PATHOS
O que ocorrerá comigo
que me sinto sem abrigo
quando fico junto dela?
Muito a quero – mas se a vejo,
não me sobra outro desejo
que furtar-me a estar com ela.
Até o instante em que me evado
só anseio, atormentado,
escapar dos olhos seus.
E antes mesmo que lhes fuja,
meu desejo já se suja
nos remorsos desse adeus.
Ah, se vivesse meus anos
sem os momentos insanos
que me esperam pela frente...
Penso, porém, no futuro,
e só vejo o vácuo escuro:
nada de bom se pressente...
Para sempre sofrerei!
Resume-se a dor na lei
de uma só contradição:
pois no rosto por que vivo,
deixou Deus meu lenitivo,
mas também a perdição.
O meu dia gasto nela,
fixando a figura bela
que tanto prazer me dá.
Na perfeição do seu rosto,
quis Deus que ficasse exposto
tudo que de mais belo há.
E nas noites, solitário,
quando o meu anseio vário
angustia o coração,
como posso achar ainda
que essa mesma face linda
guarda a minha salvação?
Ah, complacente adorada,
na mudez da madrugada
vens para me amar em sonho!
Satisfaz-me os vis desejos,
vertendo da boca, beijos,
no meu ser todo risonho.
Mas cessada a sua visita,
triste, esbarro na desdita,
que é viver sem seu amor...
E o resto do dia passo,
desejando seu abraço,
calculando o seu sabor...