Vida Feito Bergamota

VIDA FEITO BERGAMOTA

Embaixo de um pé de bergamota foi construída minha infância,de sonhos e descobertas.A cada dia que se passava eu era surpreendida por novos sentimentos, que para mim eram desconhecidos.Sentimento bons e até mesmo ruins, que a vida naturalmente nos traz.Vivia em uma cidadezinha no irterior do Rio Grande do Sul, com as casas uma longe da outra, eram sítios, em volta tudo era natureza.As estradas ainda eram de chão, mas não fazia diferença, não conhecia a de asfalto mesmo.

Infância boa foi a minha,tudo era diferente.As pessoas da direita sempre cumprimentavam a da esquerda mesmo sendo desconhecidas.Os sítios então, aquilo que era capricho,horta sempre verdinha,temperos de todos os tipos,animais bem tratados,e as flores que formavam um lindo mosaico á céu aberto.Tinhamos também caixas de abelha que produziam mel(é claro) ,que eu passava no pão todo dia de manhã,grandes parreiras de uva para se produzir vinho, vacas para se fazer queijos e os maravilhosos bolos, tortas, pães,bolachas pintadas ,que minha nona fazia quase todo dia quando ia na casa dela.Porcos para a linguiça, chouriço(eca), salame...E com certeza não podia faltar as galinhas, que particularmente eu adoro na panela.Teve um dia que minha mãe me pediu para ir ao galinheiro para buscar os ovos e meu irmão ficou o caminho todo me atormentando, quando cheguei lá, adivinha?Joguei a maioria dos ovos que tinha, nele,e é claro também levei umas "ovadas" também.E depois para explicar o motido dos ovos em nossa roupa para minha mãe?! Eu e meu irmão ficamos com uma cara de tacho, e como quase rotina apanhavamos com vara da árvore de pêssego, que ficava ao lado de casa.Tinha vontade de cortar aquela árvore com um machado, mas os frutos que eu comia dela, fazia eu esquecer essa ideia.

Fora para guerrinhas, os ovos também eram utilizados pela minha mãe para fazer inumeras receitas.Quando algum bolo ou pão quentinho saia do forno, não conseguia esperar.Comia tanto que até ficava com dor de barriga, bem que minha me avisava, mas criança escuta?Falando em pão, o pão mais gostoso eu já comi foi na casa da minha visinha(daquela época).A família dela era bem simples, a casa também e nem tinha manteiga ou algo para passar no pão, mas acho que foi feito com amor, porque foi isso que eu senti quando comi aquele pão com uma massa bem branquinha, era tão fofinho, parecia uma nuvem.

De tudo que se era produzido nos sítios, nada se era vendido, todo mundo tinha, era comum naquela época.

No meu tempo de menina, só era feliz quem tinha criatividade, fazia meus próprios brinquedos.Se eu perguntasse para meu pai:"Pai, o senhor pode comprar uma boneca para mim?".Nossa, era um escândalo:"Para que uma boneca, gastar dinheiro a toa, vá fazer outra coisa menina!".Por isso nem insistia muito.Fazia minhas próprias bonecas de sabugo de milho, ou de retalhos que minha mãe me dava.Fazia casinhas embaixo das árvores com um mato chamado vassourinha, um tipo de palha.Mas qualquer vento que dava, levava embora toda minha alegria.Não fazia mal, eu pegava um pedaço de papelão e saia escorregando pelos montes de terra que tinha no bairro.Quem nunca fez isso, né?!

Certo dia eu fui na casa de uma amiginha nova que tinha acabado de se mudar no sítio ao lado, ela era bem legal nos divertimos uma tarde inteira, quando estava indo embora vi um iô-iô quebrado jogado no chão, perguntei para ela se ela podia me dar, disse que sim estava quebrado mesmo.Chegando em casa o arrumei e coloquei uma cordinha nova, fiquei tão alegre, mas a menina viu eu brincando com o iô-iô e falou para a mãe dela que eu tinha roubado ele.Tive que devolver.Menina chata!

Eu adorava assistir desenhos animados pela TV, na época ainda preta e branca, era uma das coisas que eu mais gostava de fazer.Mas, às vezes quando eu estava assistindo a melhor parte do desenho, que o super herói ia prender o vilão, lá vinha meu pai, colocava a mão na TV e dizia:"A TV está quente temos que desligar!".Meu pai era bem digamos, "economico",não gastava dinheiro com o que não era necessário para ele.Refrigerante só nos finais de semana, e quando chegava a páscoa que ovo que nada, só um bombom estava ótimo.

Árvores era o que não faltava, uma variedade imensa, mas o que eu mais gostava era subir nas de jabuticaba, ficava o dia todo lá se deixasse, é lógico que comendo.Comia também goiabas, ameixas, maças, mamão, morango, bergamotas...

Bons tempos foram aqueles em que eu queria viver, mesmo na simplicidade do meu dia-a-dia, queria viver, observando as mínimas coisas que normalmente passam despercebidas, como um pássaro rasgando o céu azul de uma tarde de outono, uma formiga carregando um pedaço de uma folha, uma borboleta entre as flores do jardim, sombras a se mover, os barulhos feitos na casa quando eu dormia...E me sentia feliz!Eu não precisava de muito, eram só petalas de flor de bergamota, uma pitada de natureza, meia xícara de compreensão, e uma colher cheia de amor.

E assim foi formada uma infância embaixo de um pé de bergamota.

FIM

Leticia Soto Riva
Enviado por Leticia Soto Riva em 07/01/2013
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