AO CORRER DA PENA - JOSÉ DE ALENCAR
“Uma palavra que cair do bico, daí a uma hora correrá o universo por uma rede imensa de caminhos de ferro e de barcos de vapor, falando por milhões de bocas, reproduzindo-se infinitamente como as folhas de uma grande árvore.
Esta árvore é a liberdade; a liberdade de imprensa, que há de existir sempre, porque é a liberdade do pensamento e da consciência, sem a qual o homem não existe; porque é o direito de queixa e de defesa, que não se pode recusar a ninguém.”
José de Alencar
25/05/1855
O escritor inicia a narrativa com a necessidade de escrever uma crônica e uma rebelião improvável de penas e tinteiros na casa de um amigo. Aos poucos, descobre que eles haviam declarado posições diferentes e estavam decididos em suas opiniões.
O narrador retorna a sua casa para encontrar seu fiel instrumento de escrita e novamente se surpreende com a recusa de sua pena em beber a tinta do tinteiro, os dois “empregados” também haviam encontrado divergências, mas não repetem os discursos, pois, em sua mesa de escrever, o autor não admite o sistema constitucional.
“É o governo absoluto puro. Algumas vezes concedo o direito de petição; no mais, é justiça a Salomão, pronta e imediata.”
O escritor escolhe a pena e fica maravilhado com os lindos desenhos que ela traça sem tinta. A poesia colore as palavras, estrelas, flores... Inúmeras belezas se entrelaçavam numa confusão graciosa.
As fantasias se realizam naquela tarde, o cronista esquece de escrever e passa a observar e compartilhar com o leitor todas as percepções daquele entardecer. Páreos, mesa de jantar, sarau... Todos os momentos são objetos de reflexões poéticas e filosóficas.
Encerra sua fantástica viagem com a leitura de algumas páginas do romance de Guizot e com a constatação: “O grande estadista, o político profundo ainda se julga feliz em poder, depois dos reveses da fortuna, voltar à imprensa e entreter-se com a sua pena a traçar algumas cenas dramáticas e uma história simples do coração humano.”
O escritor, terminada a jornada metafórica, dá o seu recado quando critica a descrença na força civilizadora da imprensa na sociedade e a sua fama de venal e corrompida.
“Porque o homem num momento de humor se revolta contra a chuva, e desespera de apanhar sol, nem por isso os outros deixam de continuar o seu giro, e as estações de seguirem o seu curso regular. Assim é a imprensa.”
O escritor envolve o leitor num mundo ideal com palavras fortes e nos deixa a reflexão sobre a importância da liberdade de imprensa, a força que uma palavra pode assumir na constituição de uma verdade ou de uma legítima consciência.
José de Alencar começou a escrever crônicas em 1854, quando tinha 25 anos, e sua primeira série de folhetins – Ao correr da pena – durou dez meses no Correio Mercantil. Com estas publicações semanais, seu nome ficou conhecido no meio intelectual da cidade.
Alencar testemunhou as transformações da sociedade e escreveu, com entusiasmo, sobre o progresso e as mudanças na fisionomia da cidade do Rio de Janeiro. Os folhetins escritos eram abrangentes, abordavam fatos políticos e econômicos e redesenhavam a cidade do Rio de Janeiro com os primeiros traços de progresso capitalista.
O pai de José de Alencar ocupou vários cargos políticos, entre eles, o de senador no Rio de janeiro em 1830, assim o escritor foi inserido nos meios políticos desde a tenra infância. Formou-se em direito, exerceu a advocacia e foi funcionário do Ministério da Justiça.
Exerceu também cargos políticos e foi nomeado Ministro da Justiça. A constante recusa a comparecer em solenidade oficiais e a forma pouca polida como tratava o imperador D. Pedro II criaram uma série de atritos entre os dois.
Na literatura se destacou como um escritor do Romantismo. A exaltação da natureza, patriotismo, idealização do amor e da mulher eram elementos constantes de sua obra literária. Alencar objetivava encontrar, em seus personagens, o perfil do homem essencialmente brasileiro.
O índio foi revelado em suas obras literárias, como “o Guarani” e “Iracema”, contudo, não encontramos o negro na composição dos seus personagens.
A vida de um dos nossos grandes escritores foi composta de talento e dedicação literária e muita luta em seu engajamento político e social. Sua posição era conservadora: defendia o regime monárquico e era contra a abolição da escravatura.
A liberdade de imprensa, destacada nesta crônica, foi o grande ideal para o renomado brasileiro que sempre buscou a forma de transformar a realidade e criar o real retrato do povo brasileiro.
As palavras se fortaleceram e, hoje, caminham em meios que nosso escritor sequer imaginou. O poder de transformação e de conscientização é enorme e devemos sempre ter o olhar crítico para tentar compreender as verdades que muitas vezes se apresentam manipuladas em notícias corrompidas.
Os primeiros prelos no Brasil se instalaram em maio de 1808, com a chegada da família real, e a Imprensa Régia foi fundada em 13 de maio de 1808. Contudo, o jornal com notícias e análises profundas da situação brasileira e portuguesa na época - Correio Braziliense - foi fundado em junho de 1808 em Londres por Hipólito José da Costa e circulou clandestinamente, com ordem de apreensão, até 1820, quando foi permitido seu ingresso no território nacional.
O jornal Correio Braziliense, mensário com aproximadamente 100 folhas redigidas por Hipólito José da Costa, encerrou em dezembro de 1822, quando seu editor considerou que já haviam periódicos representativos em circulação no Brasil Império.
O Dia da Imprensa – 1º de junho – foi instituído pela Lei Federal nº 9.831, de 13 de setembro de 1999, em homenagem a Hipólito José da Costa.