Melhor ir sozinho

O cenário não poderia ser mais bonito, lá do alto podia-se ver florestas, geleiras e desertos, como se todo o mundo estivesse ao alcance dos olhos. Lá do alto da mais alta montanha via-se tudo com perfeição de detalhes, qualquer um seria capaz de contar os grãos de areia do deserto distante. Uma grande e solitária casa estava situada onde terminava o deserto e começava a floresta, era a única construção naquele mundo natural.

Lá do alto um rapaz observava o mundo, o vento soprava forte balançando a blusa social de cor branca, com as mãos no bolso da calça e cabeça erguida parecia seguro e encarando o cenário, os olhos fixavam o longe, alem da floresta e do deserto, no pulso esquerdo trazia uma pequena corrente presa como pulseira. Aos seus pés estava uma mochila caída e aberta, dela saiam folhas de papel amassadas e canetas empurradas pelo vento. Garrafas de vinho vazias jogadas no chão, garfos e facas, uma arma, um rifle de grosso calibre, uma “elephant gun” enferrujada caída sobre os pés do rapaz. Um mapa que indicava vários caminhos e cheio de anotações e riscos também estava no lugar, parecia lutar contra o vento para não sair voando sem destino.

Ele lá em cima aguardava a chegada de outros dois, o senhor dos números chegaria logo, com sua lógica matemática. Seguiu por uma trilha de pequenas pedras deixadas para assegurar o caminho de volta daquele que chegara primeiro no topo da montanha, não trazia nada alem de suas certezas e opiniões, sua vivencia e seus segredos. O senhor dos números não colocaria nada naquele chão.

Passado um tempo chega o terceiro, subiu rápido já parecendo saber o caminho, deixou cair no chão instrumentos e notas musicais, caíram mascaras que se quebraram, junto delas se foram suas defesas e instinto de sobrevivência, ficou apenas certezas em sua cabeça. Deixou o rosto livre pela primeira vez e percebeu que os olhos soltos alcançam muito mais que os mascarados, que não é preciso deixar um lado para seguir outro.

Os três vislumbravam o mundo a sua frente, cada um com seu aspecto preferido e olhando para onde melhor lhe agradasse os olhos. Mas não estavam sozinhos ali, podia-se ver tantas outras pessoas explorando os campos, floresta, geleiras, praias e desertos. O primeiro olhava para o ponto onde terminava a floresta e começava o deserto, a pulseira parecia-lhe pesar o pulso. O segundo olhava para a praia mais distante, cansara-se de olhar a geleira e agora preferiria curtir um pouco do verão tranqüilo na praia. O terceiro não sabia para onde olhar, praia, geleira, campos, deserto e floresta, olhava tudo, mas, instintivamente, seus olhos pareciam querer fitar a casa.

“Hora de descer, não?” disse aquele que é rodeado de números.

“Já não era sem tempo.” Respondeu o terceiro.

“Vão na frente, eu vou ficar e olhar um pouco mais.” Respondeu o que já estava la. Ele sabia que não poderia segui-los naquele momento, pra onde ia, só um poderia ir. Pra onde ia, só um ele queria que fosse.