Justiça Vermelha/ O Processo
Justiça vermelha é um filme que envolve o mundo do Direito numa relação bem atípica, uma relação entre dois mundos jurídicos diferentes. Jack Moore (Richard Gere) é um advogado americano que vai à China para fechar um mega negócio, mas uma noite conhece uma chinesa com quem se envolve. Na manhã seguinte, é acordado por soldados que invadem seu quarto e o prendem pelo assassinato da mulher que passou a noite com ele. Além de existirem vários indícios que o incriminam, ele se depara com um sistema legal que não respeita os direitos civis. Como não pode ter um advogado estrangeiro, o estado indica Shen Yuelin (Ling Bai), uma jovem advogada chinesa que nunca conversou com ele antes de entrar no tribunal nem acredita que ele seja inocente, apesar dele alegar inocência o tempo todo. Tudo acaba com a prova da sua inocência, graças ao desempenho da sua advogada, e o descobrimento de uma armadilha realizada por homens poderosos, com grande influência no país.
O drama do personagem de Richard Gere, estando num mundo jurídico desconhecido, nos remete ao drama vivido pelo personagem de Kafka, o aflito Josef K., em sua obra “O processo”. K. é um cidadão respeitado procurador de um importante banco que se vê diante de uma justiça que ele não conhece e com a qual ele não consegue lidar, K. é forçado a jogar com as cartas do novo sistema para tentar alcançar a sua absolvição, porque mesmo sendo uma justiça paralela, ou seja, uma justiça até então desconhecida do personagem que só imaginava o seu Estado de Direito, ela ostenta poder sobre a vida de K., deixando-o demasiadamente perturbado. K, mesmo tentando depois ceder às regras do sistema absurdo, ainda não consegue compreender seu funcionamento. Jack Moore(Richard Gere) se vê também numa situação parecida, posto que o sistema jurídico da China vai de encontro aos direitos civis conhecidos por ele nos Estados Unidos. Após ser acusado de um crime ele passa a ser escravo da lei chinesa e sofre com os preconceitos dos chineses por se tratar de um ocidental; um fato comum num país tão controlador como a China. Assim, quando tenta dialogar nos termos ocidentais é totalmente ignorado e repreendido com frases que advertem que ele não está no seu país e deve seguir os preceitos chineses.
Drama por drama há duas diferenças entre a situação de Josef K. e Jack Moore: a primeira é que Jack tem noção do que está sendo acusado- mesmo sabendo que não fez o que o incriminou-; ou seja, mesmo tendo sido uma armadilha, Moore sabe o que ocorreu para acharem que ele é o culpado, enquanto K. não tem a mínima noção do que fez, ou seja, carrega uma culpa que não apresenta circunstâncias, não apresenta indícios, não apresenta fatos, carrega o peso de um crime que, seja lá qual tiver sido, ele sabe que nunca praticou, sabe que nunca, nem sequer poderia ter sido vítima de uma armadilha. A segunda é que o fim de K. é a tragédia e o fim de Moore é a comédia. Compartilham, porém, a situação de que os dois personagens – o do livro e o do filme – se deparam com uma justiça contra a qual não podem exercer influência alguma - no caso de Jack só até um certo ponto graças à sua advogada. O ponto crucial da relação, portanto, é esse, é a questão da semelhança que se mostra nas obras acerca de como uma justiça totalmente fora dos padrões da justiça conhecida pelos personagens, uma justiça totalmente inacessível a eles, acaba controlando seus movimentos e seus pensamentos, acaba perturbando sua rotina e mudando completamente suas idéias e antigos modos de entender as situações.
Referências:
KAFKA, Franz. O Processo; tradução de Torrieri Guimarães – São Paulo : Abril Cultural, 1979.
AVNET, Jon. Produção cinematográfica; Justiça Vermelha; 1995/EUA.