesse passa basta outro clic e estão desconectadas. Há, por outro lado, um aumento da liberdade e, consequentemente, perda da segurança. Vivemos, assim, numa sociedade do medo e das relações fragilizadas perante o descompromisso com o afeto e preocupação com o bem-estar do outro.

Segundo Bauman, nós saímos de um século (Séc. XX) considerado como o século da produção e adentramos no século do consumo (Séc. XXI) e somos vítimas desse consumo desenfreado, o que percebemos é um excesso de valores e padrões, mas inexiste uma hierarquia de valores. Como proceder nessa sociedade e que verdades adotar é o que temos nos perguntado. “Estamos todos numa solidão e ao mesmo tempo numa multidão” – compartilhamos da mesma ideia, senhor Bauman. Esse sentimento de desamparo e solidão pesa sobre o homem moderno.

No último quadro do Programa foi perguntado ao senhor Bauman se existe uma receita para a felicidade. Sejamos sinceros, não acreditamos em receita. Primeiro, porque depende de quem a elabora; segundo, de como é interpretada; e terceiro, de uma diversidade de sujeitos que a executam. Os livros de autoajuda estão repletos delas – O Segredo, O Poder da Consciência, Dez leis para ser feliz etc etc. Consistiria a felicidade em se ter pensamento positivo, seguir normas e leis estabelecidas sabe-se lá por quem e assim ganhar fortunas ou ter um sono tranquilo?

O simpático polonês não responde de prontidão. Ele nos indica que há valores que são essenciais para se obter uma vida mais satisfatória. Um deles é a liberdade, ser minimamente livre é equação sine qua non para se sentir indivíduo. O outro é segurança. No entanto Zygmunt nos adverte ao dizer que cada vez que se tem mais segurança, perde-se parte da liberdade; e cada vez que se alcança a liberdade, perde-se muito da segurança. Não há ganho, pois, sem perda. Assim, acabamos por desenvolver certa nostalgia pelo nosso status na sociedade.

Sobre a felicidade, penso que nenhum de nós tem uma receita ou crença pessoal (diante do caos que se instala diariamente sob nossos olhos); mas acredito que pensar no outro – não apenas nesses dias de solidariedade promovidos pelo Natal, às vezes o que conta é autopromoção – e se colocar na posição dele nos ajuda a construir uma satisfação pessoal, assim exercemos a nossa humanidade. Comprometimento com os próprios valores e com o afeto que nutrimos pelo outro e que nos é devolvido deve estar na nossa pauta diária. Atitudes de respeito e vontade de partilha são caminhos que podemos aprender a trilhar.

Excelente o Programa – palmas para a TV Cultura. A TV Cultura promove e dissemina a cultura no país.

RosalvaMaria
Enviado por RosalvaMaria em 09/12/2012
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