Desta janela
Que vejo eu para lá da minha janela…
Vejo o barulho silencioso de quem não anda na rua; vejo o sol a pôr-se sem se despedir de ninguém e vejo a lua que não tem a quem dar as boas noites.
Daqui o meu olhar alcança o infinito de incertezas e a constante loucura do medo. De quando em vez passa um ou outro ser, que a passo acelerado tenta chegar onde o inimigo não lhe possa tocar. Vejo olhos arregalados de pânico olhando para todas as direcções como quem lança chamas anti qualquer coisa.
Deste rectângulo de vidro, observo o sossego imposto pelos números, pela curva que tendem a não curvar e pelos apelos que se insistem em não se ouvir.
Daqui quando avisto um passarinho é sinónimo de vida, de algo que mexe…
A minha janela enche-me de reticencias e de interrogações. Sinto que temos a vida suspensa e que há mais pequena desatenção … estatelamo-nos em cheio no abismo! E pergunto-me que abismo é esse? Não será o mesmo que sempre tivemos aos nossos pés e que estávamos de igual modo prontinhos e cair? Claro que é o mesmo! Só há um abismo: aquele que cada um cria para si próprio, seja motivado por pandemias ou pela vida pandémica em que se deixa envolver.
Não vejo daqui que os laços estejam mais fortalecidos ou que as pessoas estejam mais humanizadas. Vejo apenas que quem se aproxima mais daqueles que outrora se encontrava distante é porque agora consciencializou-se de que precisa de se sentir protegida, necessita de se sentir amada, carece de ter a certeza que existe. Ninguém muda só porque a pandemia chegou. É-se bondoso e preocupado com o próximo ou não se é, simplesmente. E o próximo por vezes é quem temos debaixo do mesmo tecto e nem sequer reparamos nele.
O que vejo para lá dos meus olhos, são ruas pintadas de vazio e cidades preenchidas de nada. São países fechados numa bolha quase sem oxigénio e um Mundo quase a explodir para se renascer!