União poliafetiva, com as bênçãos do tabelião
“O país real, esse é bom, revela os melhores instintos; mas o país oficial, esse é caricato e burlesco” – Machado de Assis
O Conselho Nacional de Justiça disse "não!" à Associação de Direito de Famílias e das Sucessões - ADFAS no pedido de providências nº 1459/08 de 2016, o qual reclamava o direito de as "uniões Poliafetivas" com termo lavrado em cartório serem consideradas união estável e reconhecidas como família perante a lei.
A decisão negando provimento ao requerimento foi apertada com votos divergentes de alguns conselheiros, vigorando, por fim, o argumento de que a sociedade brasileira ainda não está amadurecida para reconhecer o "amor plúrimo".
Com esta decisão, por ora, os cartórios no Brasil não poderão lavrar o termo de união estável, que equipara a união ao casamento civil, e aqueles que já foram lavrados serão recebidos pelo direito apenas como declaração de vontade das partes e não terão o valor legal pretendido.
Todavia, a bandeira do relacionamento coletivo ganhou força a partir da decisão do STF em 2011, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 42772 que reconheceu a união homoafetiva, fazendo uma releitura, bastante peculiar do art. 226, §3º, da Constituição Federal.
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher (OU NÃO!) como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. "acrescentei e negritei".
A Constituição Federal tem sido interpretada no sentido de recepcionar a diversidade de arranjos sociais como constituição familiar, sem hierarquizá-las, contudo, a família representa um fenômeno social, cultural, antropológico e jurídico que reflete a sociedade de seu tempo e lugar.
A relação “poliamorosa” configura-se pelo relacionamento múltiplo e simultâneo de três ou mais pessoas e é tema praticamente ausente da vida social, pouco debatido na comunidade jurídica e com dificuldades de definição clara em razão do grande número de experiências possíveis para os relacionamentos.
Embora nesse momento o CNJ tenha acertado o cravo, de certa forma deixou o recado que, mais dia menos dia, acertará a ferradura!
Não há nenhuma lei no Brasil que impeça que as pessoas vivam suas organizações sociais, sobretudo, as amorosas, da forma que bem entenderem, ressalvando os impedimentos legais, e nem estou falando em bigamia, mas meu foco aqui é de resistência ao crime de pedofilia e abusos outros contra a dignidade e a vontade humana.
Entretanto, família é conceito estrutural da sociedade, e que nos faz e forma o ethos social no qual conjugamos o ser individual em aquiescência ao ser coletivo.
Ao pensar na família, a Constituição refere a célula mater de toda uma sociedade que deixará de existir se esse conceito primordial distanciar-se da sua essência, nela inserida o elemento substancial de geração, formação, desenvolvimento e amadurecimento dos filhos, produto da família.
Intrigante é constatar que o Brasil continua caricato e burlesco, até mesmo quando tenta ser vanguardista.