Sindicato e a panela de pressão: uma analogia perfeita
A criação de sindicato no Brasil está diretamente ligada com ampliação dos partidos políticos e a ampliação da vida política brasileira, principalmente com a criação dos partidos de massa, os quais são oriundos de diversas camadas de trabalhadores brasileiros. Do ponto de vista formal, os sindicatos foram instituídos no Brasil, no governo Vargas, com a Lei sindical de 1931 (Decreto 19.770). Importante constar que após a legalização de sindicatos no país, com os vários processos de ruptura democrática, tanto os partidos políticos de massa e os sindicatos tiveram seu funcionamento proibido, só retornando seu funcionamento normal na década 1980, com o processo de redemocratização.
Os sindicatos, como entidade política, são um espaço de disputas de interesses materiais e políticos, portanto, atores importantes no cenário econômico e político. Por outro lado, como interatores do lócus do poder, atuam como grupos de pressão e podem formar partidos políticos. Desta forma, os sindicatos não se limitam às lutas por aumentos salariais ou contra as violações trabalhistas, sendo, portanto, protagonista da política. Para Antunes (2002), o sindicato é consequência dos conflitos de classes, a partir do esforço da classe operária contra a dominação do capital e a exploração do proletariado.
Do ponto de vista de organização do Estado, os sindicatos fazem parte da Sociedade Civil Organizada e exercem funções de pressão política para obter seus objetivos. Resumidamente, o Estado se organiza em três segmentos sociais: o primeiro setor, representado o pelo ente Estado e toda sua estrutura (legislativa, executiva-financeira e judiciária) administrativa, cujo objetivo maior é o bem comum; o segundo setor, representado pelas empresas ( subdividida em agronegócio, indústria, comércio e serviços), cujo objetivo maior é o lucro, e o terceiro setor, representado pela sociedade civil organizada, ou seja, ONG, comunidades epistêmicas, sociedades sem fins lucrativos, entidades de classes, sindicatos. É bom lembrar que a sociedade civil organizada não faz parte da organização interna do Estado, sendo juntamente um contraponto entre o Estado, e os interesses classistas, demais entidades organizadas, meio-ambiente e cidadãos.
Compreendida qualquer organização humana como arena de poder, o Interesse é algo precedente em qualquer ação. Sempre, de alguma forma, estamos pensando em adquirir vantagem: a dissuadir alguém de algo, ou buscar algum benefício. Interesse pode ser entendido como algo que traz benefício, vantagem para indivíduos e ou grupos. Aristóteles dizia que o homem é um animal político porque ele tem a logos, a palavra, e transfere isso em interesse, numa dialógica-política.
Os sindicados representam grupos de pessoas que atuam em direção a um objetivo, compartilhando interesse comum. Portanto, para atingir objetivos é preciso traçar planejamento e metas. Para alcançar esses objetivos, conforme pasquino (2010, p. 115), há seis recursos que interferem nas probabilidades de sucesso de uma organização de interesse: número de participantes ou membros inscritos, recursos financeiros disponíveis, representatividade, qualidade e amplitude dos conhecimentos utilizáveis, colocação estratégica no processo produtivo e nas atividades sociais essenciais ao funcionamento do sistema político e facilidade de intervenção.
Mesmo considerando as situações ideais, nem sempre a força sindical é suficiente para atingir os objetivos e, às vezes, é necessário apoio externo. É necessário pressão! Segundo o dicionário Aurélio, pressão é ato ou efeito de pressionar, comprimir, apertar. Na Física, a pressão é uma grandeza quantificada através da razão entre a força e a área da superfície em questão, onde a força é aplicada . Se por um lado temos o interesse através do grupo de interesse, precisamos buscar forças convergentes para que haja pressão a fim de que os interesses sejam alcançados. Esses grupos de pressão atuam, em conjunto com os grupos de interesse, (sindicato) na mobilização, na demonstração, na solicitação e intermediação. Podem ser partidos políticos, ONG, políticos, imprensa, o próprio judiciário, apoio da população, lobistas, comunidades epistêmicas (especialista em área do conhecimento: médico, advogado, peritos, sociólogos, filósofo, pesquisadores) etc.
Aqui, podemos fazer a analogia entre a panela de pressão e o sindicato. A panela de pressão tem nos seus equipamentos o equilíbrio para melhor rapidez no cozimento dos alimentos, de forma que a válvula controla a temperatura ideal para o bom funcionamento. Caso não haja a pressão necessária, não há o cozimento rápido; caso haja pressão demais, a panela pode explodir ou algo pode mudar os objetivos.
Para citar exemplos, no sistema penitenciário do Ceará, nos anos 2000, o sindicado dos agentes penitenciários travou grande luta contra a terceirização, momento em que no Brasil era forte o lobbying de empresários que atuavam para que o sistema penitenciário fosse privatizado. No Ceará teve grande resistência por parte dos servidores, e pressão externa de outros atores da sociedade civil, a exemplo da Pastoral Carcerária e do Conselho Penitenciário do Ceará (COPEN). De maneira articulada, o sindicato fez um planejamento forte, buscou apoio de atores como imprensa, partidos políticos, deputados de oposição, Pastoral Carcerária, Conselho Penitenciário e, com isso, o governo foi dissuadido a parar com a terceirização. Essa decisão possibilitou ganhos para os servidores, seja no crescimento do quadro de pessoal, reforço na estrutura organizacional, ganhos financeiros etc.
Outro exemplo mais recente, também no sistema local, em novembro de 2021, foi a grande mobilização de servidores em frente à Assembleia Legislativa, no qual reuniu quase 1/4 do efetivo. Compreendo o ser humano como ser de necessidade, numa hierarquização biopsicossocial - sejam as demandas biológicas, psicológicas e social - , foi o pano de fundo da pauta. Neste sentido, a mobilização era reivindicação de melhores condições de trabalho, adequação de escala para quem mora no interior, desvelo de tratamento pessoal no espaço laboral, com princípio moral e ético; contrária ao projeto legislativo encaminhado pelo governo para estabelecer um regime disciplinar duro. Com esse engajamento, a categoria conseguiu minorar problemas conjunturais e conseguiu abrandar a legislação.
Assim, para atingir objetivos, os sindicatos precisam planejar ações com metas, com formação política dos trabalhadores, com pressão adequada e sempre focar no objetivo da coletividade.
Filósofo e escritor
Especialista em Ciências Politicas
Membro da Academia Capistrano de Abreu
BIBLIOGRAFIA
ANTUNES, R. As mutações no mundo do trabalho na era da mundialização do capital, Disponível em: https://www.scielo.br/j/es/a/FSqZN7YDckXnYwfqSWqgGPp/?format=pdf&lang=pt. Pesquisado em 24-06-2022
ANTUNES, R. Trabalho, reestruturação produtiva e algumas repercussões no sindicalismo brasileiro. São Paulo: Boitempo, 2002.
ROUSSEAU, Jean Jacques. Do contrato social. 1712-1778. São Paulo. Hunterbook, 2014.
PASQUINO, G. Curso de Ciência Política. 2. ed. Lisboa: Princípia, 2010.