Ganhando o pão onde comem a carne.

Eu já deveria ter imaginado antes, eu não sou do tipo que gosta de trabalhar onde os outros se divertem, não que eu seja um amargurado, ranzinza, ou coisa pior como um moralista, apenas minha ideia de diversão é mais reservada, muitas vezes se resumindo a meia-dúzia de latas de cerveja e eu mesmo; por um bom período da minha vida, consegui manter isso ativo em minha rotina, a diversão dos outros indo para um lado e eu indo para outro lado, mas numa curva em que eu estava desprevenido, isso veio direto ao meu encontro e de todo tipo de pensamento a respeito de diversão, fui parar no que eu menos poderia imaginar… Um puteiro.

Ver aqueles caras que frequentam esse tipo de lugar me faz mal, muitos ali são simplesmente vazios, tentam se preencher com alguma coisa, aliás, vazios em termos, pois a carteira deles geralmente está farta e eu nem preciso perguntar ou invadir o espaço deles pra saber, eles por pouco não anunciam aos quatro ventos, logo pedem alguma bebida superfaturada e logo em seguida tentam grudar no braço de alguma garota, eu preciso dizer que algumas delas se parecem e muito com aquelas garotas populares da escola que jamais ficariam com os “perdedores”, já os caras lembram muito os perdedores, sendo assim, acredito que aqui em algum ponto é como se o universo se equilibrasse. Mas, é necessário dizer que não são todas, “male male” se trata da maioria, muitas ali são garotas incríveis com quem eu gostaria de ter alguma amizade e até mesmo gostaria de sair pra dividir as seis latas de cerveja.

Eu consigo ver eles entrando e saindo pela porta da entrada, entram geralmente em grupos, um ou outro bonzão entra sozinho, acredito que quer passar alguma altivez, alguma autoridade, inclusive cheguei a ver algumas autoridades por lá, nada tão sério, mas é incrível como autoridades e celebridades são dados a ménage e a orgias, alguns conhecidamente casados, filhos e tudo mais e estão lá nessa zona em todos os sentidos. Ninguém que pisa os pés lá com o intuito de aproveitar sai sem ter gasto pelo menos um salário mínimo, não importa qual seja o valor no momento em que esteja lendo, para ser mais justo, já cheguei a ver clientes dispostos a gastar o equivalente a dois anos de salário mínimo, aquilo me enojava, me deixava com raiva, cada vez mais me fazia pensar que eu jamais conseguiria fazer parte daquilo.

A bem da verdade, as únicas pessoas por quem eu nutri um carinho e respeito foram as meninas, em termos de condições, o trabalho delas era pior do que a minha, mas era só até a página dois, pois inevitavelmente elas ganhavam mais do que eu, não digo que elas não mereciam, longe disso, mas era inevitável a comparação dos ganhos no fim da noite e isso sem contar as gorjetas, todo mundo tinham uma chance grande de ganhar boas gorjetas, menos eu, o meu posto não me possibilitava tanto, ou seja, mesmo dentro do jogo deles, eu tinha clara desvantagem. Obviamente isso dava tons a minha postura para trabalhar, pós trabalho também, o simples estresse que o ambiente me causava me fez descontar em bebidas e cigarros as vezes, não consegui me viciar em cigarro, mas todas as vezes em que fumei era como se tentasse tirar a raiva de dentro de mim com a fumaça que eu expelia… Não funcionou.

Trabalhar em um puteiro é uma experiência e tanto, mas gostaria de não voltar a fazer, um lugar como aqueles tem tentáculos invisíveis e quando menos se espera, ele te agarra e te prende lá, te sufoca, tira seu espírito, tira sua vontade. Não frequentei um puteiro da maneira convencional, mas foi como poderia ser e no fim, eu devo dizer, Van Gogh tem um pouco mais de honra depois de morto.

Henrique Sanvas
Enviado por Henrique Sanvas em 26/03/2023
Código do texto: T7749564
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