O grito do grilo
Sento-me à mesa. Pretendo escrever. É noite alta, limpa, de estrelas. Céu aberto. Sopra um ventinho fresco lá fora, no terraço.
Cricri... Levanto-me. Há um grilo na área. E seu grito.
Cricri... Ora bolas! É demais. Vou dar um jeito nisto. Que grilo chato.
Silêncio...Silêncio total. Sumiu! Os meus passos são apenas o que ouço.
Cricri... Cricri...Cricri...
Ah! Agora você não me escapa! Pensei.
Cricri... Cricri...
Avisto um pontinho naquele canto e zás, dou uma pisadela firme.
Nada feito. O grilo saltou... e sumiu! Procuro sem muito interesse e desisto. Concluo que não vale a pena...Ele foi embora. Volto aos meus afazeres, bem mais nobre que matar...
Sento-me à mesa... Pretendo escrever...
Cricri...Cricri... Cricri...
Oh! Não. Como me concentrar? É irritante. Vou esquecê-lo. Decido que não quero mais ouvi-lo. Não o ouço mais, seu grilo. Eu não estou mais aqui...
Cricri...Cricri... Cricri...
Cricri...Cricri... Cricri...
!... !... !...
... Silêncio! Silêncio profundo, total, de novo. Morta! Silêncio aterrador, medonho. Um silvo de silêncio vai até as profundezas do meu ser e, confesso, me sinto só.
Tudo dorme...Todos dormem...A vida dorme... É noite alta.
Silêncio! Onde estará o grilo e seu cricri?
Aquele silêncio importunou-me e me importo em averiguar o que houve. Espero e torço para que ele apareça...
Levanto-me. Vou ao lugar onde antes estivera e nada vejo. Procuro... Quero vê-lo e ouvi-lo; sinto necessidade do seu chilrear. Onde estará este ortóptero? Certamente está me acompanhando os movimentos...
Mas o que encontro é um sapo!
Compreendi o silêncio e revoltei-me com o desditoso batráquio. Fi-lo fugir dali desesperado.
Voltei à mesa e senti pelo desafortunado saltatório...