OLHOS



É como chegar do céu, do infinito, e ver no topo da montanha as flores, as mais diferentes ou pelo menos incomuns, ver as árvores, o gramado que parece queimado pelo frio, os espaços vazios que lembram desertos, também o duro e áspero solo de pedras. O brilho e o calor dos raios solares ali são mais intensos. As nuvens do tipo cumulus, muitas vezes envolvem a topo da montanha como num abraço.
Pela dificuldade de chegar ao topo, tudo por lá está intacto, intocado, e isto provoca a imaginação e conduz os pensamentos e os sentimentos a conhecer e respeitar limites.
A visão de cima e em pequena altitude transmite segurança àquele vôo. O porte daquela ave de rapina, sua beleza, sua elegância, sua destreza nas manobras mesmo com tamanha envergadura parecem esconder a total falta de sentimentos que os seus olhos demonstram. Seu olhar intenso é quase paralisante.
A grande altitude do vôo é sentida quando se chega à borda da montanha e tem se a sensação de despencar num abismo profundo, que em seu final tem uma massa compacta de verde escuro com pouquíssimas nuance de tons verdes, é a floresta assustadora.
O ar rarefeito, as correntes de ar conduzem o vôo planado, para cá, para lá. Não há mesmo um destino traçado. A solidão tamanha naquelas alturas encoraja a ave a cantar para ela mesma. De suas entranhas ecoa um som estridente, agudo, desagradável e angustiante, mais um grito que um canto, um longo assobio. Seu olhar penetrante transmite muito mais que seu canto. Nos seus olhos parece estar retida quadro a quadro toda a paisagem por onde voou, e numa perspectiva horizontal que coloca o foco da visão sempre no topo vê se os rios, pequenos e grandes que descem das montanhas, os mares com suas imensidões, suas praias, as montanhas maiores ou menores com ou sem vegetação, os abismos de profundidades assustadoras, os horizontes ao amanhecer e ao anoitecer, as cidades, os grandiosos monumentos, os feitos (intencionais, involuntários ou ocasionais) de criação do animal humano.
Toda essa maravilha só é interrompida quando da busca pelo alimento, que é o maior regulador de limites de cada ser. E também quando chega o chamado do amor. Buscar e encontrar uma companhia é o primeiro passo, conquistar é o segundo e o mais difícil, pois vivendo em constante solidão a associação repentina pode ser um processo longo que irá demandar muitos vôos conjugados, olhares trocados por longo tempo e conter-se para não cantar ou assobiar. Construir o ninho no alto de uma enorme árvore na montanha e em lugar bem seguro, com uma vista deslumbrante onde possam fazer juras de amor no crepúsculo de suas solidões.
Por seu olhar penetrante que parece ir buscar no âmago e trazer a tona a índole dos seres, as aves de rapina foram caçadas e mortas sem piedade em tempos idos, eram tidas como representação de mau agouro, causavam medo com seu assobio e as aparentavam aos vampiros.
Os olhos, tão importantes para ver e conhecer, também deixam ver e conhecer.




                                                                       Autor                  Paulo Cezar Rozeto
Que apesar de ter partido, continua vivo em nossos corações.