AS VOZES E SEU TEMPO DE FLORENTINA DA SILVA SOUZA
Nesta rersenha, buscar-se-á discorrer acerca do texto As vozes e seu tempo de Florentina da Silva Souza, doutora em Estudos Literários pela Universidade Federal de Minas Gerais e professora associada da Universidade Federal da Bahia. A autora atua principalmente nos seguintes temas: afrodescendência, identidade cultural, literatura afro-brasileira, literatura brasileira, cultura brasileira e estudos étnicos.
Como é sabido, há tempos se fala das lutas de grupos marginalizados, a saber, mulheres, imigrantes e negros que lutam para que suas reivindicações e “auto expressões” sejam incluídas e, principalmente, olhadas com o respeito que merecem nas mais diversas esferas culturais, como arte,comunicação e identidade.Em As vozes e seu tempo,Souzafala a respeito do surgimento dodiscurso identitário negro, no intuito de este poderintervir, de forma ativa,no exercício do poder político-cultural vigente.Para isto,traz à discussão fatores como a produção textual voltada à questões negras e a importância da literatura afro-brasileira no Brasil.
A autora relembra o discurso escravocrata que, mesmo após a promulgada ”abolição” considerava o negro como individuo de nível intelectual inferior.Tentaram,de toda forma,torná-los invisíveis em todas as instâncias político-econômicas da sociedade, tentaram a todo custo deixar sem voz a maior parte da população brasileira, que inegavelmente, é composta por negros e mestiços.Neste sentido, observa-se, como afirma Souza “a invisibilidade social do afro-brasileiro [que] manifesta-se, ainda, na incapacidade de enxergá-lo fora dos papéis a ele destinados pela sociedade” (SOUZA, 2005, p.35). Em relação a isto, a autora traz como exemplo os papeis de empregados, subalternos e assalariados, que são, na maioria das vezes, exercidos por negros.
È inegável que em boa parte dos espaços sociais, a presença do afro-brasileiro se torna visível e chega a incomodar o grupo étnico que se considera único capaz de frequentar determinados ambientes.
È verídico também, que o negro, somente, se manifesta contra o estereotipo defigura marginal da sociedade em situações muito impares. Pois, mesmo quando ele exerce o papel do “patrão”, ainda assim sofrerá discriminação.Quando os afro-brasileiros não exercempapel secundário na sociedade“[...] são notados como exceções, [...] são embranquecidos – sua cor, seu grupo étnico são esquecidos”(SOUZA, 2005, p.36). Diante disto, muitos afro-brasileiros evitam frequentar determinados ambientes sociais, participar de ações relacionadas à vida política como forma de “afastarem-se” do racismo. Além disso,ao citar Fanon, a autora ratifica a dificuldade de construção de uma auto-estima positiva entre os afrodescendentes em consequência da internalização de estereótipos inferiorizantes institucionalizados pelos auto-determinados “brancos”.
A luta por espaço de expressão também se manifesta em outros âmbitospolíticos e sócio culturais, onde essas minorias encontram em algumasesferas da arte contemporâneaindivíduosdisponíveis e/ou interessados a compreender suas diversas formas de atuação, bem como, ouvir suas vozes de crítica e protesto em objeção as discriminações raciais.
A”literatura marginal” negraaderiu a uma nova forma de produção cultural.Muitos dos textos produzidos por negros eram divulgados e/ou disseminados por entidades criadas por eles próprios. Isto se caracterizou pelo fato de os grupos editarem, imprimirem e distribuírem seus livros, jornais e revistas, propiciando outra forma de divulgação de seus textos nos mais diversos espaços culturais. As estratégias de divulgação dessa literatura enquadram-se no que Souza denomina de tradição textual alternativa. Em função disso, a autora critica os arquivos institucionais da literatura que não registram a “existência da produção textual de dicção negra que permanecem à margem do circuito editorial e restrita a círculos de militantes”(Idem,2005, p.38).
Ressalte-se ainda, que, muitos desses discursos são disseminados através de rappers, blocos afro e bailes de soulque se tornaram grupos de reivindicação e protesto contra a discriminação racial.
Diante do exposto, conclui-se que a luta afro-brasileira por espaços nas mais diversas esferas sócio - culturais tornou-se ícone de construção de uma nova manifestação artística, nesse caso a literatura negra, que expressa a doação da arte, no sentido de ultrapassar as fronteiras entre o que se considerava “marginal e não marginal”. È, pois, a partir do grito destes, considerados, marginalizados que nascemas diversas manifestações de uma tradição alternativa que possibilita a construção, valorização, pluralidade e riqueza interpretativa de uma imagem e/oulinguagem outra da afrodescendência.
Referencia:
SOUZA, Florentina da Silva. As vozes e seu tempo. In: Afrodescendência em Cadernos Negros e Jornal MNU. Belo Horizonte: Autêntica, 2005, p. 31-49.