O GAROTO DO ADEUS

A vida deveria nos dar outra chance. Poxa. Quando eu tinha dez anos, minha mãe costumava me chamar de “parasita”. E me arranjou um padrasto violento pra caramba. Um viciado em drogas, cuja maior diversão era me humilhar. Cresci com complexos terríveis. Morria de medo das garotas que me atraíam. Tive que vê-las indo embora uma a uma. Eu era o garoto do adeus.

Claro que algumas mais ousadas me atacavam. E sou eternamente grato a estas garotas. Vivemos casos longos, pois sou um apaixonado. As partidas eram cheias de lágrimas. Ainda não me lembro bem por que os casos terminavam. Acho que é por que às vezes mais de uma garota sentia pena de mim ao mesmo tempo.

Mas nunca pude dizer “te amo” olhando nos olhos das minhas garotas. Hoje sei que amei cada uma delas. Se me ouço uma canção como “Careless Whisper”, do George Michael, me lembro de Eliana, que arrancou meu macacão e me deixou nu sobre um chão de terra em plena madrugada. Quando reprisam “Veludo Azul”, relembro as intermináveis tardes passadas no colo de Vera, bebericando um Campari on the rocks.

Das que partiram sem me dar chances, pouca coisa sei dizer. Uma delas reencontrei na faculdade. Havia se casado e se separado em dois anos. Ou seja, apesar de bonitinha, deve ter um gênio do cão. Outra que partiu meu coração tem uma irmã com quem me deparei recentemente. Disse que o casamento da minha ex-musa anda mais pra lá do que pra cá. E que nas brigas ela sempre diz: “saiba que deixei um rapaz que fazia poema para mim”. Ei, talvez seja eu!

Não desejo mal a nenhuma delas. Mas acho que me compreenderam mal. Se soubessem o bem que guardei para cada uma delas... Acho que não mereceram. Peguei algumas ao redor dos quarenta, quando estão incrivelmente inseguras em relação ao futuro. E desta vez dei o troco. Depois de noites gloriosas, fugi sem deixar vestígios. Afinal, agora sou casado com uma daquelas que me atacaram.

Tive a oportunidade de saber o motivo de elas terem partido assim, de modo a me fazerem escrever poemas sobre o musgo que crescia sobre o muro de suas casas vazias. Bem, a causa principal era a minha insegurança. Elas queriam ser atacadas. Droga!. Outras deixaram entrever um certo racismo. Medo de ter um filho com cabelo pixaim, medo que passa quando fazem a ligadura de trompas.

Só tem uma mulher nesta história que não perdoo. Minha mãe. Comprei uma casa para ela a dois quarteirões da minha apenas para não visitá-la. Ela fica puta da vida. Mas tem que pagar pelo que me fez. Sei que ficou viúva muito jovem com três filhos, mas não tive culpa disso. Agora implora por algumas migalhas de minha atenção. Mas não dou.