VARIAÇÃO NA CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA DO PLURAL NA FALA DOS FLORIANOPOLITANOS NATIVOS NA COSTA DA LAGOA Autor: Lidiomar José Mascarello. *

Resenhista: Halessa Regis

ATUALIZAÇÃO DA VARIAÇÃO

São muitos os pesquisadores de variação linguística no Brasil. Nosso país é grande e tem como língua nacional o Português culto, ou padrão (PP), como trazem muitos estudiosos da linguística e grámaticos, ou seja, o Português mais próximo à escrita. Recentemente tem havido uma enorme discussão a respeito de um português diferente da norma culta, falado no Brasil pela maioria dos brasileiros, o que revela a vertente de outros estudiosos, linguístas e teóricos, o Português não-padrão, ou seja, o Português mais próximo à fala, ao coloquial e à eficácia.

Há uma forte resistência no Brasil hoje em dia para que esse Português não-padrão (PNP) não seja encarado com olhos preconceituosos mas sim que os brasileiros aceitem o PNP como uma variante da língua Portuguesa falada em todo o território nacional, distintas regionalmente.

Trazendo para o âmbito local e a fim de se pesquisar o PNP no sul do Brasil dados referentes ao fenômeno da variação da concordância verbal de terceira pessoa do plural na fala dos florianopolitanos nativos da Costa da Lagoa foram coletados por alunos do programa de Pós-Graduação em Linguística e pelo Projeto VARSUL, resultando no artigo de 12 páginas do mestrando do Programa de Pós-Graduação em Linguística da UFSC, em 2010. O autor, Lidiomar J. Mascarello, ao escrever sobre os estudos levou em conta aspectos linguísticos e sociais de moradores de uma descendência açoriana (colônia portuguesa) misturada atualmente à urbanização. Foram oito os entrevistados, e os entrevistadores (já citados acima), apoiaram-se na teoria sociolinguísta variacionista para estruturar a análise.

O artigo está estruturado em três partes principais: a descrição da comunidade; a metodologia; e a descrição e análise de dados de concordância variável e estatísticas.

No que se trata da descrição da comunidade, Mascarello nos esclarece que os meios de acesso à Costa da Lagoa são remotos. São eles, baleeiras, caminhos com subidas íngremes de chão batido de difícil acesso ou ainda pontes que os nativos e seus

descendêntes construíram. Ou seja, a comunidade mantém muitos de seus acessos e muitas de suas tradições, cultivando também sua cultura e traços linguísticos. A comunidade da Costa da Lagoa é formada na sua maioria por pescadores e rendeiras que vivem da pesca, da arte, do comércio local e do turismo. Mesmo estando muito próximo ao centrinho da Lagoa da Conceição que é badaladíssimo por turistas e super urbanizado, a Costa da Lagoa ou Aldeia dos pescadores preserva seus espaços e características de local, alguns traços mais conservadores, alguns engenhos, casarões e sobrados e referências culturais ligadas ao início da colonização no Séc.XVIII, desmembrando-se então, de certa forma, da modernidade que a rodeia.

Quanto à metodologia o mestrando relata algumas das ferramentas utilizadas no processo de coleta de dados bem como nos fornece os nomes dos entrevistadores, e locais que foram realizadas as entrevistas. Locais comuns como a casa dos moradores ou mesmo locais de trabalho foram usados para as pesquisas, essas por sua vez foram gravadas e analisadas posteriormente. O grau de escolaridade foi alternado, sendo 4 dos entrevistados com Ensino Fundamental incompleto, com no máximo seis anos de escolaridade, e quatro informantes com Ensino Superior completo.

Foram apresentadas hipóteses de que indivíduos com maior tempo de escolarização apresentaram um índice menor de variação e não concordância verbal, e aqueles com menor tempo de escolarização apresentaram um índice maior de variação e a não concordância verbal. Outra hipótese foi que pessoas com mais idade tendem a fazer mais concordância verbal, enquanto pessoas mais jovens tendem a fazer menos. Quanto a linguística, foi verificado que há uma saliência fônica na fala dos locais, e uma variação linguística – diatópicas, diastráticas e diageracionais - (William Labov 1927).

E por fim, a terceira parte trata da descrição e análise dos resultados. Notou-se que a saliência fônica dos nativos em alguns casos favorece em outros desfavorece a concordância verbal. Outros aspectos linguísticos que foram analisados e são de relevante importância para os dados são a posição do sujeito e a animacidade do mesmo.

O artigo traz tabelas que ilustram os resultados e comparam estatísticas.

Podemos perceber com esses tipos de pesquisas o quanto a historicidade, cultura, idade, epistemologia, escolaridade, relações familiares etc, influenciam nas variações linguísticas e nas tradições linguísticas de uma região.

Foi constatado e ilustrado por gráficos, ao contrário do que acreditavam no início da pesquisa, que, as pessoas de mais idade fazem menos concordâncias do que os mais jovens. Levantaram a hipótese de, como os jovens tem mais contato com turistas e pessoas das comunidades mais modernas fora da Costa da Lagoa, estes percebem diferenças na fala e tendem a fazer análises próprias e correções, decorrentes de uma certa, quase imperceptível, discriminação por falar o “manezinho”. Outra questão de valor interessante é o de que muitos jovens da aldeia procuram trabalhos na cidade e enfrentam a concorrência no mercado de trabalho, por esse motivo preocupam-se mais com o modo o qual falam, sendo que os mais velhos não tem essa preocupação com regionalismos ou expressões idiomáticas. Concluíram que por pressão do mercado de trabalho as pessoas deixam ou tentam minimizar as suas variações e concordâncias verbais e aproximarem-se do que é “novidade” na fala e vindo de fora.

Levando em consideração o trabalho dos pesquisadores e os vários estudos que temos em linguística variacional nos dias atuais, podemos perceber que ainda há muito preconceito escondido por detrás das palavras corriqueiras e que há um longo caminho até que todas as comunidades falem e sejam aceitas como são, assim como, sejam vistas como mais uma variante e motivo de orgolho para um país com tantas diferenças e tantas culturas enraizadas e cultivadas. Artigos como o de Mascarello tem de ser amplamente divulgado e discutido, para que se faça maior justiça aos falantes das nossas línguas portuguesas e para que o preconceito linguístico seja sim deixado “mofar com a pomba na balaia”.

Estudiosos e pesquisadores devem incentivar estudantes a realmente conhecer o que está por trás da nossa língua, política e socialmente e discutir autores e sociolinguistas como Marcos Bagno, bem como outros de vertentes contrárias, para que seja desenvolvida uma visão crítica sobre a questão da língua e se estabeleçam posições. Nossas variações tem que estar expostas para que não seja preciso que nativos desistam de suas tradições a fim de adentrar uma utopia da língua “correta”, numa construção política utópica. Entender a nossa história e a história da nossa língua, bem como, acompanhar pesquisas e estatísticas não é somente importante para acadêmicos, mas também e principalmente para os próprios falantes de tais variantes, pois eles são os retentores de histórias e tradições e podem ser os inauguradores de futuros idiomas falados do Brasil, assim como um dia o Português, o Espanhol, o francês e o Italiano foram, e se tornaram línguas de grandes feitos.

O que contribui para o estado da arte é de fato grande. Do global para o local podemos entender as transformações no momento em que estamos passando por elas. E por que não olharmos para o lado? Olhólhó!

Referências: http://www.radarsul.com.br/florianopolis/historia.asp

3 Disponível em: http://www.pmf.sc.gov.br/saude/unidades_saude/populacao/ulst_2008.php, acesso em 17de maio de 09.

*Do autor -Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Linguística da UFSC

Florianópolis/2010

Halessa Regis
Enviado por Halessa Regis em 09/12/2012
Código do texto: T4027958
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