Viver com Trauma
A dor física no momento do impacto não é tão tensa como após o acidente.A parte lesada não circula bem o sangue e a dor é mais forte. É quando e como sabemos avaliar. A dor passa e a cicatriz fica, permanece para dizer que alí passou o acidente e o trauma continua em sequelas para o gesto da vida. O corpo marcado por traumas físico e psicológico segue, só o próprio acidentado poderá superar todos obstáculos, exigindo-o muita determinação aceitando novas regras para viver com as suas limitações. É quando está preparado para trilhar uma nova vida.
A criatividade será seu fator fundamental, pois o indivíduo terá de criar conceitos e a vontade de reverter uma nova identidade no mundo tão exigente e preconceituoso.
A mente estava acostumada a fazer as mesmas coisas, passa a aceitar novos desafios comportamentais, exercita outro lado adormecido no cérebro. É o efeito da modificação espontânea do corpo, forçado pela nova situação para a mente evoluir. Por exemplo: se um dos membros
superiores ou inferiores perder os movimentos, o outro lado não afetado
terá de suprir esta dificuldade com as mesmas perfeições, ou talvez melhor. Há casos em traumas de acidente irreparáveis. No entanto, mesmo nesta situação não se deve perder a esperança de voltar a ser útil a sociedade. Para essa faixa de deficientes, o convívio com a sociedade é de modo geral, um grande benefício. É quando a família dará mais estímulo ao "doente" retorna as atividades de vida diária. O acompanhamento psicológico é de suma importância para o equilíbrio emocional do dependente. Para poder aceitar uma nova condição, frente
a convivência com pessoas sem deficiência, e deste modo, enfrentar melhor as comparações capacitivas que poderão ser feitas. É neste momento que nasce o desejo de viver em comunidade.
Há uma grande diferença entre aquele que nasce com deficiência e o que adquire em acidente. O primeiro é criança, só vai ter consciência e noção exata do seu estado, após um ano de idade ou até mais tarde.
Perceber esta deficiência, nascida com o indivíduo (congênita) ou consequente de um erro médico (iatrogênica), após o nascimento, caberá aos pais ou profissional de saúde esclarecer. Esta faixa, os pais não tem coragem de dizer a verdade, orientam no sentido individual e as mudanças vão ocorrer quando tiver a necessidade de viver independente. O deficiente adquirido em acidente é mais difícil de ser reabilitado. A principio ele não se conforma com a sua situação, sente-se
abandonado por todos, teme o relacionamento, rejeita a convivência, isola-se como caracol. Passa a viver com o seu sofrer, imagina-se desprezado por Deus. Requer um novo aprendizado profissional e muita
assistência da psicologia. Para muda esse quadro é necessário ver outros deficiente em situações piores ou igual a sua. Daí, então, o deficiente fará esforço incomum para reverter o quadro. Tudo depende exclusivamente dele querer voltar a viver em coletividade. A necessidade obriga a tomar certas atitudes para melhor ou pior. Nesta hora o poder da mente é contestatória.
Para melhor exemplo, cito o meu caso: Tive fraturas múltiplas no braço e mão direita. Perda de substância óssea e cutânea em mais de 2/3 no
antebraço e mão direta. Passei por 8 cirurgias no local e tive que fazer enxertia cutânea na região afetada. Vejamos o que diz o Relatório Médico: "Esmagamento do 1/3 distal do antebraço direito com fraturas
cominutivas expostas do rádio e cúbito, ossos do carpo e metacarpo, lesão dos aparelhos tendinosos flexor e extensor e do sistema vásculo nervoso dos dedos, com perda de substância cutânea e óssea. Ferida lácero contusa ao nível de 2/3 superior do antebraço direito com perda
de substância cutânea e muscular. Abrasão de todo o antebraço direito.
Ferida abrasivas de face, braço e ombro direito".
Passei por longo período de tratamento fisioterápico com exercícios, choques elétricos e banho de parafina quente, etc. Em casa, treinava uma nova ortografia com a mão esquerda, uma nova assinatura. Foi um curto tempo com novos aprendizados.
Consequência de acidente no veículo da Empresa em que eu trabalhava, caracterizado como Acidente de Trabalho, estava como passageiro. Quando tive alta médica não retornei para a mesma função, havia outro no meu lugar. Deram-me outra função incompatível com a minha capacidade laborativa. Era jovem com os meus 22 anos, sem formação acadêmica. Não aguentei a humilhação, saí da Empresa. Não foi por falta de capacidade, mas sim, por puro preconceito da direção da Empresa para com os deficientes. Na época não existia a obrigatoriedade de aceitar um deficiente nas Empresas, mesmo com todos os argumentos do antigo INSS. Os excessos e esforços do novo serviço obrigaram-me a pedir demissão. Era isso que eles queriam.
Fiquei desempregado, "sem eira e sem beira". Minha sorte é que eu era
solteiro e tive apoio dos familiares. O meu esforço e vontade de vencer superaram a desilusão. Toquei a vida.
Fazendo analogia a um grande nome que viveu no séc.XIX - "Joaquim Augusto Ribeiro de Sousa, brasileiro, nasceu em 1825 e morreu em 1873. Artista dramático. Foi o primeiro ator nacional a interpretar dramas da escola realista, introduzindo-a nos palcos brasileiro. Foi o segundo abaixo de João Caetano em popularidade, pelo alto poder de interpretação. Atingiu o apogeu nos palcos a partir de 1851. Teve um grande mérito, conseguiu superar nos palcos suas deficiências físicas, era cego, manco e surdo. Morreu como nasceu: pobre e esquecido".
(Dicionário Histórico da Língua Portuguesa).
A vida de Joaquim Augusto Ribeiro de Sousa foi um exemplo de demonstração de força de vontade e determinação em seus ideais. Ele mostrou ao público da época, muito exigente, e principalmente a si mesmo, a necessidade de superação em manifestação pessoal das suas deficiências. Escolheu a profissão mais difícil de ser executada, a Arte Cênica. Foi louvado como ator. Mas, o mérito maior foi realizar-se como deficiente ; fazer o que muitos normais não fazem por falta de coragem e por não terem Dom para executar as interpretações ao vivo. Ainda mais com tripla deficiência, obtendo o respeito e a admiração do público.
Os aplausos recebidos não foram por piedade, mas sim, clamor de entusiasmo a vida.
Isso mostra o quanto o ser humano é capaz de superar qualquer trauma
e aprender a valorizar a vida mesmo com deficiência irreparável. Para a nobre Medicina, a excelsa ciência " a vida deve ser conquistada até os seus últimos minutos".
A contribuição humanitária para com os deficientes é fundamental e muito valiosa. Torna-se auxiliar social em devolver, incentivar no processo da recuperação e reinserção, criando situações renovadoras ao dar esperança para aqueles que já não tem. Estender a mão é gesto filantrópico que todos devem fazer. Há os deficientes mentais,visão, audição e fonética. Para esses, o quadro não é muito diferente da maioria. Requer maiores esforços na concentração em suas deficiências;
confiar o que os olhos não veem, é sentir mais o que o sentimento traduz. Comunicar-se com gestos o que a voz não transmite. São valores perceptíveis, só o deficiente sente. Armazenado no cérebro, só aparecem nas pessoas dotadas. Denominação de percepções ampliadas dos sentidos. É dádiva do Criador, oportunidade para viver com limitação.
Batacoto.