COMO ENTENDER A MAIÊUTICA SOCRÁTICA E APLICAR NO DIREITO

Através dessa pesquisa, objetivamos entender a maiêutica socrática como exemplo de educação e de relacionamento entre educador e aluno. Ao fazermos isso, não estamos, desprevenidamente, lendo a filosofia socrática de modo descontextualizada, pois sabemos qual era seu contexto histórico e como se configurava esse processo pedagógico narrado nesse trabalho.

Sócrates, já no final da sua vida, chega à conclusão que ele não deve ser mais que facilitador, um intermediário, que ajuda com que as ideias concernentes aos alunos venham à tona. Ele valoriza o aluno e sua capacidade, no entanto, não o faz por conhecer o potencial de seus seguidores, antes, por respeitar a dignidade e capacidade do ser humano. Entretanto, há muito que se cuidar nesse processo, que não é de modo algum simples, e que será melhor detalhado posteriormente.

Para entendermos a maiêutica socrática, ou seja, o método de ensino que Sócrates se utilizava, é estritamente necessário que saibamos um pouco sobre sua história, para que não façamos, de modo precipitado, uma leitura incorreta do mesmo. Além disso, a teoria maiêutica de Sócrates é como que um resultado das diversas experiências que ele viveu, e, por isso, se torna essencial conhecermos sua vida.

De fato, Sócrates passa por diversas mudanças em sua vida, desde sua juventude até sua morte, e o desenvolvimento de suas ideias se dá de modo contínuo, e muito ligado com fatos da vida do filósofo, como encontros e desencontros, que geram a diferenciação e desenvolvimento das teorias que o tornaram respeitado.

Podemos datar a vida de Sócrates de 470 a.C. a 399 a.C., período conhecido como o século de “ouro” na idade de Atenas, fato tal que faz muito sentido com relação e como se deu a vida desse grande filósofo. Podemos compreender nesse momento de democracia ateniense, a base para a dialética socrática, pois, justamente nesse período deu-se a valorização do diálogo, da opinião do outro, ou seja, foi justamente nesse período que surgiram os grandes oradores e a exaltação da retórica, o que fez com que Sócrates e sua dialética estivessem bem localizados.

Sócrates teve berço pobre, e assim se manteve duramente toda sua vida, nunca aceitou dinheiro de seus seguidores e admiradores e era extremamente simples quanto ao viver e vestir. Andava pelas ruas de Atenas descalço, tanto no frio quanto no calor. Sócrates foi um cidadão exemplar, mesmo com suas severas queixas quanto às leis que regiam a democracia ateniense. Como prova disso, podemos citar sua brilhante participação nas campanhas bélicas atenienses, nas quais ele ficou muito conhecido por sua destreza e lealdade.

De fato, para nós é de complicado teor a análise de Sócrates pela ausência de obras de sua autoria, Sócrates nada escreveu. Quanto a isso, devemos a três personagens, inicialmente, a validade do estudo de Sócrates, a saber, Aristófanes, Xenofonte e Platão.

Aristófanes era escritor de comédia, e representou Sócrates na sua obra “as nuvens” que data de 423 a.c., e trata, comicamente, de Sócrates como um falso sábio seguido por muitos. Como logo se percebe, o teor narração de Aristófanes é semelhante às acusações daqueles que julgavam a Sócrates em 399 a.c.. Por isso, considerar Sócrates pela visão de Aristófanes é como conhecer sua história através daqueles que o condenaram à morte.

Através de Xenofonte podemos conhecer um Sócrates totalmente diferente. Primeiramente Xenofonte foi discípulo e admirador de Sócrates e não escrevia nem com intenções filosóficas, como fez Platão, nem com intenções sarcásticas, como fez Aristófanes. Antes se resguardava a contar histórias sobre Sócrates, e ressaltava a integridade de sua vida como cidadão e sua moral exemplar. Xenofonte narra isso em vários de seus trabalhos, e o faz de maneira simples, sem entrar em pormenores quanto às teorias Socráticas. De Xenofonte podemos extrair um Sócrates histórico e bom, com boas ações e bons ideais. Todavia, Xenofonte não acompanhou os últimos dias de Sócrates e por isso fica uma lacuna importante em sua obra (CHAUÍ, 2002, p.183).

Finalmente podemos ver como foi a visão platônica de Sócrates. Platão, sem dúvidas, foi o maior apologista de Sócrates. Platão considerava Sócrates como sendo o homem mais justo que ele conhecera. Ele escreveu muito sobre Sócrates. Dos 29 diálogos de Platão 27 falam de Sócrates e em quase todos ele é o personagem condutor da discussão. Portanto, é a partir de Platão que chegaremos ao nosso conceito de Sócrates, pois é nele que podemos ver os relatos mais fiéis sobre o antigo filósofo (BENOIT, 2006, p. 32).

Para iniciarmos nossa análise do Sócrates platônico devemos entender que, apesar da preponderância dos escritos platônicos tais obras foram recheadas com informações sensíveis, com ocasiões e fatos, portanto devemos seguir as palavras que de fato constroem os diálogos e não a tradição posterior de suas interpretações. Inicialmente, segundo o diálogo Fédon, Sócrates possuía um grande interesse em investigar a “causa”, e assim se aproximava muito do fisiólogo.

No entanto, entrou em crise ao saber que quanto mais estudava tais assuntos mais aumentavam suas dúvidas e as teorias da fisiologia não o satisfazia. Nesse período lhe chegou ao conhecimento a teoria de Anaxágoras, cujo, a inteligência ou o espírito teria sido o ordenador e causa de todas as coisas. A princípio, Sócrates se entusiasmou com tal teoria, no entanto, logo começou a ir contra a mesma, pois dizia que não podia ser um “espírito exterior” a causa de tudo.

Depois dessa decepção e ainda muito jovem Sócrates inicia sua formulação da tese do mundo das ideias. No entanto, algo acontece que influi em toda sua vida futura, pois sempre se lembraria de tal feito. Por ocasião de visita à Atenas, Parmênides de Eléia e seu discípulo Zenão conhecem Sócrates, e o jovem de aproximadamente 20 anos apresenta aos experientes filósofos sua teoria. Nesse momento eles começam a interrogá-lo sobre diversas coisas, sobretudo sobre a impossibilidade da unificação da ideia do ser, o que iria contra a tese do mundo das ideias. No final do diálogo, Parmênides encurrala Sócrates que se reconhece incapaz de explicar todos os conceitos relacionados ao mundo das ideias (Parmênides, 131b-131e, in Diálogos).

Depois de tão chocante experiência Sócrates não podia fazer nada além de silenciar, pois estava convencido que nada, de fato, sabia. Portanto, a partir daí surge um período no qual Sócrates vive sua aporia, durante dez anos não participa de diálogos e permanece em silêncio. Somente mais tarde durante a narração da Apologia por Platão é que se torna conhecido o que aconteceu nesse período. Chega a Sócrates a notícia de que um velho amigo, Querofonte, havia perguntado a Pythia, sacerdotisa que falava pelos deuses), se havia algum homem mais sábio do que Sócrates e que sua resposta havia sido negativa. A partir de então aumentou para Sócrates a sua confusão, pois ele não entendia qual era o sentido da palavra da profetiza. Somente após longa reflexão conseguiu entender o que significavam aquelas palavras.

O queacontecia era que nenhum outro homem sabia verdadeiramente de algo, no entanto se julgavam sábios, enquanto isso, Sócrates, ao menos, tinha a convicção de que nada sabia, o que o tornava o homem mais sábio de todos. Desse modo, as

revelações délficas tiraram Sócrates do porão silencioso que Parmênides havia o condenado. Com a descoberta do “saber que não se sabe”, Sócrates recomeça a falar, no entanto paulatinamente. O seu contato com a sacerdotisa Diotima vem ajudar no amadurecimento da seu discurso. Só a partir desse encontro Sócrates entende o conteúdo afirmativo do saber que não se sabe.

Diotima fala a Sócrates revelações de Eros (o amor), e lhe ensina “as coisas do amor”. Mais do que isso, Diotima lhe diz que Eros, assim como o saber que não se sabe é um intermediário. Eros se apresenta como um intermediário entre o mundo divino e o mundo dos mortais. Assim, podemos entender que o saber que não se sabe é um intermediário entre o mundo tangível e o mundo das ideias, o que fez com que Sócrates tivesse nova vontade de dialogar e mostrar sua teoria do mundo das ideias.

Nesse período, Sócrates tinha cerca de 36 anos e, na tentativa de vencer dentro de si o fantasma do velho Parmênides, recomeça a revelar seu saber. A partir de agora os diálogos de Sócrates não são mais como antes, quando ele se apresentava como um menino em busca de razões e causas. Agora Sócrates já sabe o que sabe e caminha na direção da disseminação dessa ideia e na busca de “belos corpos”. Iniciam-se os diálogos com os Sofistas e com os Jovens que o admiram por sua sabedoria e muitas vezes se apaixonam por ele (JERPHAGNON, 1992, p.23).

Os sofistas ficaram desconcertados diante de tão complexa construção socrática e muito se contradiziam na tentativa de refutá-lo. Sócrates, que era considerado por muitos um sofista, foi de encontro aos mesmos criticando a superficialidade de sua retórica sem conteúdo, e com isso ganhou muitos inimigos (REALE, 1990, p.101).

Só que para Sócrates destruir o pensamento daqueles que se diziam sábios e colocá-los contradições, ele também abriu mão de seu conteúdo positivo, pois seus diálogos tinham intenção apenas de confrontar os sofistas. Essa fase também é marcada pela sedução de Sócrates. Ele procura corpos belos, os seduz e ensina os jovens algo sobre a sedução como no diálogo Lysis, que é como um manual de sedução (BENOIT, 2006, p.45).

Um bom exemplo de jovem belo seduzido por Sócrates é Alcebíades, filho da aristocracia ateniense muito corajoso e talentoso. No diálogo com Alcebíades, que mais tarde se destacou na história grega, Sócrates introduz um novo elemento no seu discurso, a saber, o “conhece-te a si mesmo” (O primeiro Alcebíades, 132d-133c, in Diálogos).

Sócrates julga necessário a busca pelo autoconhecimento pois, a partir dessa busca o indivíduo culminará no conhecer sobre o que é de fato o “ser em si do homem”. Por isso, podemos chegar à compreensão de “alma” de Sócrates, que seria o homem fora de seus atributos acidentais e sua hombridade material. Mais adiante, após delongada analogia, Sócrates conclui que uma alma deve estar em contato com outra alma para que possa se conhecer, pois é necessário algo externo a si próprio para que reflita aquilo que é de fato o seu ser.

Nesse momento podemos perceber um grande salto na filosofia socrática, pois há a inserção de um saber afirmativo em sua temática, e não apenas o “saber que não se sabe”. Podemos comprovar isso nos próximos diálogos de Sócrates como “Górgias”, provavelmente em 427 a.C., em podemos, nitidamente, notar um “novo Sócrates”, um Sócrates que não se importa mais apenas com a negação do saber externo a ele, agora ele com partilha de um saber afirmativo que lhe dá subsídios para diálogos que desconstroem uma ideia mas tratam de afirmar outra.

Como outra consequência desse momento conheceremos um Sócrates intolerante com seus interlocutores, pois ele considera que tudo que não possui “um saber de si mesmo” não tem razão de ser. Além disso, ele vai além, dizendo que a retórica é algo sem rigor, que não pode ser considerado nem na verdade ele considera a retórica como sendo uma adulação.

Agora nos resta uma dúvida. Não irá Sócrates criticar a política que era tão influenciada pela sofística e pela retórica? Podemos entender que era cedo ainda para um dever-ser político. Surge para Sócrates outro grande problema quando ele tenta buscar as verdades além do próprio saber-de-si, e para tal explicação ele recorre a saberes mít

icos. Diz ele, que a alma é imortal e que o homem pode se recordar de fatos e saberes de outra vida, o que faz com que a verdade não se destrua e acabe no nada da morte. Essa é a teoria da reminiscência, que apesar do seu caráter mítico faz

sentido no contexto (CHAUÍ, 2002, p. 195).

Ainda outra questão faz-nos refletir muito sobre a ascensão do saber socrático. Poderiam outros homens participar desse saber? Com essa questão surgi uma nova crise para Sócrates que se sente sem testemunhas para o seu saber e tenta refletir sobre quais tem sido as consequências do mesmo.

A alegoria da caverna narrada no diálogo “A República” vem de encontro com essa fase e nos leva a entendermos que Sócrates propõe ao filósofo uma ação participativa na elaboração de sua dialética objetivando a libertação daqueles que ainda não tiveram a compreensão do mundo das ideias. Pois, assim como narra o mito, aquele que teve o conhecimento de algo exterior deve proporcionar a quem não teve a oportunidade de conhece-lo por via dialética, o que é, a princípio uma trabalhosa investida, mas que tende a ser boa e aproveitável. Após tão bela reflexão Sócrates chega a propor um modelo de “cidade padrão”, que seria íntegra em moral e grandiosa em beleza e saber (Platão, A República in Pensadores).

No entanto, ainda no livro “A República” podemos ver Glauco suplicando a Sócrates que lhe diga o que é de fato sua Ideia de Bem, e isso nos leva a entender uma nova frustração da parte de Sócrates que não consegue, ainda que com muito esforço, conceber tal ideia. Novamente, verificamos que apesar de toda evolução do pensamento socrático, ele volta a uma indeterminação. E essa indeterminação o acompanhará Sócrates em seus últimos dias.

A Maiêutica sem novas perspectivas de pensamento afirmativo, Sócrates mostra sua nova fase, que tendo como finalidade o “parir do saber”, a maiêutica, ou a arte da velha parteira. Sobre a maiêutica, a arte de “parir o saber”, podemos ver a bela narração que Sócrates faz ao jovem Teeteto no famoso diálogo narrado por Platão, que é conhecido pelo nome do rapaz. Logo no começo do diálogo Teeteto Sócrates dá sua definição de maiêutica, e faz isso porque afirma que algo dentro da alma do jovem Teeteto está querendo vir à luz.

Nesse momento Teeteto faz um gracejo, e diz a Sócrates que só pode dizer algo sobre aquilo que sente, afirmando assim não sentir nada em sua alma que pareça querer nascer. Sócrates começa então a explicar o que afirmava ele estar acontecendo com o jovem Teeteto. Segundo Sócrates, assim como sua mãe fora uma famosa parteira ele também praticava semelhante arte. A diferença principal que Sócrates expõe é que, sua mãe praticava o parir do corpo, ao passo que ele, o da alma. Não que ele queria dizer que havia um nascer constante de novas almas a partir de outras, longe disso, para o filósofo, os frutos da alma são o saber, e é isso que ele pretende fazer, ajudar jovens a parir o saber que sai de sua alma, pois, segundo Sócrates é na alma que reside todo o saber pertinente ao ser humano (REALE, 1990, p.99). Além disso, cabe dizer que, já tangendo o conceito do “mundo das ideias” socrática, podemos ver que, para ele, o saber que há no ser humano já existe em sua alma desde antes do seu nascimento, já lhe é certo e completo. Com isso, o parir do saber não é mais do que o relembrar, trazer à tona aquilo que já pertence ao indivíduo desde de sua “vida” extra corporal, ou seja, o saber já é pertencente ao homem, ele apenas vem a memória através da maiêutica (JERPHAGNOM, 1992, p.23).

De modo nenhum, podemos afirmar Sócrates como sendo um místico, o que ele faz é colocar o homem em seu devido lugar. O homem não é Deus, e nem mesmo a medida de todas as coisas. Ou seja, segundo seu modo de pensar, o homem era apenas uma parte do todo, e era subordinado ao Deus que era a inteligência ordenadora (REALE, 1990, p. 92).

Entretanto, voltando ao tema principal da maiêutica, reflitamos sobre o diálogo Teeteto. Para que o Jovem entendesse o que ele queria dizer, Sócrates explanou sobre a arte das parteiras. Sobre as parteiras, Sócrates disse que cabe às mulheres que um dia conceberam, e que, todavia hoje não mais possuem tal capacidade a arte de parir.

Segundo ele, isso se dá sobre ordenança da deusa Ártemis, que ainda no momento de seu parto ajudou sua mãe a parir seu irmão, Apolo. Ártemis, que nunca havia parido, era quem concedia às mulheres a capacidade de executar a arte de parteira. Todavia, como o ser humano é muito fraco, segundo Sócrates nos narra, somente as mulheres que já haviam um dia parido poderiam ajudar no parto de outra, pois é necessário que quem esteja realizando o parto saiba mais sobre isso, ou melhor, seja mais experiente do que a grávida. Já nesse aspecto, podemos ver os primeiros pontos da analogia socrática, pois, o que ele quer dizer, é que, quem ajuda no parir do saber deve ter mais experiência do que quem está parindo, ou seja, é necessário que já tenha superado esta fase, para que, com certeza daquilo que já fez possa ajudar quem ainda está em tal atividade (BENOIT, 2006, p.75).

As semelhanças entre a arte da velha parteira e do parir do saber não acabam por aí. Um próximo ponto importante da analogia Sócrates apresenta através de uma pergunta que possui resposta negativa de Teeteto. Sócrates pergunta se o rapaz sabe que as parteiras são famosas por serem também casamenteiras. Diante da ignorância do rapaz ele o ensina que são, e ainda acresce dizendo que o que elas se orgulham mais de fazer é arranjar o casório do que cortar o cordão umbilical. Isso se dá porque, segundo nos mostra o antigo filósofo, há apenas uma arte encarregada do plantar, cuidar e colher os frutos. Não há duas artes nas quais cabe a uma plantar e a outra colher. Por isso, Sócrates afirma que, se uma parteira colhe o fruto, que é a criança, se sente muito mais orgulhosa de tê-lo plantado. Isso também se compara com a alma e o saber. Se pode-se dizer que, através da maiêutica o filósofo colhia o fruto da alma de alguém, que era o saber de algo, quanto mais se sentiria ele honrado por ser responsável pela arte completa, ou seja, por ter também plantado a semente na alma fértil. Esse é, segundo o filósofo, uma das partes essenciais da arte que ele tenta explicar ao jovem, pois, com a experiência de quem já pariu pode se ter melhores possibilidades de procriação a partir de um casamento bem feito. Todavia, após todas as semelhanças, Sócrates aponta uma diferença notável entre a parteira e ele. Essa diferença faz com que ele afirme que a arte que ele exerce é em muito superior à da parteira.

Nas palavras do próprio filósofo (Teeteto VII p.8 in Diálogos): Eis aí a função das parteiras; muito inferior à minha. Em verdade não acontece às mulheres parirem algumas vezes falsos filhos e outras vezes verdadeiros, de difícil distinção...porém, a grande superioridade da minha arte consiste na arte de conhecer de pronto se o que a alma dos jovens está na iminência de conceber é alguma quimera e falsidade ou fruto legítimo e verdadeiro. Essa diferença consiste no seguinte: a parteira não precisa distinguir se o fruto do parto é realmente uma criança, ou se é alguma outra coisa.

Pelo contrário, o filósofo, tem que saber separar os conhecimentos verdadeiros dos falsos, daqueles que não são mais do que um engano. Sobre isso, Sócrates afirma que, muitas vezes jovens se frustraram com ele, diante do parir do seu saber ouve a desilusão e a repreensão do parteiro, que dizia que aquilo não passava de uma falsidade, uma ilusão, e não era verdadeiramente o fruto esperado da alma.

Nesse saber separar entre o que é ou não o verdadeiro fruto da alma que Sócrates conclui estar à parte mais árdua do trabalho de sua arte, e por isso, ele afirma ser ela superior a arte de sua mãe. Diante dessa grande dificuldade da arte de parir o saber, logo afirma-se que, quem nunca engendrou, não pode também ajudar no parte de outras pessoas, pois, há muitas dificuldades e não poucos detalhes a serem vistos ante um parto, e por isso, segundo Sócrates um ser humano que nunca engendrou é ignorante demais para ajudar e presidir

outros partos.

Agora, outro saliente detalhe nos resta, que não pode ser de modo algum aqui omitido. Por que Sócrates afirma que apenas quem não pari mais tem a capacidade de presidir outros partos? Pelo simples fato de que: somente quem não engendra mais tem suas ideias fixas. Ou seja, enquanto você está na atividade de engendrar, ora você pode pensar algo e depois defini-lo de modo diferente, pois cada novo parto gera uma nova experiência e reflexão. Por isso, somente quem já encerrou suas atividades férteis é que pode ajudar

outros em suas atividades, pois somente eles já terminaram sua experiência e já sabem o que fazer em determinada situação. Não que sua ideia seja completa e perfeita, todavia o seu conceito é terminado, e não permite que haja contradições em momentos cruciais do parto. Ou seja, as atitudes do homem que vive em sociedade devem ser ponderadas, e, especialmente nesse caso, é necessário a cautela de alguém que saiba muito para presidir o parto (JERPHAGNOM, 1992, p.24).

A partir dessas breves diretrizes já traçadas, podemos entender como se deu o método de ensino socrático. Contextualizando-o, seria como que, o professor não tivesse papel maior do que o de ajudar o aluno na concepção do saber. Isso não pelo fato de ser o próprio professor o “pai” daquele saber, mas antes, por ele possuir a arte de casamenteiro, ou sejas, de dar as coordenadas corretas para que houvesse a concepção de algum saber.

Mesmo não sendo o professor “pai” daquele saber ele exerce grande responsabilidade sobre o mesmo, pois foi ele quem o acompanhou desde a concepção até o parto. Além disso, o momento exato do “parto” do saber é importantíssimo, ao passo que, somente alguém muito bem qualificado pode exercê-lo. Por isso, ninguém ainda esteja em atividade reprodutiva, ou seja, ninguém que ainda esteja incerto sobre o que é de fato um parto, pode auxiliar o mesmo, de modo que, quem nunca construiu um saber dessa forma também não pode auxiliar outras pessoas. Não é suficiente o saber que se transmite nesse caso. É necessário que quem ajuda outra pessoa no engendrar do saber tenha vivido aquela experiência, pois, segundo Sócrates, o ser humano é fraco demais para fazer algo que não tenha vivido. Além do mais, para discernir aquilo que é de fato um saber positivo, e aquilo que não é mais do que falsidade, é necessária grande experiência, e é justamente nisso que

deve consistir o papel elementar do educar ao modelo socrático.

É evidente que essa relação “Parteiro versus Parturiente” não se dá apenas na relação “Mestre versus Aluno”. Todavia, Sócrates narra a Teeteto como se dá a maiêutica num caso bem definido: Teeteto está prestes a formular seu conceito de conhecimento. Devemos lembrar que Sócrates trabalhava com “definições de essências”, e esse é o momento específico do parir (MARÍAS, 1987, p.62).

Exatamente por isso, essa relação assemelha-se mais com a relação “mestre versus aluno” do que com qualquer outro tipo de relação.

A educação, refletida sob o olhar da maiêutica, faz-nos pensar principalmente sobre o real papel do educador. Não que desconsideremos a teoria do saber que Sócrates ensina ao jovem Teeteto, antes, julgamos mais interessante para esse trabalho entender o método utilizado para tanto.

Sabemos que o ato de educar não pode se dar de maneira desnorteada, pelo contrário, deve obedecer a métodos que o auxiliem. Desse modo, o filósofo grego já nos legal tal contribuição há mais de vinte séculos.

Portanto, vemos na maiêutica socrática um método de ensino no qual o educador não é visto como a “fonte” a ser bebida pelo aluno, pelo contrário, ele é aquele que ajuda o aluno a gerar sua autonomia enquanto homem, cidadão e discente.

Derradeiramente podemos entender que as narrativas de Platão nos levam ao conhecimento de Sócrates, de sua história e de como se deu a construção de sua filosofia. Após a sua morte foram muito que lhe deram atenção e analisaram cuidadosamente sua filosofia, tanto para construí-la quanto para criticá-la.

Aquilo que de fato Sócrates foi pode ser muito discutido. Talvez há quem ainda o considere um sofista. O que é certo é que a cada desconstrução através da dialética negativa podemos lembrar da bela filosofia Socrática e de sua morte como consequência da mesma, assim poderemos criticá-lo ou admirá-lo, mas sem dúvidas a história sempre ser a justa em lembrar de tão grandioso personagem.

ERNESTO COUTINHO JÚNIOR
Enviado por ERNESTO COUTINHO JÚNIOR em 21/09/2022
Código do texto: T7611098
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