Que assim seja

Um dia ouvi que eu era a pessoa mais importante para alguém.

Na época, aquilo era essencial para mim: ser promovida pela reciprocidade.

E o tempo, imperador dos destinos todos, desgastou os mármores, mas manteve intacto aquele amor: ele sobreviveu à relação finda. E eu perdera o meu alto cargo de importância para aquele alguém. Convalescente, mas em recuperação da suposta infelicidade de um ego magoado, tive que descobrir outra forma de amor: uma espécie rara que dá perenidade ao bem-estar e põe o ego em seu lugar. Eu me tornei a pessoa mais importante para mim.

Quem poderia me tomar isto? O tempo?

Hoje, as pessoas vão e vêm. Recebo-as, rejeito-as, tolero ou amo. A poesia não me tira os sentimentos vis, nem as doçuras de um ser humano.

Um dia me chamaram de radical. Aceitei: só eu sei a importância que as coisas têm para mim e o propósito de mantê-las ou não na minha vida. Em outra ocasião, me chamaram de amorosa. Compreendi: pessoas amoráveis extraem o que tenho de melhor. Já me disseram que pareço um personagem. Entendi: sendo povoada por tantas, quão imprevisível posso ser na liberdade que me permito ter. Não me importo com o que julgam, sempre serei espelho e sempre terei o “Outro” como meu espelho. Somos extensão. Estejamos ou não em harmonia ou comunhão, dedico carinhosamente o meu tempo compartilhando minha nudez. Aos que vêem máscaras e vestes, sou impotente a estas leituras. Aos que vêem generosidade e amparo, sou impotente à beleza que me dão. Sou impotente ao olhar alheio. Não tenho o controle de absolutamente nada, mas o meu trabalho consiste em eu não me rejeitar. Diariamente eu fortaleço minha auto-estima assim:

Hoje, nem que seja apenas hoje, eu sou a pessoa mais importante para mim. Que assim eu esteja. Que assim seja.

Marla de Queiroz
Enviado por Mara Holzner em 07/03/2013
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