"ENSAIO SOBRE O SONHO E REALIDADE / A NOVA BOA NOVA"
PARTE I
O presente ensaio decorre da exposição do pensamento de Gaston Bachelard (1884-1962) a propósito do confronto entre SONHO e REALIDADE.(Os poetas habitam o Bosque do Devaneio, transformando sonho em realidade e realidade em sonho.)
Convém em princípio identificar no pensamento bachelardiano duas correntes: uma relacionada ao sonho (literária) e outra relacionada à realidade (filosofia). Mas não nos esqueçamos que Bachelard era poeta: o filósofo poeta. Bachelard foi integrante de uma corrente filosófica denominada Criticismo, originada de Immanuel Kant (1724-1804); operou na Epistemologia (ciência do conhecimento).
O Criticismo é síntese entre o Racionalismo presente em René emRené Descartes(1596-1650) e em Gotfried Leibniz e a tradição empírica inglesa de David Hume, John Lock e George Berkley, Spinoza que valoriza a INDUÇÃO.
Foi PLATÃO (427-347) quem abordou explicitamente a EPISTEMOLOGIA. No diálogo de Platão com Glauco, é contada a parábola
conhecida como "A CAVERNA DE PLATÃO" : Num tempo remoto certo povo primitivo habitava, por questões de medo e segurança uma caverna profunda iluminada por fogueira acesa com o betume presente em suas paredes. Comiam os morcegos capturados das fendas rochosas e lambiam a umidade que escorria com certa frequência .Quando dançavam em torno da fogueira, suas sombras eram projetadas nas paredes e estas se lhes afiguravam como entidades misteriosas e fan_
tasmagóricas. Certo dia alguém enveredou-se por um dos túneis e encontrou a estreita abertura da entrada, pode ver a luz plena do dia, o céu azul, as savanas e os animais rasteiros e voadores que podiam fornecer abundância. Tendo desfrutado dos benefícios que o lugar lhe proporcionava, o ousado homem resolveu voltar ao interior da caverna para repartir com seu povo a maravilhosa descoberta. Contou entusiasmado aos comedores de morcego sua grande aventura, mas não acreditaram nele. Atiraram-no no braseiro.
É evidente a intenção pedagógica de Platão. Temos agora de deduzir qual foi a intenção de Bachelard que SUBVERTE os conceitos,
induzindo-nos ao erro, identificando o SONHO como REALIDADE E REALIDADE como SONHO. Insistimos em lembrar que Bachelard é também um poeta.
Ora! Por que não inverter literalmente Sonho e Realidade, se a proposta é subverter o sentido de VERDADE (que é o que é). Uma coisa não pode ser outra a não ser metonimicamente no plano estrito da LITERATURA. O que Bachelard pretendeu de forma sedutora foi propor uma revisão dos conceitos vigentes, para libertar-nos das cracas filosóficas da infância do conhecimento, cristalizado nas amarras das doutrinas filosóficas e religiosas denunciadas por Spinoza e por Foucault (detenção do poder).
Cabe a Merleau Ponty, discípulo do filósofo Russerl revelar ao mundo o MISTÉRIO DA RAZÃO quando escreveu "O Visível e o Invizível":
"O homem não detém todo o conhecimento, mas se esforça para alcançá-lo. A verdade não habita o homem interior, o homem está no mundo em que ele se conhece, não no mundo da racionalidade."
Pensar com atualidade, ou deixar que outros pensem por nós?
Eis a questão. Quando entendemos como Carl Popper, o mais influente pensador do século XX, que a indução pode ser questionada e o conhecimento pode ser uma NOVA "BOA NOVA", estaremos prontos a
descobrir a "SAÍDA DA CAVERNA DE PLATÃO".
Por último, dentro da finalidade deste artigo, não podemos deixar de considerar o pensamento de Friedrich Nietzsche (1844-1900), alinhado dentro do pensamento do CRITICISMO .
Escrevendo de forma poética, Nietzsche conta sobre o filósofo hipotético que auto intitulou-se de ZARATUSTRA. A obra" E ASSIM FALOU ZARATUSTRA" é uma coleção de livros que se tornou posteriormente um único compêndio: Numa caverna no alto da montanha Zaratustra refletiu e pregou por dez anos com a missão de superar o NIHILISMO e chegar ao"BEYOND HUMAN" (SUPER-HOMEM), detentor da condição de estar acima do "BEM E DO MAL", evidentemente uma metáfora radical e revisionista do pensamento do mundo ocidental denunciado por Foucault, porém, muitos ainda preferem continuar na "Caverna de Platão."
Não seria esta a nova "Boa Nova"?
(Fim da Parte I, continua)