Poesia em tempo presente: Quatro horas da tarde

Murilo Mendes

Não vejo ninguém vivo nesta cidade enorme

Daqui a cincoenta anos estarão todos no cemitério.

Vejo somente a água, a pedra fixa

Que me transportam ao princípio do tempo.

Quem são estes fantasmas que se movem nas ruas

Agitando bandeiras, levantando os braços, tocando (tambores ?

Quem são estes velhos que andam de velocípede ,

Quem são estes bebês empunhando machados ?

Procuro a amiga tão bela e necessária,

Se não está comigo, em mim, é porque não existe.

Ó minha amiga, surge em corpo, senão acreditarei

Que também eu próprio não existo.

De quem é este manto púrpura que arrastam no chão ?

Não é para mim , talvez para um operário.

Cubramos com ele o sexo de Madalena

Que me espera num porão da Idade Média.

Um manequim assassina um homem por amor

Sete pianos ululam na extensão do asfalto.

Um arcanjo sólido descerra o Vale do Josafá

Apresentando- me a última mulher que existirá no mundo.)

Saskia Bitencourt
Enviado por Saskia Bitencourt em 11/05/2019
Reeditado em 11/05/2019
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