Poder e Cobiça (Wall Street)
"Greed is good", diz Gordon Gekko, personagem de Michael Douglas, neste filme marcante do final da década de oitenta. Marcante por que tem um olhar singular ou intenso da câmera? Não. Por que tem atuações incríveis? Também, não. Oras, então, por que? Eu arrisco dizer que o sucesso de "Wall Street" está no tema.
Não quero dizer que os atores estão mal, mas veja, não posso chegar e dar uma de canastra e dizer, "realmente, digno de Oscar". Nem é. Gekko tem aquele cacoete natural do Michael, que aparece em "Assédio Sexual" e "Atração Fatal", que saiu no mesmo ano deste filme que comento aqui. Charlie Sheen é intenso, mas não tem muitos recursos, é pouco criativo. Como ele também se apresenta Daryl Hannah, talvez ainda menos impactante.
O filme funciona porque tem ritmo, trata de algo bastante estimulante, dinheiro, ganância, valores morais, oportunidades. Oliver Stone joga luz sobre o mal. É como quando Al Pacino está na pele do diabo, falando com Keanu Reeves. Temos uma cena parecida entre Douglas e Sheen no filme. É o típico momento em que o mal se revela para o mortal, nascido para viver a plenitude de uma vida humilde, mas peça fundamental na lição que o homem rico deve aprender. Nesta hora, meus caros, deve-se prestar muita atenção nas palavras do maligno. Sim, ali existe lição prática acima do romantismo cego e trouxa dos heróis tomados pela emoção. Não estou dizendo que é correto fazer o que Gekko faz, mas estas palavras são a mais pura verdade:
"I create nothing. I own. We make the rules, pal. The news, war, peace, famine, upheaval, the price per paper clip. We pick that rabbit out of the hat while everybody sits out there wondering how the hell we did it. Now you're not naive enough to think we're living in a democracy, are you buddy? It's the free market. And you're a part of it."
"Eu não crio nada. Eu tomo. Nós fazemos as regras, amigo. As notícias, guerra, paz, fome, distúrbio, o preço de um clip de papel. Nós tiramos o coelho da cartola enquanto todos ficam imaginando como fazemos isso. Agora, você não pode ser tão ingênuo de achar que vivemos uma democracia, não é Buddy? É o Mercado Livre. E você é parte disso"
Por mais obsoleto que o filme seja, existe em Gekko uma importância social muito forte. Além de encarnar o espírito do milionário que não tem outro interesse além de manter sólida sua máquina de produzir dinheiro, suas palavras dão um ouro a nós, que cá estamos, quando nos diz a verdade: a democracia é uma farsa. As pessoas estão controladas pelo jogo das empresas, dos órgãos e instituições, com seus produtos, serviços e propaganda. Conseguem imaginar a vida sem isso? Claro que não. Isto é um fato, foi culturalizado, e o povo vive para sustentar empresários.
Não existe ingenuidade em "Wall Street", a não ser, claro, aquela que dizem que um roteiro exige de seu escritor, mas acredito que isto seja uma forma de manter cinema, literatura, o que for, arte em geral, num patamar abaixo do possível. Gekko entrega o jogo muito fácil, sabe? Nós sabemos que os esquemas entre empresas e ações são muito mais complexos do que isso. Talvez eu precisasse ser mais ingênuo para achar este filme muito bom, mas confesso que gosto de vê-lo e retorno a ele vez ou outra. É um filme legal, pra ser bem exato.