ALGUNS DESAFIOS QUE A VIDA CONTEMPORÂNEA COLOCA PARA AS PRÁTICAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM DE LÍNGUA PORTUGUESA

Segundo Fanfani “os velhos dispositivos que regulavam a relação professor-aluno e a relação com o conhecimento, que garantiam a autoridade pedagógica e produziam uma ordem institucional, se corroem quando deixam de ser eficientes e significativas na vida dos atores envolvidos” (2000, p. 1). O professor como dono do conhecimento, como autoridade inquestionável; os alunos como tábulas rasas, apenas receptivos; a escola como o templo do saber; o saber fechado nos livros e bibliotecas – esses são alguns dos aparelhamentos que regulavam a relação professor-aluno e que com seu enfraquecimento, colocou-se em cheque a autoridade da escola e do professor, exigindo, desta sorte, uma mudança de papel e de modus operandi dos atores envolvidos – isso constitui um desafio que a vida contemporânea coloca para a escola e para o professor.

O enfraquecimento dos dispositivos citados deve-se à globalização que consigo trouxe o acesso ilimitado à informação, a diminuição das distâncias, a rapidez na comunicação, mudanças nas formas de produzir e receber as informações. O saber, hoje, está disponível, bastando para acessá-lo apenas um click.

Portanto no ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa, os desafios que se apresentam são: a aproximação do mundo da vida cotidiana do aluno com a cultura escolar; conforme Fanfani, houve um tempo em que a escola pretendia propor “os saberes legítimos e consolidados” para os alunos, como se a escola tivesse uma função missionária e civilizatória, de conversão dos bárbaros à cultura hegemônica. Mas o autor afirma que:

“hoje, é impossível separar o mundo da vida do mundo da escola. Os adolescentes trazem consigo sua linguagem e sua cultura. A escola perdeu o monopólio de inculcar significações (...).“ (2000, p. 8)

A aproximação supracitada no ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa dar-se-ia, por exemplo, em oportunidades didáticas a partir da abordagem dos gêneros discursivos, a qual levaria aos múltiplos letramentos na sala de aula: utilização do internetês, muito utilizada pelos jovens, como ensejo de trabalhar adequação e variação linguísticas, diferenças entre escrita formal na norma padrão e escrita informal sem obediência às normas gramaticais; uso de e-mails, blogs, TV, vídeos, rádio, cinema, fotografias etc; segundo Márcia Abreu:

“Muitos dos letramentos que são influentes e valorizados na vida cotidiana das pessoas e que têm ampla circulação, são também ignorados e desvalorizados pelas instituições educacionais. (...). As redes sociais e informais que sustentam essas práticas letradas (por exemplo, as redes e comunidades virtuais de que jovens de todas as classes sociais participam) permanecem desconhecidas e apagadas nas escolas, (...) como é o caso da proibição de acesso ao You Tube, Orkut e ao MSN em muitas escolas e universidades conectadas.” (ABREU, 2011)

Para que a escola participe dos múltiplos letramentos e letramentos multissemióticos, mais especificamente nas aulas de Língua Portuguesa, é preciso que seja revista a postura apontada pela autora, do contrário a escola e os docentes continuarão “sob pena de amargarmos o desafio de conviver com o atraso diante de tanta novidade, sem que possamos nos renovar e contribuir para a melhoria da sociedade” (professor-cursista em comentário no fórum de discussão).

O acesso ilimitado e em tempo real às informações torna premente a necessidade de mudança de papel do professor – este não é mais o dono do saber, o privilegiado que domina uma ciência; mas deve ser mediador do conhecimento, facilitador; seu papel é reconfigurado: ensinar o aluno a lidar com tanta informação, selecionar, filtrar, ter senso crítico, não ficar na superficialidade, cotejar fontes, aprofundar o conhecimento, conseguir formar um todo e não perder-se em meio a tantas informações desconectadas entre si, proporcionar ao estudante a aprendizagem de produção de conhecimento e como fazer esse objeto produzido circular, ensino do uso ético e responsável da tecnologia, de maneira a levar ao exercício crítico e ativo da cidadania e não a um consumismo voraz de informações dispersas.

Por fim, outro desafio que se coloca – não circunscrito apenas à disciplina de Língua Portuguesa - é o da instrumentalização do professor para operar com a tecnologia e com os múltiplos letramentos na contemporaneidade.

Durante os fóruns de discussão do curso de especialização em Língua Portuguesa pela Redefor-Unicamp cujos temas versavam sobre quais os desafios que a vida contemporânea coloca para as práticas de ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa, um professor-cursista avaliou:

“(...) recursos materiais são da maior importância para a nossa atuação no processo de ensino/aprendizagem. (...) entendo que um conjunto de fatores é necessário para operarmos uma educação de qualidade: a formação/qualificação/valorização dos professores e os recursos materiais são fundamentais para isso. E é imperativo que haja um forte investimento público para que isso se viabilize, sob pena de amargarmos o desafio de convivermos com o atraso diante de tanta novidade, sem que possamos nos renovar e contribuir para a melhoria da sociedade. (...) falta um real compromisso com a educação por parte das instâncias governamentais. Sem investimentos, não há milagres!”

Por fim, ao longo dos fóruns supracitados constatou-se uma concordância entre os professores-cursistas de que a falta de instrumentalização do professor constitui uma barreira para as práticas de ensino-aprendizagem de LP na escola hoje, pois a dificuldade de colocar as boas idéias em ação devem-se a problemas de ordem técnica. Muitos professores-cursistas assinalaram o inconveniente de ter que arcar com recursos próprios os custos de materiais utilizados em suas aulas.

REFERÊNCIAS

ABREU, Márcia. História da Disciplina de Língua Portuguesa no Brasil. Tema 3:

O Século XXI – dos PCNs aos Letramentos Múltiplos, p. 3, 2011.

FANAFANI, Emilio Tenti. Culturas Jovens e Cultura Escolar, 2000.

Viviane Mirandaa
Enviado por Viviane Mirandaa em 05/12/2012
Reeditado em 07/12/2012
Código do texto: T4020236
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