Textos Pedagógicos 1 - Vamos falar de respeito as religiões!
A intolerância religiosa se caracteriza pela incapacidade, dificuldade ou pouca vontade de respeitar a religião de um indivíduo. Já o crime de intolerância, por sua vez, diz respeito a discriminação ou preconceito sobre uma religião.
Colocando essa explicação em um raso paragrafo de 3 linhas temos a impressão de um problema simples e conciso, onde dá abertura para a ideia de uma resolução igualmente simples e sem aprofundamento. Não basta levantar as bandeiras positivas da empatia nas escolas e dizer “vamos falar de respeito as religiões!”. Temos que pensar além da bolha da pseudo-praticidade que nos é vendida e ter em mente as relações de poder, história e contexto em que estamos inseridos.
“Ora, mas que besteira! Intolerância é a mesma em qualquer lugar!”
Não, meu amigo, intolerância é diversa em cada canto do mundo e tudo é questão de perspectiva. Como exemplo, podemos citar diversos países que repudiam a fé cristã até nos dias de hoje, como por exemplo a Coréia do Norte e o Afeganistão. Mas no Brasil, por sua vez, temos o Cristianismo quase que como base histórica de nossa sociedade – visto que até mesmo algumas de nossas principais leis vieram da moral cristã. Poderíamos pensar que um grupo perseguido lidaria de forma branda com outras religiões quando em posição de maioria, mas essa relação também não se faz assim tão simples.
Quando trazemos toda essa situação para analisar a história do nosso Brasil, país colonizado por europeus e em sua maioria com uma base Católica/Cristã, vemos que a posição de poder agora passa ao grupo que em outras situações é oprimido e, assim como com as leis, influencia outras formas de enxergar o mundo.
No Brasil, em maioria, são os devotos de religiões de matriz africana que sofrem pela intolerância historicamente desenvolvida ao longo de muitos anos de escravidão. Vemos que a rejeição dos Orixás por parte dos Católicos da época e a perseguição da fé Yorubá deixa traços de sua passada até hoje em nossa sociedade, mesmo naqueles que não professam nenhuma fé.
Frases como: “essa pessoa está com Exu”; “chuta que é macumba”; cuidado, ela é macumbeira!”; “mas você é de linha branca”, ainda são comuns no contexto em que vivemos.
Enquanto fora do território nacional temos em alguns países uma perseguição da fé Cristã, com pessoas sendo mortas e templos sendo derrubados ao redor do mundo, temos no Brasil a repetição desse mecanismo, agora com outro alvo.
A nível nacional, podemos dizer que essas mazelas do passado vêm atreladas não só ao conceito de intolerância por “intolerar”, mas também com um racismo velado ao qual nossa sociedade foi moldada, visto que tudo que vinha do negro era tratado de forma demonizada pelos colonizadores.
Pois bem, tendo essas relações estabelecidas, essa história dita brevemente e esse contexto atual levantado, eu lhe faço a pergunta: é válido restringirmos nosso debate à cerca da intolerância religiosa apenas a respeitar as religiões?
Digo que não, caro leitor. Temos sim que ter em mente o respeito e a empatia pela fé do outro, mas para atingirmos o grau de tolerância plena, temos que demonstrar onde estão nossos gatilhos sociais, nossas relações de poder, nossas marcas na história para entender de onde surgiu esse preconceito e essa discriminação que nosso povo carrega até hoje, para aí sim falarmos de respeito entendendo o chão onde pisamos. Vendo dessa forma, pode-se dizer que em cada local se trabalharia a tolerância de maneiras diferentes, como na relação Coréia do Norte e Cristianismo já citada acima, onde o debate seria outro por envolver um contexto completamente diferente do que se passa no Brasil.
Por fim, digo que é papel do educador desvelar e desnudar o véu do preconceito que envolve a nossa sociedade e, em nosso caso, enquanto palavras como Candomblé, Terreiro, Exu, Pombagira e Iemanjá ainda forem alvo de medo, repudio ou demonização, teremos trabalho a fazer.
Saravá e muito Axé.
[Os escritos que compõe a série "Textos Pedagógicos" provem de debates e reflexões em aula. Foram feitos por mim, Renan, estudante de pedagogia. São textos que traduzem minha ideia de Educação.]