Décima Glosada
Mote
Fica só rindo de mim,
mantém a minh’alma presa,
só pra me ver colher sonho,
para decretar-me o fim.
Glosa
Me chama e já me contém
a ela não me contenho,
por isso que sempre venho
contar tudo a ninguém.
Ela me suga também,
me devolve o que é ruim
Se esconde num confim,
me prende em sua sentença,
depois por não ir à prensa,
fica só rindo de mim.
Vem me cobrar perfeição
e atenção demasiada,
contudo, não me dá nada.
Quer diamante do carvão.
Nem sempre vira canção,
tampouco me põe à mesa.
Tem mania de turquesa
quando se expõe para a rima,
mesmo sendo obra prima
mantém a minh’alma presa.
Nasce terreno baldio.
Quer planta que enraize.
Ordena que eu improvise.
Exige que eu seja rio.
Me desnuda quando em cio.
Me devora se me exponho.
Ao ver que me recomponho
vem com mais voracidade,
arando a realidade
só pra me ver colher sonho.
Às vezes com sua asa
se abraça em mim e flutua,
porém quando avisto a lua
me joga na terra em brasa.
Me apaga e me arrasa,
mas não me abandona, enfim.
Com cara de querubim
sorri como satanás.
Dirá: o pajador jaz
para decretar-me o fim.
(Extraído do livro Pajador do Brasil- Estudo Sobre a Poesia Oral Improvisada, de minha autoria)