Miaka Yuki: 15 anos e um destino messiânico a cumprir.

 

FUSHIGI YÛGI volume 1: dentro do livro mágico

 

 

FUSHIGI YÛGI volume 1: dentro do livro mágico

Miguel Carqueija

 

Este mangá me surpreendeu em seu volume 1, pela verve, o humor e por apresentar uma heroína realmente interessante numa situação surreal que inclusive lembra aquele filme alemão, “A história sem fim”.

Miaka Yuki, de 15 anos, é uma estudante gulosa e de temperamento imprevisível, capaz de atitudes surpreendentes. A sua aventura começa ao descobrir, numa ala geralmente fechada de uma biblioteca, um misterioso livro, “Os quatro deuses do universo” (Shijin-tenchisho) e, junto com a amiga Yui, as duas são transportadas para um país estranho de aspecto chinês mas conseguem voltar porque o livro ficara aberto e esquecido no chão daquela sala. Infelizmente Miaka deixara em seu diário referência ao rapaz que havia salvo a ela e Yui de salteadores naquele mundo estranho; sua mãe leu o diário, entendeu que ela estava encontrando às escondidas com algum rapaz e brigou com ela. Miaka, porém, vira a mãe — que era separada — passeando com um homem e, indignada, fugiu de casa, empurrando até o irmão. Foi parar de novo na biblioteca, chegou no mesmo lugar onde encontrara o livro e o reencontrou, ainda aberto no chão. Ficou estarrecida ao ver que nele estava registrada sua experiência com Yui no outro mundo. E aí... ela é novamente transportada.

 

Ao lançar sua primeira experiência com o livro mágico no seu diário, Miaka sem querer precipitou os acontecimentos que a levariam de volta à terra de outra dimensão.

 

Resenha do volume 1 do mangá “Fushigi yûgi” (Brincadeira misteriosa), de Yû Watase. Conrad Editora, São Paulo-SP, fevereiro de 2002. Shogakukan, Japão, 1992. Tradução: Dirce Miyamura.

 

Tamahome é praticamente um estranho para Miaka, mas ela não está nada disposta a deixá-lo ir embora e ficar sozinha num país de todo desconhecido (embora consiga entender a língua). Ela simplesmente pula em suas pernas e o joga de cara no chão.

 

“E a menina da lenda abre o portal para um estranho mundo. E a história aqui começa.”

(narração)

 

“Uma pessoa de verdade como eu deve poder fazer o que quiser! Além disso, nada do que eu fizer vai ser registrado no relatório de desempenho escolar!”

(Miaka Yuki)

 

“Como é que eu vou explicar que estamos dentro de um livro e que vim parar aqui quando estava na biblioteca de um outro mundo?”

(Miaka Yuki)

 

“Nossa! Parece que me tornei uma pessoa muito importante!”

(Miaka Yuki)

 

Miaka e seu dilema: quem acreditaria nessa história, mesmo sendo verdade?

 

Este é o argumento básico deste mangá criativo. A personagem Miaka é fascinante, tem seus defeitos e fraquezas mas é leal, corajosa e romântica além de ser capaz de atitudes imprevisíveis. Isso acontece inclusive no seu relacionamento com o original Tamahome, que salva Miaka duas vezes e acha que ela deveria pagar por ter sido salva. Aí, quando passa a comitiva do Imperador Hotohori, de Konan (o país onde estão, fictício e parecido com a China), Tamahome sugere, de brincadeira, que ela pegue “uma ou duas pedrinhas” da coroa imperial. Tomando ao pé da letra Miaka corre até a comitiva e faz o pedido ao imperador — gerando novas complicações. Mas como ela desapareceu e reapareceu, o imperador começa a achar que Miaka é a pessoa profetizada numa lenda — uma garota vinda de outro mundo e que surgiria quando houvesse uma crise profunda no país — e ela traria a salvação com o poder de Suzaku (nome de um dos “deuses” em que eles acreditam).

A coisa complica ainda mais porque no mundo real alguém fechou o livro e o devolveu à estante, fato que aparentemente impede o retorno de Miaka.

Tem algumas coisas incômodas, como Tamahome usar na testa um sinal (kanji) traduzido aqui por “demônio”. Na verdade não se deve brincar com isso, como fazem em tantas histórias de terror. Mas no folclore japonês há muitos seres fantásticos — yumas, youkais, shinigamis, mononokes, ayakashis, que muitas vezes, por falta de equivalente em português, são traduzidos entre nós, nos mangás e animês, como “demônios”. No caso a própria autora fala em “oni”, mas não encontrei tradução para o português dessa palavra.

 

Repete-se aqui a situação vista em tantas séries (Lost, Elo perdido, Shazam, Caverna do dragão, Perdidos no espaço, Ilha dos birutas etc: uma ou várias pessoas que vão parar num local de onde não conseguem voltar. O que vai acontecer com Miaka Yuki?

 

Rio de Janeiro, 12 e 14 de março de 2024.