Contra o relativismo das artes

Música

A essência da arte é a beleza, primeiramente porque o belo nos provoca encantamento e bem estar. Eu disse essência e, não, totalidade. A beleza também é mais difícil de ser alcançada, porque exige disciplina e talento, afinal, é mais fácil rabiscar do que desenhar. A arte é a representação da natureza e da condição humana, ambas dotadas de lógica/coerência e também de simetria. O nosso idealismo, que é o desejo pela transcendência, é o que alimenta a arte.

Diferentes tipos de música evocam diferentes estados mentais. ''Time'' de Alan Parsons, por exemplo, nos remete ao tempo de existência. Já, aquela música de funk, que fala literalmente de penetração anal, dispensa maiores explicações. Evidente que existem critérios mais particulares mas, também, universais, de qualidade. Por essa comparação, não viso rebaixar o funk carioca se, para dançar e extravasar sensualidade, ele é muito mais útil. Mas, uma música com letra poética ou uma melodia bem elaborada, não são equiparáveis...

Tudo é uma questão de critério e de saber comparar. Se, com dois gêneros diferentes, a priori, é o mesmo que com maçãs e peras. Ainda válido (são "frutas"), por não ser uma comparação absoluta, mas, ter sempre em mente que são gêneros musicais que cumprem com critérios distintos. A singularidade de uma obra artística, especialmente se, a partir de grande talento, é outra perspectiva a ser sempre considerada. Está claro que, para analisar algo tão complexo ou diverso como as artes, há de se buscar fazê-lo pelas múltiplas perspectivas. Aliás, este método superior de raciocínio é sempre mais recomendável do que a limitação intrínseca do pensamento binário.

Quem relativiza as artes, a toma por suas bases que é a auto-expressão. Mas, sua qualidade ou potencial de desenvolvimento também é muito importante. Em linhas gerais, o que é trabalhoso, belo e original, é o que vale mais. Uma questão de mérito, do valor intrínseco da obra. Já, em linhas relativas, também analisa-se o nível de correspondência ou alcance ao critério para o qual a obra foi pensada e o próprio critério.

Quem relativiza as artes a reduz à sua expressão mais simples e, portanto, o seu valor. Como resultado, a arte deixa de ser valorizada por sua qualidade e passa a ser democrática ou mesmo ideologicamente, quando é dominada por grupos com interesse de poder e de seu uso autoritário. Ainda que exista espaço para o democrático, a capela Sistina não foi produzida com base na opinião de uma maioria e, sim, a partir do gênio e do bom gosto individuais. Todas as grandes obras de gênio artístico não são meramente para a comercialização, mas, especialmente, por sua apreciação, para a elevação da consciência humana. A arte comercial ou popular, dominante na atualidade, tem o lado positivo de diversificar a expressão artística em muitos gêneros, ao invés de obedecer exclusivamente à uma autoridade ideológica [ou estilo], mas também pode se tornar submissa ao gosto do freguês. Outro problema é a relativização do ofício, desvalorizando o próprio "profissional", onde que, qualquer um pode achar que tem vocação pra ser artista, sem falar nos falsos artistas que a usam como trampolim para a fama e que são justamente dos que mais se beneficiam do seu rebaixamento em prol do lucro, porque o bom gosto não costuma ser uma qualidade muito presente entre as ditas "massas".