Poesia em tempo presente: Quatro horas da tarde
Murilo Mendes
Não vejo ninguém vivo nesta cidade enorme
Daqui a cincoenta anos estarão todos no cemitério.
Vejo somente a água, a pedra fixa
Que me transportam ao princípio do tempo.
Quem são estes fantasmas que se movem nas ruas
Agitando bandeiras, levantando os braços, tocando (tambores ?
Quem são estes velhos que andam de velocípede ,
Quem são estes bebês empunhando machados ?
Procuro a amiga tão bela e necessária,
Se não está comigo, em mim, é porque não existe.
Ó minha amiga, surge em corpo, senão acreditarei
Que também eu próprio não existo.
De quem é este manto púrpura que arrastam no chão ?
Não é para mim , talvez para um operário.
Cubramos com ele o sexo de Madalena
Que me espera num porão da Idade Média.
Um manequim assassina um homem por amor
Sete pianos ululam na extensão do asfalto.
Um arcanjo sólido descerra o Vale do Josafá
Apresentando- me a última mulher que existirá no mundo.)