PRIMEIRO EMPREGO
 


É um dos primeiros desafios com o qual nos deparamos na idade adulta. E, hoje em dia, um desafio ainda maior devido ao alto índice de desemprego em nosso país. Na década de 1960 já havia alguma dificuldade mas, certamente, não tão difícil como hoje. Foi por esse tempo que terminei o ensino médio chamado Curso Normal e recebi o diploma de normalista, que me credenciava a lecionar no ensino fundamental, que naquele tempo se chamava curso primário. Não havia concurso para o magistério, os formandos que desejavam lecionar se cadastravam na Inspetoria de Educação de seu município e pleiteavam uma vaga, de preferência na localidade onde residiam ou, o mais perto possível. Foi o que fiz. Encaminhei meus documentos e meu requerimento antes do início do novo ano letivo e fiquei na expectativa. Decorrido um tempo, não muito longo, veio de Florianópolis, da Secretaria de Educação, minha nomeação para a Escola Argeu Furtado, em São Cristóvão do Sul, distrito de Curitibanos, cidade do planalto catarinense onde eu morava.

São Cristóvão, que hoje é também um município, fica a cerca de 25 Km da sede, o que me forçava a pegar um ônibus na rodoviária e viajar por uma estrada de terra até cerca de 1 Km da escola e fazer o restante da distância a pé. Eu não poderia titubear se quisesse de fato trabalhar, de forma que aceitei. Assim, não ficaria mais dependente de meus pais. Eu tinha 19 anos.

Levantava-me às 5:30 da manhã, tomava café e me preparava para sair, enquanto todos em casa ainda dormiam. A Estação Rodoviária ficava a outros 1000 m de casa. Lá, eu comprava a passagem e embarcava no ônibus que ia para Rio do Sul, no Vale do Itajaí, o que passava mais perto do meu destino. Esse coletivo voltava dessa cidade lá pelas 13:00 h e com ele eu retornava.  Não era uma viagem tranquila.. Em dias de chuva a estrada ficava lamacenta e perigosa. Nos dias de sol, o ônibus trepidava, levantando um poeirão.

Professores sabem que a profissão não é fácil. Eu passava a manhã inteira em pé, falando e falando e escrevendo em um quadro negro com giz, fazendo poeira ao usar o apagador. A escola de madeira oferecia pouco conforto, muito fria no rigoroso inverno de Santa Catarina e extremamente quente no verão. Não havia merenda para as crianças e nem para nós, trazíamos algo de casa.

Éramos quatro professoras e todas vínhamos de Curitibanos, Vera Márcia, Elza, Maria Amélia e eu, de segunda até sexta, às vezes aos sábados, quando havia reunião de pais e mestres.

Meu almoço era, invariavelmente, lá pelas 14 h. A sobra do almoço da família que mamãe me deixava para aquecer no fogão a lenha. Não havia forno de micro-ondas.

Difícil era levantar-me tão cedo, antes do nascer do sol, em dias chuvosos ou de geada, mas a vontade de  trabalhar e ganhar meu dinheiro eram minhas motivações. Não via as dificuldades como provação, mas como experiência para a vida. Entretanto, após um ano, consegui transferência para Curitibanos, para o mesmo Grupo Escolar Arcipreste Paiva, localizado a uma quadra de casa, onde estudei. Ufaa! Valeu o sacrifício!

Entretanto, eu era jovem, inquieta e almejava estudar mais e conseguir um salário melhor. Como professora, meus rendimentos eram de exatos CR$100,00, que me permitiam comprar roupas calçados e outros objetos pessoais, eventualmente pagar o dentista e pouca coisa mais. Não era um valor desprezível naquele anos da Ditadura Militar e eu, solteira, morava com a família, não tendo despesas com moradia e alimentação.

Ao final dessa década, meus irmãos menores haviam crescido e também sonhavam em frequentar uma universidade. Foi, então, que nossos pais tomaram uma decisão acertada, que mudaria nossas vidas. Não desapontamos. Cursamos boas universidades e subimos na escala social, nos tornando profissionais respeitados e bem remunerados. Nada foi fácil, tudo conseguido com grande esforço e dedicação. Os primeiros tempos em Curitiba foram duros, havia falta de dinheiro em casa, só comprávamos o básico e o necessário. Aqui não trabalhávamos e papai e mamãe sustentavam a família de seis pessoas com suas parcas aposentadorias.

Hoje eu digo: Valeu muito a pena! Uma boa educação tem o poder de nos projetar, de nos abrir portas e desvendar novos horizontes. Sou imensamente grata a Deus e aos meus pais que me permitiram voar mais alto e, também, à obstinação, que me acompanha desde criança. Fui leitora voraz e estudante aplicada. Sacrifiquei muitas idas ao cinema ou à balada mas nunca deixei de estudar para uma prova...

Aloysia
Enviado por Aloysia em 06/09/2021
Reeditado em 13/02/2023
Código do texto: T7336637
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