Quem Mexeu em minha Memória?
Uma lamentável confusão faz com que julguemos
toda novidade malsã e toda velharia saudável.¹
DRUMMOND
Tomo a folha de papel – e ele me faz lembrar os trabalhos escolares em que se fazia com almaço e capricho e esmero e... bonitinho como pedia a professorinha – para anotar, em rascunho, minhas observações sobre a memória: o ontem se mescla com o hoje.
Quanto ao passado, especificamente o escolar, vem à tona coisas que não mais se faz ou deixaram de serem coisas: rascunho de redação, papel almaço, desenhocop, arguição oral, cópia de textos, ditados, redação (quantas linhas seriam necessárias para que contivesse início-desenvolvimento-conclusão – lembro-me do Prof. Juventino com seus títulos exóticos que nos propunha, como “A Aranha Tece sua Teia para Viver, a Salamandra, a sua Mortalha”; o que escrever segundo esta temática?).
Escola? Era para poucos. No máximo o Grupo Escolar. O Ginásio para uns. O Clássico, o Científico e o Magistério para os seletos. Seleção? Concursos para disputar vaga através da “Admissão” como se fossem Vestibulares de antes ou ENEM de agora, com todo rigor. Cabe, sobre estes exames, uma citação:
“O exame combina técnicas da hierarquia que vigia e as da sanção que normaliza. É um controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar, classificar e punir. Estabelece sobre os indivíduos uma visibilidade através da qual eles são diferenciados e sancionados. É por isso que, em todos os dispositivos de disciplina, o exame é altamente ritualizado. Nele vêm-se reunir a cerimônia do poder e a forma da experiência, a demonstração da força e o estabelecimento da verdade. [...] A superposição das relações de poder e das de saber assume no exame todo o seu brilho visível. [...] O exame (com) seus rituais, de seus métodos, de seus personagens e seus papéis, de seus jogos de perguntas e respostas, de seus sistemas de notas e de classificação.”(p.177)²
Para os excluídos cabiam-lhes trabalhos com baixos salários ou internação em instituições que abraçavam com braços de polvo e apertos de serpentes àqueles que não queriam estudar e não se adaptavam ao trabalho.
O tempo presente é diferente. É presente! É presente. Todos na escola com boa merenda, livros didáticos fornecidos pelo governo, bolsa família que vigia a assiduidade dos contemplados na escola, promoções automáticas no final de cada série – ops! – cada ano escolar...
Se esta geração que aí está desembrulhará este presente, o que fará com ele e se isto tudo que faz parte da Escola atual é na verdade um “presente de grego”, o futuro sacramentará o hoje e o ontem. Que ele desponte com uma Nova Ordem Social mais justa e equilibrada e não o Caos que os pessimistas preveem!
A minha memória foi mexida – já que o outro escreveu “Quem Mexeu no meu Queijo?”³- com o término da leitura do livro de Foucault, “Vigiar e Punir”, onde se encontra várias respostas para diversas perguntas e muitas perguntas que ainda não encontraram razões. E é com um dos últimos parágrafos que referendamos este texto:
“O(...) processo é o crescimento das redes disciplinares, a multiplicação de seus intercâmbios com o aparelho penal, os poderes cada vez mais amplos que lhes são dados, a transferência para eles cada vez maior de funções judiciárias: ora, à medida que a medicina, a psicologia, a educação, a assistência, o trabalho social tomam uma parte maior nos poderes de controle e de sanção, em compensação o aparelho penal poderá se medicalizar, se psicologizar, se pedagogizar; e desse modo tornar-se menos útil a ligação que a prisão constituía quando, pela defasagem entre seu discurso penitenciário e seu efeito de consolidação da delinquência, ela articulava o poder penal e o poder disciplinar. No meio de todos esses dispositivos de normalização que se densificam, a especificidade da prisão e seu papel de junção perdem parte de sua razão de ser.” (p.289)²
No Brasil, então, se tínhamos instituições para os menores, hospitais para os “loucos” e cadeias para os transgressores da ordem temos hoje o Centro Social, a Escola, que exige que o professor seja o educador e repense em seu papel e suas posições frente à Educação.
Obrigado, Foucault por trazer respostas e dúvidas; por nos fazer pensar no antes, no agora e no que pode vir a ser!
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¹DRUMMOND, C. – Sobre a Tradição na Literatura. In: Helena, Lúcia. Modernismo Brasileiro e Vanguarda. 3ª Ed. Editora Ática, p.56
²FOUCAULT, Michel- Vigiar e Punir- 38ª Ed. Editora Vozes, p.177
³JOHNSON, Spencer – Quem mexeu no meu Queijo? http:/WWW.whomovedmycheese.com/
Leonardo Lisbôa.
Barbacena, 14/08/2013.