Pesquisa e formação docente: Apontamentos teóricos
CRUZ, Giseli Barreto da. Pesquisa e formação docente: Apontamentos teóricos, Revista Eletrônica de Ciências da Educação, Vol. 2, No 1 (2003)
Autoria da Resenha: Juciara Maria Teles Brito
Giseli Barreto da Cruz Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Santa Úrsula (1992), especialização em Supervisão, Orientação e Administração Escolar pela Universidade Federal Fluminense (1996), mestrado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2002) e doutorado em Educação, também, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2008). Integra o GEPROF - Grupo de Estudo da Profissão Docente, coordenado pela Profª Menga Lüdke (PUC-Rio) e atua como docente da Universidade Estácio de Sá e pedagoga da Fundação Municipal de Educação de Niterói. Reúne experiência como professora e pedagoga, atuando com organização do trabalho pedagógico, currículo, avaliação, pesquisa, formação e prática docente.
O artigo é dividido em cinco subtítulos onde a autora tem por objetivo incitar a discussão sobre a pesquisa científica na formação dos professores baseando-se na visão de autores renomados que dentro de um cenário nacional e internacional, analisam tanto a importância quanto a repercussão dessas idéias.
Giseli Barreto afirma que vem crescendo no meio acadêmico, o interesse por pesquisas em torno da ação docente e muitos temas tem se destacado impondo-nos uma ação reflexiva sobre os mesmos, pois devido à crise no sistema educacional surge a questão de formarem-se professores pesquisadores com uma consciência crítica e reflexiva capaz de serem os provocadores do contexto, pois,segundo a autora, a própria educação impõe, diante das dificuldades do mundo atual que os sujeitos tenham uma posição de comprometimento.
Inicialmente pontua algumas questões que é de grande relevância como a defesa de articulações envolvendo a pesquisa, a formação inicial e continuada dos professores, pois de acordo com a autora já não é mais o bastante apenas a formação inicial do professor. Diante dessa perspectiva, renomados autores direcionam suas produções para diferentes nuances teóricas a respeito da formação dos professores que vão, segundo a autora, ajudar na compreensão do assunto.
Gisele Barreto inicia a série com o primeiro subtítulo Da racionalidade técnica à epistemologia da prática e declara que durante muito tempo a racionalidade técnica, baseada na separação da teoria e da prática, predominou na organização curricular, dando enfoque a área específica de conhecimento que se vai ensinar. Porém, por ser a pratica pedagógica, mais complexa e necessitar de soluções simplificadas, ressalta que surge uma nova crença epistemológica que tem como proposta, soluções práticas para a atuação construtiva do sujeito. Deixando claro que o professor precisa entender que a prática docente deve ser constituída espaço de criação e reflexão e não apenas lócus de aplicação de um conhecimento científico e pedagógico.
De acordo com a autora, as idéias de Schon tornaram-se ponto de partida para os estudos direcionados à pesquisa e formação dos professores no sentido de torná-los reflexivos antes , durante e depois de sua prática. Contrário a racionalidade técnica, defende a epistemologia da prática onde o sujeito coloca-se numa atitude de análise, produção e criação de sua própria ação e propõe idéias que ajudem o docente a refletir sua própria prática. Ressalta que devemos estar a tentos as diferenças entre pesquisa e reflexão pois as obras de Schon acabaram por tornarem os termos pesquisa e reflexão quase sinônimos e ainda de acordo com as perspectivas de Ludke, pode-se afirmar que quando um professor realiza uma pesquisa voltada para sua prática docente, a mesma pode provocar ou ser originária de uma prática reflexiva.
No segundo subtitulo, Pesquisar a própria prática: um exercício crítico a pesquisadora relata que, antes mesmo de Schon, L Stenhouse parte do principio que o professor precisa se constituir pesquisador da própria prática identificando os eixos que estruturam cada situação de ensino, tornando a própria sala de aula em laboratório. Stenhause defende a idéia de que a pesquisa seja o alicerce de ensino dos professores de todos os níveis.
Segundo a autora, É.J.Contreras nos ajuda a compreender que tanto a prática reflexiva, quanto a pesquisa não dispensam a crítica. A racionalidade técnica acaba por dividir o trabalho docente, hierarquizando-o e estabelecendo uma relação de dependência entre professores e técnicos, limitando a autonomia docente e fragilizando qualquer iniciativa de pesquisa. Ainda segundo Contreras, a reflexão não deve ficar apenas em sala de aula e deve ser acompanhada criticamente.
Analisando que é gradativamente que se constrói a capacidade de questionamento, ela pressupõe que é vital que se desenvolva criticamente com os professores a partir de uma relação dialógica possibilitando o reconhecimento e análise dos fatores que inibem sua ação. Remetendo-se a H. Giroux, Contreras indica a relevância de o professor assumir-se como intelectual crítico que participa com afinco de desvendar o que está implícito e revelar a origem histórica e social do que se mostra como natural.
Vale salientar que no terceiro subtítulo Pesquisar a própria prática: a contribuição da pesquisa em colaboração a autora discorre a respeito do que afirma Elliot (1998) sobre a questão onde alguns professores inovadores ingleses lideraram um movimento de reorganização curricular, sendo Stanhouse o que mais expressão deu à idéia. Desencadeando assim uma tensão entre professores e acadêmicos e Elliot defende ainda o ponto de vista de que é preciso estabelecer uma forma de pesquisa colaborativa que contribua coma prática curricular.
Giseli Barreto afirma que Elliot desenvolve seus estudos preocupando-se com o papel da teoria e da pesquisa, exatamente por ser a pesquisa-ação originária de problemas vividos por profissionais da pratica educacional e que a transformação de uma determinada situação é baseada num processo onde tanto o sujeito quanto o problema em si modificam-se a partir da contribuição da pesquisa-ação.
A contribuição de zeichner sobretudo é que se acabe com a separação entre professor que se dedique a pesquisa e pesquisadores acadêmicos pois a rejeição entre eles é mútua sendo que os professores entendem que a pesquisa acadêmica não contribuem adequadamente com o fazer pedagógico e os acadêmicos não dão a valorização necessária às pesquisas dos primeiros.
Tal qual zeichner , C. Geraldi aponta essa conjectura de que os professores que não refletem sobre sua postura pedagógica são obrigados a aceitar a realidade de suas escolas e passam a procura soluções mediante as pesquisas e definições que outros fizeram.Para o professor desenvolver uma pesquisa como opção metodológica, vem sendo a pesquisa –ação apontada como uma alternativa viável,põem o professor não deve se restringir apenas a esse método.
Giseli aborda no subtítulo seguinte Pesquisar a própria prática: um exercício que não dispensa rigor e complexidade a questão que engloba a distinção e separação entre pesquisa da prática e a pesquisa acadêmica, já que na primeira não é conferida a legitimidade necessária.observa que segundo Elliot, o professor melhora sua prática em sala de aula através de pesquisas no próprio ambiente que trabalha, sem dispensar a complexidade e rigorosidade que uma pesquisa exige.
De acordo com a autora, Demo pressupõe que a pesquisa aparece em todo o processo ensino aprendizagem, e vê o professor como pesquisador e cientista com princípios de educar pela pesquisa.o próprio demo classifica a pesquisa em cinco níveis:interpretação reprodutiva;interpretação própria;reconstrução;construção e criação/descoberta.
Referente aos critérios de validação de uma pesquisa, Ludke vê a relevância de avançarmos no sentido de identificá-los de forma que sejam compatíveis com as diversidades de pesquisa, para que a pesquisa realizada pelo professor não venha a ser taxada como de segunda categoria, sendo assim a colaboração entre professores e acadêmicos uma solução viável num envolvimento de uma obra comum. Já para Beillerot, a pesquisa é classificada em dois níveis com três critérios cada. O primeiro conferiria uma pesquisa mínima,o segundo, juntamente com o primeiro realizaria uma pesquisa de segundo grau.
Sobre Pesquisar a própria prática: em cena o velho dilema teoria e prática que é tema do ultimo subtítulo, ela vê a dificuldade que gira em torno do campo da pesquisa referente a prática e a teoria que como afirma J. Gimeno Sacristán é comum a pesquisa estar ligada à universidade e a pratica aos meios fora dela, mostrando assim que teoria e prática estão paralelas à pensamento e ação e que não devem estar separadas e pontua a importância da teoria sobre a prática visto que a teoria não inventa a prática, mas a recria.
Sob a hipótese de que segundo D. Fiorentine a pesquisa é considerada um instrumento que deve ser assumido pelos professores de um modo geral, a autora constrói sua argumentação afirmando que discute em seus estudos a complexidade e a especificidade da relação teoria/prática nos saberes dos docentes.De acordo com Fiorentine a relação estabelecida com os saberes e determinante para que professores e acadêmicos aumentem ou não a distancia e as diferenças entre os saberes trabalhados por ambos. Nessa perspectiva esse teórico defende a formação permanente para facilitar o processo que induza o professor a conhecimentos, habilidades e atitudes imprescindíveis para se constituírem enquanto profissionais reflexivos e investigadores.
Tendo como pressuposto a fala da pesquisadora faz-se necessário salientar que seus argumentos são extremamente válidos mediante o olhar da pesquisa e acreditamos que a obra descrita, sintetiza para os leitores questões que se devam considerar cuidadosamente. Ademais, traz contribuições significativas para a compreensão do trabalho docente no sentido de valorizar a pesquisa reflexiva. Sem apresentar respostas prontas, o artigo oferece elementos para se repensar na questão da prática educativa estar paralelamente interligada às pesquisas formuladas pelos próprios docentes. O lugar do professor como investigador na pesquisa ganha novo significado, e novos contornos vão se delineando na prática docente, tornando possível constituir-se como sujeito autônomo no mundo.