O EU EM MIM

Uma das mais frequentes perguntas que fizemos na vida é o que queremos ser quando crescer. Desde criança os adultos nos questionam sobre o nosso futuro o que nos remete a uma reflexão forçada e inconsciente sobre algo tão incerto. Já quis ser tanta coisa e na maioria delas me remetia a posições privilegiadas e importantes na sociedade, mas o que realmente eu queria ser eu não fui.

Me lembro quando ainda criança das brincadeiras de policial, onde eu sempre era o Xerife, me lembro das brincadeiras de médico, em que eu sempre era o doutor, das brincadeiras de escola, onde eu sempre era o professor, de outras brincadeiras de profissões, onde eu sempre trabalhava com grandes volumes de papéis ou grandes volumes de dinheiro. Em todas as brincadeiras eu sempre representava um homem de muito prestígio e sucesso.

O tempo ia passando e a frequente pergunta voltava a tona: o que você vai ser quando crescer. Mas eu já estava crescendo, era preciso me preparar para o futuro, mas um futuro promissor. Um futuro em que os adultos diziam que era promissor, mas sempre por envolver status e dinheiro. Acredito que isso não foi diferente com as outras pessoas a tenho certeza que ainda não o é com nossos filhos e filhos de nossos amigos e conhecidos.

Numa de minhas respostas a essa questão tão perguntada respondi que eu gostaria de ser professor. Bom para poucas pessoas a profissão era sublime e muito bonita, mas para a maioria era uma profissão que não me traria sucesso, pois o salário de um professor não era tão alto assim.

Então desisti de ser professor e procurei cursos que me falavam que trariam muito dinheiro e uma boa vida econômica. Ah! Quem não gostaria de ter uma vida confortável? Claro que em minha pouca idade eu preferiria as opiniões que me remetesse a isso. Minha mãe me disse que eu deveria ser torneiro mecânico, pois ganhava-se muito dinheiro com isso naquela década de 70 a 90. Ok, se mamãe diz, vou atrás dessa grana.

Inscrevi-me numa seletiva para tal curso no SENAC, pois na época era uma escola gratuita, com conceito elevadissimo e de lá na maioria dos casos os alunos já sairam empregados, melhor do que isso, algumas empresas pagavam os alunos para estudarem la e depois de formado efetivavam na empresa. Passei na prova, fui chamado, matriculei-me e comecei a estudar. Quando comecei a estudar nesta escola, juntamente com outros meninos que passaram também na seleção, tivemos a possibilidade de passar por quatro sondagens pela qual poderíamos, ao final, escolher o curso que gostamos mais. Para meu espanto, não gostei nenhum pouco da tornearia. Me estranhava a idéia de estar com a mão sempre suja de graxa. Foi então que escolhi o curso de modelação onde eu iria trabalhar com madeira, fazendo modelos para moldes de fundição. Foi legal, mas o contrário do que pensava minha mãe, não obtive nenhum sucesso, tirei as piores notas, não gostava do que estava fazendo e ainda nunca fui chamado ou pago por qualquer empresa, no entanto, me formei e preguei meu diploma na parede que perdura até hoje, mas nunca o usei.

Sempre quis trabalhar com algo onde minhas mãos e roupas pudessem estar sempre limpas e algo que fosse meu intelecto pudesse ser mais explorado do que minhas poucas habilidades manuais. Foi então que resolvi por mim mesmo escolher o curso de Direito. Inscrevi-me no vestibular e mais uma vez passei no certame. Lá fui eu estudar para a profissão que todos falavam que era promissora, de prestígio e muito rentosa.

Pois bem, me formei, comecei a trabalhar como Advogado e fui um profissional de muito sucesso. Ganhei meu dinheiro, sempre com muito zelo e esforço, fiz minhas economias e comprei minha empresa. E o melhor do que tudo: as pessoas passaram a me elogiar pelo meu prestígio e crescimento econômico.

Não demorou muito tempo para que uma auto reflexão me invadisse a alma e me pusesse a repensar sobre meu conceito de sucesso e prestígio. Foi então que me voltou à mente a grande vontade de ser professor, mas que havia ficado para tráz. Era um antigo sonho que poucos sabiam e que eu mesmo deixei ibernado por tanto tempo, pois estava ocupadíssimo em ganhar dinheiro e ser o que os outros queriam que eu fosse.

O despetar do monstro aconteceu e novamente sentei numa cadeira de um curso de graduação para realizar esse sonho escondido e aquietado por longo tempo de minha vida.

Não que fui infeliz durante toda essa jornada, mas acredito que poderia ter sido muito mais se tivesse seguido meu coração à razão, pois hoje, sentado na cadeira do Curso de Letras, já me sindo outra pessoa. Sinto na alma uma paz e uma satisfação tão grande que nenhum dinheiro que tenha ganhado nessa vida é capaz de representar.

Novamente as pessoas me perguntam o porquê de eu voltar a um banco de sala de aula, quando poderia estar aproveitando melhor a vida, com viagens e outras curtições. Minha resposta é clara e simples, mas para muitos é de difícil entendimento: se puderes fazer algo que te de prazer e satisfação pessoal ganhando muito dinheiro, melhor, mas se não der muito dinheiro, mas te der prazer todos os dias, faça-o mesmo assim e serás muito feliz, mas não faça o que não gosta. Não o faça só pelo montante expressivo que irá ganhar, pois dinheiro pode ajudar, mas não traz felicidades e o que importa nesta vida é o que somos e não o que temos, pois o que temos ficará para o mundo e o que somos será eternamente nosso.

Lembre-se que nossa passagem por esse mundo é muito rápida e que se não fizermos aquilo que realmente queremos fazer, pode ser que não tenhamos uma segunda oportunidade e levaremos conosco o vazio de não ter sido nós mesmos.

Paulo Roberto Fernandes
Enviado por Paulo Roberto Fernandes em 16/03/2018
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