É inevitável que ao lermos a afirmação acima pensemos que sua melhor estrutura deva ser a interrogativa: um mundo sustentável é possível?
 
A resposta não se bastará na reflexão ou nas propostas alternativas. É preciso urgentemente convocar os operários para trabalharem na construção desse outro mundo. Agora sim, a pergunta oportuna: Estamos pessoalmente animados a mudar os hábitos e assim, ver chegar o outro mundo possível?
 
Em quase todas as aulas de catecismo (para quem a freqüentou), ouvíamos a mais emblemática e popular frase cristã: “ama o teu próximo como a ti mesmo” (Gl 5,14). Mas, afinal quem é esse próximo? E mais, qual a relação disso com a sustentabilidade?
 
Bem, precisamos de operários para messe que vejam no outro a condição de sua própria existência; que entendam o infortúnio do outro como o próprio infortúnio. Que consigam romper com a mentalidade do triunfo a custa da miséria alheia, da competição do mercado ganancioso que só consegue enxergar no próximo a possibilidade de acumular benefícios pessoais. Só teremos uma sociedade em harmonia com a natureza se tivermos pessoas capazes de valorizar a dimensão ética do desenvolvimento econômico, social e político. Pessoas que façam uma opção preferencial, verdadeira, radical e absoluta pela vida humana e cósmica.
 
Pessoas que respondam com responsabilidade ao convite à vida. Mas, pensemos: qual vida? Seria aquela em que ficamos abaixo da linha da miséria, e apenas não morremos? Ou uma vida em abundância, plenamente digna e autônoma, portanto, uma vida sustentável?
 
Modo de vida sustentável implica muito mais que o conhecido desenvolvimento sustentável, palavra chave dos documentos oficiais, dos governos e dos organismos multilaterais, cujo sentido é ampliado pela Carta da Terra. Modo de vida sustentável: o novo sonho ético e cultural da humanidade. Ele supõe uma outra forma de conceber o futuro comum da Terra e da humanidade e, por isso, demanda uma verdadeira revolução nas mentes e nos corações, nos valores e nos hábitos, nas formas de produção e de relacionamento com a natureza (BOFF, 2003, p. 25).
 
Supõe firmar o pacto pela defesa a Terra contemplando-a como uma morada comum e acolhedora da grande comunidade que passa a comungar da dimensão antropológica e ecológica pelo prisma holístico. Supõe entender que não há lugar para o sujeito-indivíduo egoísta, mas para a rede de sujeito-comunidade que vive o espírito de parentesco com todas as formas de vida, assumindo responsabilidades no presente para no futuro experimentar do bem-estar da família humana e de todos os seres vivos.
 
Um outro mundo é possível na medida em que é possível pôr a economia, a ciência e a tecnologia a serviço da vida de todos e da natureza. Essa reorientação de tudo a serviço da vida de todos só é possível se existe um sujeito com uma opção ética radical, tanto prática como teórica, tanto pessoal como social. Uma mudança de sistema exige uma mudança ética radical e exige escutar o grito dos excluídos e excluídas e o grito da terra e da água (RICHARD, 2006, p. 99-100).
 
Amar ao próximo é voltar-se prioritariamente com olhar de reverência ao mistério da existência. É render ao cosmo hinos de gratidão e com humildade respeitar o dom da vida, presente em tudo e todos, cuidando do nosso lugar na natureza. Pois, com nos diz Boff (2003) “Mais que buscar um desenvolvimento sustentável, importa construir uma vida sustentável, uma sociedade e uma Terra sustentável”.
 
A travessia nos expõe a uma conjuntura atual tortuosa, excludente e profana do sagrado que é a natureza. Nem todos aceitaram o convite ao ‘banquete da vida’. Preferiram o inebriante progresso econômico e tecnológico, mas que não está em harmonia com a natureza. Ou retomamos o elo que interliga todos os moradores da Casa Terra ou estamos fadados ao vazio.
 
O ser humano, nas várias culturas e fases históricas, revelou essa intuição segura: pertencemos à Terra; somos filhos e filhas da Terra; somos Terra. Daí que homem vem de húmus. Viemos da Terra e a ela voltaremos. A terra não está à nossa frente como algo distinto de nós mesmos. Temos a Terra dentro de nós. Somos a própria Terra que na sua evolução chegou ao estágio de sentimento, de compreensão, de vontade, de responsabilidade e de veneração. Numa palavra: somos a Terra no seu momento de auto-realização e de autoconsciência (BOFF, 1999, p. 72).
 
Deixar de cuidar é tornar-se fatalmente órfão.
 

Referências:
 
BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.
 
BOFF, Leonardo. Ética e eco-espiritualidade. Campinas, SP: Verus Editora, 2003.
 
RICHARD, Pablo. Força ética e espiritual da Teologia da Libertação no contexto atual da globalização. [tradução Cristina Paixão Lopes]. São Paulo: Paulinas, 2006.


 
Imagem - Fonte: Google
Toni DeSouza
Enviado por Toni DeSouza em 12/10/2011
Reeditado em 06/03/2012
Código do texto: T3273270
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