História e seus rastros, pequenas migalhas de memória
Na década de 1970 meus cadernos escolares tinham na capa a imagem de um general, cresci com essa imagem, foi sempre assim, oriunda da zona leste de São Paulo, aluna da escola pública.
A primeira vez que tive um caderno com capa desmilitarizada já estava na década de 1980, nós, crianças daquela época, na grande maioria não entendíamos muito bem o que acontecia, informação era velada e, principalmente crianças, precisavam ficar de fora, serem poupadas.
Algumas vezes acordei com movimento em casa, pessoas, panfletos e latas de tinta encima do fogão, onde cozinhavam uma goma, era madrugada, nada compreendia, voltava a dormir e quando amanhecia, a casa estava tão normal quanto no dia anterior, sem aquela madrugada ao meio, que na cabeça de uma criança era como se não passasse de um sonho estranho.
Crescemos, acompanhamos a anistia, na escola não se discutia muito bem o ocorrido, era uma época de muitas feridas abertas, inflamadas e sangrando, o termo “censura” ainda era comum, pais temiam por seus filhos, filhos quando compreendiam a situação, temiam por seus pais.
Acompanhei discussões inflamadas entre meu irmão mais velho e meus pais, era a juventude querendo mudança urgente, em contra ponto aos mais velhos que perderam muitos durante a pior fase de suas vidas, e defender o silêncio, esconder sua verdadeira opinião, era em muitas vezes, a melhor defesa para manter uma família protegida.
A necessidade de liberdade de fato, e garantia de direitos era e sempre será uma luta de todas, de todos, mesmo que não tenham vivido nessa difícil fase, que tenham nascido quando as capas de cadernos traziam sorrisos e um colorido a provocar a sensação de que a juventude é capaz de transformar o mundo, e hoje memórias foram reativadas, Deus tenha piedade de todos nós.
Salvador, 31/03/2020
Na década de 1970 meus cadernos escolares tinham na capa a imagem de um general, cresci com essa imagem, foi sempre assim, oriunda da zona leste de São Paulo, aluna da escola pública.
A primeira vez que tive um caderno com capa desmilitarizada já estava na década de 1980, nós, crianças daquela época, na grande maioria não entendíamos muito bem o que acontecia, informação era velada e, principalmente crianças, precisavam ficar de fora, serem poupadas.
Algumas vezes acordei com movimento em casa, pessoas, panfletos e latas de tinta encima do fogão, onde cozinhavam uma goma, era madrugada, nada compreendia, voltava a dormir e quando amanhecia, a casa estava tão normal quanto no dia anterior, sem aquela madrugada ao meio, que na cabeça de uma criança era como se não passasse de um sonho estranho.
Crescemos, acompanhamos a anistia, na escola não se discutia muito bem o ocorrido, era uma época de muitas feridas abertas, inflamadas e sangrando, o termo “censura” ainda era comum, pais temiam por seus filhos, filhos quando compreendiam a situação, temiam por seus pais.
Acompanhei discussões inflamadas entre meu irmão mais velho e meus pais, era a juventude querendo mudança urgente, em contra ponto aos mais velhos que perderam muitos durante a pior fase de suas vidas, e defender o silêncio, esconder sua verdadeira opinião, era em muitas vezes, a melhor defesa para manter uma família protegida.
A necessidade de liberdade de fato, e garantia de direitos era e sempre será uma luta de todas, de todos, mesmo que não tenham vivido nessa difícil fase, que tenham nascido quando as capas de cadernos traziam sorrisos e um colorido a provocar a sensação de que a juventude é capaz de transformar o mundo, e hoje memórias foram reativadas, Deus tenha piedade de todos nós.
Salvador, 31/03/2020
nota sobre imagem: Manifestação na Cinelândia, no Rio, em 1º abril de 1964 (Foto: CPDoc JB)...