Ações do Professor
 
Luiz Carlos Pais
 
 
Uma das proposições iniciais da teoria das situações didáticas diz respeito às ações do professor que é levado a participar ativamente da estruturação do meio. Tendo em vista o desafio de trabalhar com a modelagem das atividades de ensino, seguindo um dos traços marcantes do saber científico que consiste em produzir sistemas regulares de solução de problemas, Brousseau destaca o que chama de “forte componente de regulação dos processos de aquisição do aluno.” Sobre essa afirmação, entendemos que quanto mais refinado foi o grau de regulação das ações envolvidas nas atividades escolares mais científicas serão as bases da didática exercida pelo docente.
 
A ideia de controle ou regulação do meio, nos limites possíveis do modelo estruturado pelo professor, com aval da instituição, está essência da proposta de investir esforços numa abordagem mais científica das atividades de ensino. Não podemos perder de vista que todo modelo científico tem um limite de validade ou de funcionalidade, a partir, como mostra a história das ciências, está o desafio de ser substituído por outro mais eficiente e adequado ao contexto social previsto. Gostaríamos de registrar aqui um comentário, pois é preciso entender o que pode ser considerado progresso setorial em determinado momento da história social e as forças reacionárias que impedem ou tentam impedir a evolução. Jacques Le Goff tratou desse tema contemporâneo, cuja análise tem uma relação direta para entender os limites avanço recente na Educação Matemática e a realidade social mais amplo do Brasil.
 
Retornando ao tema da regulação, da mesma forma como o professor tem o desafio – compromissos e responsabilidades inseridos no contrato didático - de estar atento ao que é possível controlar no modelo aplicado, por outro lado, o aluno também vivencia um desafio análogo de elaborar o conhecimento pela regulação das determinações antagônicas do meio. Em síntese, ao optar por esse tipo de modelagem didática, na linha proposta por Brousseau, aluno e professor estão empenhados em compromissos e responsabilidades, por vezes, ditadas por regras e normas culturais.
 
Essa componente da regulação do meio mostra que a educação matemática prevista não tem nada de espontâneo ou natural, relembrando aqui os constantes conflitos entre a adaptação e aculturação, como destaca o autor. Segundo nosso entendimento, esse aspecto releva com mais clareza o enfoque didático previsto Brousseau, assim como outras teorias do Programa Epistemológico favorecem outras dimensões do fenômeno, tais como a teoria antropológica do didático, concebida por Yves Chevallard a partir de pressupostos mais sociológicos e culturais, sem a precedência das ações realizações pelo professor e aluno no espaço estrito da sala de aula.
 
Na medida em que o aluno conseguir regular as imposições do meio é sinal que está em curso a elaboração do conhecimento, por aproximações sucessivas com o saber matemático de referência. O aluno compreende na medida em que consegue por suas efetivas ações aproximar os seus conhecimentos e o saber matemático focalizado. As ações docentes estão inseridas nessa proposta de estruturação do meio, com as diferentes posições assumidas pelo aluno. Desse modo, um observador que esteja fora do sistema didático, analisando as relações nele envolvidas, poderá perceber que o professor e aluno assumem posições diferentes em função do contexto no qual as ações estejam sendo realizadas ou idealizadas.
 
Em outras palavras, o aluno que está na sala de aula e realiza as atividades didáticas é um indivíduo singular, um sujeito encarnado como dizem os fenomenólogos no sentido de esse indivíduo ter uma subjetividade e uma realidade própria que jamais poderia ser abstraída ou desconsiderada pelo professor; por outro lado, Brousseau nos leva a observar que há outras posições que ele chama de sujeito genérico, universal ou epistêmico. Para melhor entender essas diferentes posições, o autor sugere uma simbologia: sujeito universal (S1), sujeito genérico (S2), sujeito da aprendizagem (S3), sujeito que atua (S4) e sujeito objetivo (S5).
 
De forma análoga, o professor que está preparando sua aula ou ministrando a aula sugere posições distintas, que, segundo nosso entendimento, estão relacionadas ao contexto no qual as ações didáticas docentes estejam sendo realizadas. Essas diversas posições que estão relacionadas à sala de aula tradicional (quer seja na realidade da sala de aula, no planejamento realizado pelo professor ou na realização das tarefas discentes em casa) estão inseridas no meio cuja estruturação está mais diretamente a cargo do professor como sujeito de uma instituição escolar.