Mão esquerda
Deve ter acontecido com vocês também. Trata-se de um assunto delicado, não se pode ignorar. Refiro-me ao que passamos nos últimos anos neste país tão sofrido, mais para uns do que para outros.
Dispor de um trocado para uma pessoa que nos aborda na porta do supermercado, no farol, nas ruas, é uma realidade do nosso país e que muito entristece quem se importa com o outro.
Essa humilhante rotina de mendicância se tornou insuportável na pandemia de Covid-19, porque além das consequências da má gestão da própria doença, ocorria junto, o desemprego, a inflação, o estresse de se trancar dentro de casa, o medo.
A cultura de doar é rotina para muitos brasileiros. E, não é com certeza para muitos outros, destacando-se que doam mais, condoem-se muito mais os de situação econômica inferior. Como me disse uma professora do ensino médio: “comover alunos da classe média é tarefa árdua, quase impossível!”. Bom, eu quero um país com justiça social, empregos humanizados para todo mundo, que a vida seja valorizada, em educação, saúde e cultura e lazer; porém, como essa condição nunca chega, e nem vai chegar sob o capitalismo, a gente não resiste ver um ser humano abandonado, e doa.
No segundo ano desse inferno, como estava vacinada, podia ir a alguns locais, comprar comida, remédios, algo assim. E era tanta gente nas ruas, com fácies de fome, e eu pelo menos enlouqueci. Ainda, as necessidades, os pedidos de ajuda, apareciam também, a cada página das mídias sociais.
Um dia constatei que estava entrando direto no cheque especial. Eu, que jamais em toda a minha já longa vida, nunca avancei tal regra. Justamente nessa semana de choque financeiro, recebi ao invés de mais um pedido de colaboração, dentre as dezenas no dia-a-dia, uma advertência, tipo “se você não vai colaborar vou encerrar o envio para você”. Eu me senti agredida e muito ansiosa para responder ao interlocutor, mas, nessa comunicação digital, há a desvantagem de ser unidirecional, e nunca poderei saber quem se dirigiu a mim dessa forma, e a pessoa jamais saberá os meus motivos de não fazer o que ela achava importante que eu fizesse.
A mídia, os partidos políticos, comitês de eleição, são muitíssimo importantes, e devemos colaborar financeiramente e seriamente. Porém, a primeira função da imprensa e partidos na sociedade que se pretende transformar é com certeza, oferecer conteúdos de qualidade, explícitos em suas fontes, que ajudem a formar consciência política, e a inserir os cidadãos na realidade do país e mundo.
Porém, o dinheiro de uma pessoa não pode ser mais importante que a própria pessoa, não na política que a gente defende. Não se destrata alguém que não aceita entregar dinheiro em algo que não acredita. Antes, é preciso aprender a ganhar a pessoa para sua causa, e se você anda perdendo pessoas, o problema é seu!
Fiz um levantamento das minhas doações realizadas.
Mensalmente (3): Entidade defesa Direitos Humanos, Jornalismo, Portal de notícias.
Contribuição avulsa (3): Jornalista, Cartunista, Enciclopédia.
Ações de Solidariedade (18): Institutos sem fins lucrativos, Cozinhas solidárias, Moradores de rua, Projetos local e fora; Povos Indígenas, Pandemia na América do Sul, Enchentes estados sudeste e nordeste.
Doações relacionadas à Educação (2): estudante no exterior (corte da bolsa, situação dificílima), Universidade Federal – Moradia.
Nas ruas: Passei a andar com um bolo de notas de 20 reais e distribui, e fiz muito isso.
Comitê eleitoral: 2
Acabo de infligir o evangelho que diz assim: “ao dares esmola, que a tua mão esquerda não saiba o que fez a tua mão direita”. Pois, é minha mão esquerda quem quis transferir um pouco do que tenho para quem estava tão abandonado.
Tive que tratar disso, para marcar o período funesto da pandemia em nosso país, e cujos responsáveis não sofreram ainda qualquer incômodo. Também, minha intenção é animar pessoas que assumem funções políticas em partidos para reverem suas próprias ideias de relação humana, e principalmente, de ideologia.