Ao Pajador Missioneiro
O silêncio prenuncia
um vazio no universo.
Estende o dono do verso
como quem vela a poesia.
Revelam-se noite fria,
poetas em penitência
e a paja a pedir paciência
para o gélido pampeiro.
Ao Pajador Missioneiro
não cabe eterna ausência.
Mostra o vermelho do chão
no lenço que não acena.
Pinta uma imagem pequena
de quem foi imensidão.
Para quem vê coração,
ressalta plena consciência
que o conteúdo é essência,
não a casca do campeiro.
Ao Pajador Missioneiro
não cabe eterna ausência.
A cara da lua cheia,
pálida, desenxavida,
parece sugar a vida
à fraca luz que prateia.
O cosmo, em sua ceia,
indecifrável à ciência,
supre a sua carência
co’a energia do copleiro.
Ao Pajador Missioneiro
não cabe eterna ausência.
Há uma nuvem de luz
e nela uma face vara
com energia mais clara
que só a Ele faz jus.
Desprega-se de sua cruz
em natural evidência.
Planta na semiconsciência
à seara do troveiro.
Ao Pajador Missioneiro
não cabe eterna ausência.
O céu carente de aceno,
sem rima, recolhe temas
e deixa vagar poemas
machucados de sereno.
A terra levou um bueno
pra sempre e sem clemência.
O pranto, por insistência,
ferve a alma no braseiro.
Ao Pajador Missioneiro
não cabe eterna ausência.
Ficam o som, a imagem,
e a letra aprisionada.
Vai o tudo que é nada
e o nada é todo mensagem:
é chuva, pó, estiagem,
sombra, luz, pampa, querência
guitarra, irreverência
e último verso primeiro.
Ao Pajador Missioneiro
não cabe eterna ausência.
A vida que é um jogo
não conta o tempo na tarca.
Só marca que possui marca.
A quem não tem não há rogo.
Só timbra com ferro e fogo
na anca da existência,
quem viveu com excelência,
e a este, saco o sombreiro.
Ao Pajador Missioneiro
não cabe eterna ausência.
(Gravado nos CDs Pajadores de Três Pátrias e Tributo a Jayme Caetano Braun, também publicado no livro Pajador do Brasil- Estudo Sobre a Poesia Oral Improvisada, de minha autoria)