Lembrei-me
Lembrei-me dos tempos que se foram.
Dos tempos em que a capulana falava o dialecto,
Dos tempos em que a inteligência estava com o esperto,
Dos tempos em que a enfermidade temia o sem teto.
Lembrei-me ainda da Cabra-cega,
Da cintura que movia como as ondas na xibotela,
Das noites de fogueira com a minha avó,
Do xirico que me via dançar sem dó.
Lembrei-me das palmadas do meu professor,
Que hoje me transformara em doutor.
Lembrei-me da mangueira, minha sala!
Lembrei-me ainda do saco, minha carteira!
Lembrei-me do milho torado ao amanhecer,
Do quotidiano, da mandioca e da batata-doce.
Lembrei-me do comboio que se movia nos nossos passos,
Da alegria contagiante do nosso contacto.
Lembrei-me, lembrei-me do som de Utsé que as mamanas contagiavam,
Do ritmo sincronizado das palmas e da alegria dos pés.
Lembrei-me sim da minha aldeia,
Onde o doce e o amargo nos rodeiam.