Vigiar e Punir
Disciplina: A arte de adestrar
Desde a primeira edição, em 1987, até hoje o livro Vigiar e Punir de Michel Foucalt é um suporte nos estudos referentes a educação.É comum ouvir e ler citações de Foucault no que diz respeito a disciplina e a punição. O tema Punição é abordado na segunda parte do livro. Vejamos então um breve resumo acerca deste capítulo.
No início do capítulo, Foucault equipara a disciplina ao adestramento. Para ele a disciplina fabrica os indivíduos, os tornado objetos e instrumentos do exercício do poder. E para que haja sucesso neste poder disciplinar, nos apresenta três recursos: a vigilância hierárquica, a sanção normalizadora e o exame.
A vigilância hierárquica aborda principalmente a disciplina pela vigilância por meio do olhar. Ele nos relata que na época clássica as arquiteturas visavam não mas a beleza, e sim, a vigilância, de modo que o interior das mesmas pudesse ficar visível. Os prédios eram agentes de transformação dos indivíduos, pois atuavam sobre eles, deixando visível seu comportamento, reconduzindo até eles os efeitos do poder, oferecer um conhecimento e modificá-lo.
Nesta época muitas instituições adotaram o tipo de arquitetura circular. Hospitais-edifícios que agiam como operador terapêutico, por meio de sua estrutura, e escolas-edificios que eram um aparelho de vigiar. A idéia é que um aparelho disciplinar perfeito capacitaria um único olhar a ver tudo permanentemente. Estas arquiteturas circulares exprimiam certa utopia política, na qual um indivíduo ficaria no centro, observando e vigiando toda a massa ao redor.
Com o passar do tempo este tipo de vigilância, a arquitetura circular, foi sendo modificado. Primeiro por uma arquitetura piramidal. E mais tarde por uma vigilância menos concentradora, em que um indivíduo observava um determinado grupo, que por sua vez era observado por um superior. Este modelo,adotado nas fábricas, buscou uma vigilância mais específica e funcional e tornou-se um operador econômico.
Este mesmo modelo foi aplicado no ensino elementar, principalmente nas escolas paróquias, em que determinados alunos de uma classe eram nomeados oficiais, e tinham a função de vigiar os demais alunos. Atualmente, este modelo se revela com a implantação dos representantes de turma, os quais, em determinados estabelecimentos, tem a função de anotar o nome dos alunos indisciplinados e repassá-los à instancia superior, o professor da turma. Esta relação de fiscalização está inserida na essência da prática de ensino como um mecanismo que multiplica sua eficiência.
A vigilância hierarquizada funciona portanto como uma máquina que produz o poder. Graças as técnicas de vigilância o domínio sobre o corpo se dá sem o recurso da força e da violência. É uma maneira discreta e indolor de controlar e adestrar o outro.
A sanção normalizadora é outro recurso citado por Foucault. Para ele, na essência de todos os sistemas disciplinares funciona um pequeno mecanismo penal. São sanções, julgamentos, leis próprias com o intuito de reprimir comportamentos ditos incorretos àquele sistema. Trata-se de tornar penalizável qualquer desvio na conduta (atrasos, atitudes incorretas,etc.) e dar uma função punitiva aos elementos aparentemente indiferentes ao aparelho disciplinar.
O autor reitera a idéia que a disciplina tem uma maneira especifica de punir, e que é apenas um modelo reduzido do tribunal. Tudo que se afasta da regra, do regulamento é penalizado. Embora seja visto desta forma, é essencialmente corretivo, ela é menos a vingança da lei que sua repetição. A função do castigo disciplinar é reduzir os desvios por meio do exercício e da repetição do correto. Castigar é exercitar.
A penalidade disciplinar qualifica os comportamentos e desempenhos segundo dois valores opostos, o bem e o mal. Diferente da punição da justiça, feita somente pela separação do proibido, é um sistema duplo de gratificação-sanção. De forma positiva, a penalidade disciplinar intervém no comportamento do indivíduo avaliando-o e modificando-o paulatinamente.
Foucault nos apresenta um modelo de punição por meio de classificação utilizado nas escolas militares, em que as roupas traduziam por meio de “dragonas” de materiais e cores diferentes as qualidades e os comportamentos dos alunos. Este modelo tem um único papel: o de marcar os desvios, hierarquizar as qualidades, as competências e as aptidões , e também castigar e recompensar. Um dos efeitos desta penalidade era exercer pressão constante sobre os alunos para que pudessem alcançar a todas as partes da disciplina com exatidão.
A principal função da punição pela disciplina é normalizar. Ela compara, diferencia, hierarquiza, homogeniza e exclui. Não visa exatamente a repressão, mas põe como principio uma regra ou um regulamento a ser seguido. Enfim traça o limite que definirá a diferença em relação a todas as diferenças. A fronteira externa do anormal.
Finalmente, o último recurso citado é o exame. É a junção da hierárquica que vigia e a sanção que normaliza, permite qualificar, classificar e punir. É um dispositivo altamente ritualizado que não se contenta em sancionar um aprendizado, mas o faz como um de seus fatores permanentes.
Foucault dá três características principais ao exame. A primeira é a do ritual, da cerimônia, na qual o olhar impõe o poder sobre os indivíduos; outra característica do exame como um documentário com campos comparativos que permitem classificar, formar categorias, estabelecer médias e fixar normas; por último é o fato de tornar o indivíduo um “caso”, o qual pode ser descrito, mensurado, comparado e também que tem que ser treinado, classificado, normalizado, excluído, etc.
Por fim, o exame é visto como principal dos recursos citados. Pois é ele que combinando vigilância hierárquica e sanção normalizadora realiza a extração máxima das aptidões. Com ele se sintetizam as disciplinas nas quais a diferença individual é fundamental.