Holocausto Nunca Mais (PsychCity) ROTEIRO DE CINEMA (II)
65. EXTERIOR. NOITE. AVENIDA PAULISTA
(A parte dianteira de um carro desloca-se para cima e logo depois desaba por sobre o porta-malas do veículo em frente. Um POLICIAL agacha-se ao vê, atônito, aproximar-se dele o capuz de um carro que havia desprendido-se de um veículo nas proximidades. Ele deita-se apressadamente no asfalto da rua, assim como outros POLICIAIS que estão próximos. Eles são atingidos apenas pelos estilhaços dos vidros quebrados dos carros policiais que foram impactados pelo capuz, que agora arrasta-se a poucos metros, na calçada defronte, após causar estragos no teto de duas viaturas.)
(Algumas luminárias que permeiam a Avenida Paulista, em forma de flor-das-almas, esfacelam-se em milhares de pedaços, após explodirem, projetam seus fragmentos para todos os lados. Alarmes contra roubos aumentam muito a poluição sonora. Tornando-a insuportável nas imediações.)
66. EXTERIOR. NOITE. AVENIDA PAULISTA. PLANO EM AA-PASSANDO, GRADATIVAMENTE A PLANOS APROXIMADOS (PAs)
(As sirenes das ambulâncias fazem-se ouvir. Assim como as sirenas dos carros de bombeiros e das viaturas policiais que vão chegando ao lugar, ocupando espaços nas calçadas e nas ruas transversais. Somando-se às viaturas que nele estavam.
Focos de incêndio pipocam em toda extensão da Avenida. Barricadas policiais são erguidas. Fitas de plástico amarelo estendidas ao redor das áreas consideradas de risco.)
(Cavaletes traçam os limites de circulação dos pedestres, ciclistas, motoqueiros e motoristas. Grandes áreas adjacentes, nas ruas paralelas estão sendo interditadas.)
(Motores de explosão alternada explodem. Pegam fogo. Literalmente. À fumaça resultante soma-se à névoa esverdeada que permeia o lugar. O combustível e o ar dos cilindros inflamam-se. As labaredas sobem de debaixo dos capuzes que ainda permanecem parcialmente fechados. PORTEIROS, SEGURANÇAS, POLICIAIS, PROPRIETÁRIOS de veículos, tentam apagar com extintores de incêndio os focos de fogo surgidos em vários locais. Há grande azáfama nesses lugares globalizados pelo mesmo modelo de eventos coletivamente mórbidos: Brasil, Estados Unidos, China, e muitos outros.)
67. INTERIOR/EXTERIOR. NOITE. FIFTY AVENUE. ESTADOS UNIDOS. AA-PASSANDO, GRADATIVAMENTE, A PLANOS APROXIMADOS
(PESSOAS que dirigiam seus carros contemplam os estragos ao redor. Algumas comentam entre si que os Estados Unidos talvez estejam novamente sob ataque terrorista. A situação semelhante à da Avenida Paulista. Focos de incêndio pipocam em toda a extensão da Fifty Avenue. Cavaletes policiais traçam os limites de circulação. Luminárias pipocam. Focos de incêndio em vários lugares. Os sinais de trânsito pendem dos gonzos e fios de sustentação. Os sinais de trânsito que permanecem no lugar, piscam do vermelho para o verde e amarelo sem interrupção. Janelas de vidro dos edifícios ainda estilhaçam-se com grande estardalhaço.)
68. INTERIOR/EXTERIOR. NOITE. AV. CHANG´AN. CHINA. AA-PASSANDO,
GRADATIVAMENTE, A PLANOS APROXIMADOS
(PESSOAS agachadas tentam não ser atingidas por estilhaços de vidro. Muitas correm em direção a abrigos improvisados. Veículos são puxados para o alto por força ascensional inexplicável. O espetáculo aterroriza e alucina.)
Os celulares soam sem cessar. A sonoridade patológica da cidade está multiplicada por dez.
69. INTERIOR/EXTERIOR. NOITE. AVENIDA PAULISTA. (CAA-PASSANDO A PA)
(O cenário de conflito impressiona. Os contendores parecem ser todos contra todos. COMO se o ódio sempre tivesse marcado presença no psiquismo coletivo das PESSOAS e, de repente, não menos que de repente, tivesse aflorado de maneira incontrolável. A câmera em AA se aproxima dos carros no asfalto. HELIO, do banco do motorista sintoniza o rádio. As notícias sobre os acontecimentos violentos, inusitados e inexplicáveis na Avenida Paulista e, simultaneamente, em outras demais capitais do planeta, fizeram-no ficar mais apreensivo do que de costume.)
(CARLA permanece de olhos fechados, como se ausente, enquanto o PAI acelera suavemente o veículo, buscando sair de fininho entre os escombros. Desviando-se das faíscas que proliferam no asfalto, provenientes dos pedaços de materiais elétricos de luminárias, sistema elétrico dos carros, fiação em curto-circuito. Ele dirige devagar, temendo ser parado pelos policiais, entre a fumaça de motores fumegantes e a névoa esverdeada misturada aos poluentes que saem dos veículos automotores.)
70. INTERIOR/EXTERIOR. CARRO. NOITE
HELIO consegue se afastar do cenário de sucata ao ar livre em que se transformou o asfalto na Avenida Paulista. Em pânico, não consegue articular as palavras. De quando em vez olha para CARLA. E se pergunta:
— “Ela contribuiu para que seu carro fosse poupado da violência inaudita que presenciara há pouco?”
71. EXTERIOR. AVENIDA PAULISTA. NOITE
A suposta calmaria do cenário é perturbada por uma série de POLICIAIS que apontam para uma camioneta impulsionada em arco por uma força tipo catapulta, invisível, nas proximidades do Museu de Arte de São Paulo (MASP).
Os POLICIAIS correm apressadamente das proximidades do evento. A caminhonete descreve uma trajetória muito alta, em meio arco de círculo, indo cair sobre duas viaturas policiais estacionadas no asfalto em frente ao prédio da Justiça Federal.
A gasolina se espalha e uma faísca faz explodir os carros que se arrastam na Avenida, impulsionadas pela violência do impacto, devido à velocidade de atrito. Calculada posteriormente em mais de 150 km/h.
72. INTERIOR. NOITE. APARTAMENTOS
As salas de jantar de alguns apartamentos são mostradas rapidamente pelas câmeras, a partir dos noticiários TVvisivos. As PESSOAS do sofá da sala de jantar assistem a tudo com perplexa passividade.
Os repórteres dos jornais impressos e TVvisivos entrevistam PESSOAS envolvidas, CIVIS e MILITARES. As opiniões são intercaladas por depoimentos traduzidos das reportagens efetuadas em outros países, onde ocorrências semelhantes aconteceram simultaneamente nas principais avenidas do planeta da informação globalizada.
73. INTERIOR. APARTAMENTO. DIA. DIA SEGUINTE
JUSSARA (contida e compassiva atende telefonema da mãe (LIGIA) de VOLTAIRE:
JUSSARA (em resposta à outra) — Não é incômodo. Um prazer.
LIGIA — VOLTAIRE tinha muito carinho por você (querendo parecer simpática). Ontem achei um envelope com um bilhete e um DVD para serem entregues a ti. Se algo acontecesse com ele (choramingando) —Aconteceu.
JUSSARA — (com muito jeito) — Nenhuma de nós estava preparada para isso.
LIGIA — (conformando-se) — Não percebi nenhuma apreensão especial nele. Não falava nadica de nada comigo.
JUSSARA — (explicativa) — Quem poderia se dá conta dessas coisas tão incomuns? Inesperadas? Nem as autoridades conseguem explicá-las.
74. INTERIOR. DIA. USP. EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA
Cenas em “back-up” (flash) do evento CHE que vitimou VOLTAIRE.
75. INTERIOR. APARTAMENTO. CONTINUAÇÃO DO DIÁLOGO
JUSSARA — (aflita, levando uma mão à cabeça) — O Jornal Nacional está se tornando mais Fantástico do que o programa Fantástico do domingo.
LIGIA — (afirmativa) — Li sobre uma teoria. A mente inconsciente, diante de tantos eventos sociais mórbidos, está provocando reações inusitadas de catarse coletiva.
JUSSARA — (afirmativa) — Sei! “A Teoria Done”. A imensa energia coletiva PSI recalcada, encontra nesses eventos uma maneira de extravasar-se. Milhões de PESSOAS em todo o planeta, sentindo-se violentadas por uma realidade social superlativamente sádica, sem condições de reagir de outra forma, provocam essas mostras de violência. Inconsciente. Catarse.
LIGIA — (questionando) — Mas..., isso faz sentido?
JUSSARA — (supostamente em dúvida) — Talvez. Os desarranjos físicos e mentais de milhões de pessoas premidas por circunstâncias adversas, usadas por políticos impunes, vítimas de gerações e gerações de poder econômico abusivo, encontram uma maneira de dizer BASTA!
LIGIA — (conformando-se) — Muita exclusão, muito abuso de poder. Muita impunidade. Muita concentração de renda. Muita corrupção. Muita mentira. Talvez essa teoria faça mesmo sentido.
JUSSARA — (afirmativamente contida) — Todas essas coisas criam um “Horizonte de Eventos”coletivo, quando buscam uma válvula de escape que não é permitida pelos poderes corporativos.
LIGIA — (crédula) — Muita Violência gera violência demais. A “lei de Jérsey”, dos Conselhos de “Etitica” dos políticos Tiriricas.
76. INTERIOR. DIA. RESTAURANTE DO JORNAL
ROSSI — (aponta a imagem na tela do DVD) — Veja as PESSOAS desta foto. A “Experiência de Filadélfia” teve tudo a vê com as experiências americanas de eugenia em conluio com a ciência genética nazista. Seus principais cientistas não sabiam disto. Inclusive Einstein.
CHEFE DE REDAÇÃO — (mostrando desinteresse) — Quem garante que essas informações possuem alguma autenticidade?
ROSSI — (calmo e imperturbável) — Os arquivos das fundações americanas envolvidas com pesquisa genética e eugenia, desde antes da crise de 1929. Os “Eugenical News” datam de 1924. A teoria, a prática e a legislação eugenista americana serviram de modelo para as aplicações desses princípios na Alemanha nazista.
CHEFE DE REDAÇÃO — (insistente) — O oficial de comando do pelotão da Gestapo, seus superiores na Alemanha, os próprios cientistas, ninguém estava sabendo das implicações científicas contidas na expedição que saiu da Amazônia em direção ao Reichstag. Naquele 21 de abril de 1944.
ROSSI — (calmamente enfático) — A Experiência no Estaleiro Naval da Filadélfia, em 28 de outubro de 1943, seis meses antes dos 25 soldados do Reich embarcarem no avião da Gestapo na Amazônia, está de acordo com os desdobramentos pós-guerra das pesquisas sobre o Campo Unificado de Einstein. A marinha norte-americana ainda hoje nega. Mas... Contra evidências inexistem argumentos.
CHEFE DE REDAÇÃO — (decisivamente negativo) — O que tenho em mãos ainda é insuficiente para tentar convencer o Conselho Deliberativo do jornal a investir numa expedição em direção a esse subterrâneo na Amazônia. E o confronto destas datas não ajuda em nada.
ROSSI — (interrogativo) — E a quantidade de helicópteros pousados nos heliportos da Avenida Paulista não são indicações suficientes de que estavam realmente equipados com tecnologia avançada de atualização da “Experiência Rainbow de Teletransporte”?
CHEFE DE REDAÇÃO (mostrando mais interesse no prato de feijoada):
— Ponha mais realidade nesse cardápio de ficção científica. E verei o que posso fazer.
77. INTERIOR. NOITE. APARTAMENTO DO JORNALISTA ROSSI
ROSSI senta-se na poltrona em frente à TV ligada num canal de notícias americano. O âncora do Jornal noturno mostra entrevistas com PESSOAS de diferentes nacionalidades. As entrevistas com legendas indicam:
TURISTAS que haviam anteriormente visitados diferentes cidades de outros países, tiveram a mesma sensação de terem sido teletransportados para lugares que haviam visitado quando em viagem de negócio ou recreação:
SR. YOU AN — (chinês) — Estive em Rio de Janeiro ano passado. E voltei lá no dia que o trânsito ficou muito estanho. Não sei como...
SRA. YI NEI SI — (esposa do sr. YOU AN) — Não sei como aconteceu. Ainda bem que não fiquei por lá. Duas vezes fomos assaltados (o sr. YOU AN bateu com o cotovelo na parte lombar esquerda da mulher, insinuando claramente que ela estava falando demais.)
WA LON DING YONG — (filho do casal) — Está certo. Eu e Sài Mã, levaram nossas câmeras digitais. Cristo Redentor, paisagem bonito, mas não quero voltar (fazendo movimento negativo com o braço direito e o dedo indicador levantado, a balançar de um para outro lado.)
78. INTERIOR. NOITE. APARTAMENTO. QUARTO DA FILHA DE ROSSI
Em frente à TV, JUSSARA vê a continuidade da reportagem da rede CNN americana. No programa “King Larry Live” da CNN, uma repórter de rua mostra flagrantes de entrevistas após os acontecimentos coletivamente traumáticos verificados também na Fifty Avenue:
MR. OLIVER JACKSON — (meio trêmulo) — Não consigo explicar como fui parar em Paris. Durante toda aquela confusão, não estávamos mais na Fifty Avenue, mas na Av. Champs-Élysées. Ainda agora não me recuperei daquela situação absolutamente inusitada.
MISS DAYSE KRISTAL — (exaltada) — Como aconteceu? Num instante e eu estava na “Via del Corso”em Roma. No outro momento estava de volta à Quinta Avenida...
KING LARRY LIVE — (sem conter a perplexidade) — A reportagem da CNN diretamente de Paris entrevista “on line” o casal Angeline Carole e Jean-Luc Alain.
Ele e Ela garantem ter estado, quase que simultaneamente, em dois lugares diversos, New York-Paris-New-York, separados pelo oceano Atlântico, em questão de segundos. (Jocosamente) — Acredite se quiser!
ANGELINE CAROLE — (pouco à vontade) — Muito ridículo dizer isso. Mas aconteceu comigo e o Alain. O automóvel estava parado na Champs-Élysée, próximo ao Arco do Triunfo, durante aquela terrível série de acontecimentos inacreditáveis que paralisou o trânsito da cidade. No momento seguinte estávamos em frente ao The Metropolitan Museum of Art em New York. Impressionante.
JEAN-LUC ALAIN — (hesitante) — Não acredito que isso aconteceu mesmo. Havíamos estado no Metropolitan no verão passado. Não foi nada agradável ter estado lá outra vez nessas condições inexplicáveis. Quem vai explicar essa coisa estranha? Mas que aconteceu mesmo. Com muitas outras pessoas com quem conversamos.
79. INTERIOR. RESIDÊNCIA DA FAMÍLIA DE VOLTAIRE. (CS)
VOLTAIRE — (falando para a mãe, LIGIA) — Se algo me acontecer, entregue este envelope para a JUSSARA...
LIGIA — (virando-se para JUSSARA) — Não faço a menor idéia do por que estava sentindo-se ameaçado.
LIGIA — (inquieta, mostra uma foto) — Veja. Há uma dúzia de PESSOAS, você reconhece alguém?
JUSSARA — (apontando o dedo) — AGASSIZ. Um cara vidrado nos mistérios da floresta. E em história. PhD em Antropologia. Na USP.
LIGIA — (introspectiva) — Ouvi falarem de uma cidade indígena. Perdida na floresta... Manoa.
JUSSARA — (como quem recorda) — AGASSIZ dizia: “Muitas pessoas que buscaram por cidades ditas desaparecidas na selva Amazônica, desapareceram. Manoa é uma delas.”
LIGIA — (entregando um envelope a JUSSARA) — Aconteceu sobrar uma mão, ou um pé de VOLTAIRE?
(Subitamente JUSSARA, assustada, desperta, sentando-se na cama, como se estivesse saindo de um pesadelo.)
80. INTERIOR. MANHÃ. QUARTO DE JUSSARA
(Jussara ausenta-se do quarto. Ele está vazio, mas o DVD do “Arquivo Jângal” continua a passar na tela do monitor.)
81. EXTERIOR. ANOITECER. “BUNKER”. ALEMANHA. II GUERRA MUNDIAL
(Em PG a câmera aproxima-se do monitor do micro, enquanto JUSSARA caminha em direção à porta de saída do quarto. A câmera fecha na dimensão da tela do monitor. — Na legenda eletrônica lê-se: Alemanha, Final Da II Grande Guerra.)
HITLER e EVA BRAUN são escoltados por oficiais da Gestapo em direção à saída do “bunker”. Do lado de fora um casal de atores, sósia de HITLER e EVA BRAUN, estão à espera de ser sacrificados em nome do Reich alemão.
Os casais sósias se cumprimentam. HITLER e EVA BRAUN dirigem-se de volta à entrada do “bunker”. O Führer alemão volta-se para olhar o SOLDADO SS com uma pistola lugher engatilhada, à espera da ordem de execução.
Galões de gasolina permanecem ao lado. O casal de atores, sósia de HITLER, EVA BRAUN, ajoelhado, à espera dos tiros, olha orgulhosamente o ditador que, antes de reentrar no “bunker”, faz a saudação nazi em direção a ele.
82. INTERIOR/EXTERIOR. “BUNKER”. AEROPORTO NA ALEMANHA
Uma limusine negra da Gestapo pára próximo a uma aeronave. A comitiva de oficiais SS embarca no avião, enquanto HITLER e a MULHER saem do carro e dirigem-se à escada da aeronave. Após tomarem assento, as hélices do avião começam a girar.
O piloto acerta as coordenadas. HITLER olha pela janela como se estivesse a ver os corpos do casal sósia em chamas próximo ao local de entrada do “bunker”.
As chamas sobem incinerando os corpos, enquanto o exército aliado invade Berlin.
83. INTERIOR. NOITE. APARTAMENTO DE ROSSI
JUSSARA aciona o ponteiro do mouse no ícone “impressora”. E começa a editar a primeira cópia do “Arquivo Jângal”.
Antes de sair do apartamento, ela escreve um bilhete para o pai, o jornalista ROSSI, prende com um clipes a folha na primeira página da primeira cópia do “Arquivo Jângal”, subscrevendo-o:
“O arquivo começa com a narração do assassinato do jornalista alemão Karl Albert Brugger numa calçada da praia de Ipanema em 1984. Ele fazia reportagens para a revista “Der Spiegel” sobre um mosteiro subterrâneo na Amazônia para onde se dirigiam contingentes de soldados da Wermacht em busca de adquirir e transferir tecnologia extraterrestre avançada para uso do exército alemão do III Reich."
"Esses contingentes sob comando, comunicação e controle de oficiais da Gestapo, desembarcavam num aeroporto ultra-secreto na selva Amazônica. Anos antes de ser detonado o II Conflito Mundial.”
“Leia e segure a onda. Não se surpreenda. Se for capaz.” — JU.
84. INTERIOR. DIA. SALA. APARTAMENTO
FRED — (criança, chama a atenção do coleguinha BETO para o programa de TV) — A galeguinha começa a se despedir das crianças jogando beijinhos e dizendo “tchau-tchau”. Pela boca da MULHER começa a sair uma enxurrada de produtos comestíveis e brinquedos que se acumulam no interior da sala onde se encontram as crianças.
As CRIANÇAS correm em direção ao quarto onde a babá vê TV com outras CRIANÇAS. A MULHER do “talk-show” infantil estica o pescoço (como se fosse de borracha) em direção a elas e, abrindo a bocarra risonha vomita fartamente, enchendo o ambiente de uma gosma colorida da onde se sobressaem bonecas e bonecos semoventes.
Assustados e chamuscados pela gosma a cores eles correm em direção à porta de saída do apartamento.
85. EXTERIOR. DIA. PLAY-GROUND DO PRÉDIO. ÁREA DE RECREIO. (CS)
(MÃES conversam enquanto seus filhos e filhas brincam na área)
1ª MULHER — (mostrando-se intrigada) — Está acontecendo com o Jr. também?
2ª MULHER — (afirmativa) — É sintoma de que estão ficando mais exigentes.
3ª MULHER — (introspectiva) — Toda aquela festividade fabricada não estava mais do agrado de ninguém.
1ª MULHER — (confirmando) — Há muito não faz mais sentido para elas (CRIANÇAS).
4ª MULHER — (opinativa) — A CECI e o LULU, filhos da LUIZA estão ali (aponta) trocando ideias sobre personagens de contos de fadas. Pode? Na idade deles? Não é muita precocidade?
2ª MULHER — (em tom de censura velada) — Mal acreditei quando vi o KIKO e a PRATA trocando ideias sobre “O Conde de Monte Cristo”. E a MARY LUCY pondo fogo na conversa. Nem pareciam CRIANÇAS.
5ª MULHER — (entrando na conversa) — Donos de TV não têm o menor interesse em fornecer uma programação que acompanhe a evolução da cabeça delas. Elas estão percebendo o mundo de maneira mais inteligente.
3ª MULHER — (parecendo pensativa) — O mundo deles parece outro. Assim como suas necessidades. Esses novos heróis tipo Wolverine e os X-Men estão tornando esses meninos muito agressivos demais.
1ª MULHER — (em dúvida) — Alienação e agressividade não são condicionamentos adequados à educação deles. Os desenhos animados estão cheios disso.
2ª MULHER — (conformada) — De qualquer forma é o que eles têm. Distrai.
4ª MULHER — (concordando) — Essas influências educam mais do que os professores mal pagos das escolas. Por quem não têm o menor respeito.
5ª MULHER — (“não tô nem aí”) — A mente deles está em franca ebulição. Nossa proximidade parece incômoda. Quando conversam não querem adultos por perto.
86. INTERIOR. NOITE. QUARTOS. SALAS. APARTAMENTOS...
Carla aciona algumas vezes o controle remoto da TV. Em vários canais estão presentes imagens e comentários sobre os acontecimentos de estranha violência na Avenida Paulista e adjacências.
A câmera flagra a mesma atitude de muitas pessoas, acionando em salas, quartos de hotéis, apartamentos, bares, restaurantes e residências, via controle remoto, imagens de comentários TVvisivos sobre os inexplicáveis acontecimentos nas principais avenidas de grandes cidades globalizadas pelos eventos semelhantes.
87. INTERIOR. NOITE. QUARTO
CARLA contempla-se no espelho da parede ao lado da cama. À direita deste, um grande calendário-poster, propaganda da livraria Cultura. Os cabelos ainda úmidos. Ela passa o secador enquanto os penteia.
CARLA percebe mudanças quânticas, mínimas, que parecem estar reconfigurando seu rosto, transfigurando-o em personas de PESSOAS que ela conhece, com quem convive e trabalha.
CARLA sente-se curiosa e intranquila. Fixa-se nas mínimas mudanças que, de modo muito tênue estão a se processar na aparência de seu corpo. De suas faces.
88. INTERIOR/EXTERIOR. AMANHECER. QUARTO. RUAS DA CIDADE
CARLA desperta com o secador ainda ligado. Percebe mechas do cabelo chamuscadas. Parte do rosto mostra sinais de queimadura. Aplica-se um unguento de picrato de butambeno. Rabisca um bilhete para o pai, HELIO.
Escreve que vai chegar na firma fora do horário. Ela sai a caminhar nas ruas da cidade que amanhece. A sensação de que está vendo tudo pela primeira vez: PESSOAS, prédios, movimentação de carros, ruas.
89. INTERIOR. DIA. REDAÇÃO DO JORNAL
ROSSI chega à redação. Posiciona cópia do “Arquivo Jângal” na mesa do chefe de redação. Na mesa redonda onde vai haver uma reunião do Conselho Deliberativo e Editorial do Jornal, ele deposita cópias do mesmo “Arquivo Jângal” frente aos assentos, sobre a mesa.
(ROSSI atende ao telefone celular, enquanto sai apressado da sala de reunião ainda vazia):
— Isso mesmo. Esta é a notícia que eu queria ouvir. Então há uma possibilidade?
90. INTERIOR/EXTERIOR. DIA. IGREJA
Os fiéis estão atentos às palavras do discurso do Pastor MCKENZIE:
MCKENZIE — (narrativo) — Desde tempo antigos Ele livra seu povo da ameaça de inimigos cheios de recursos. Exerce a misericórdia entre os que se mantêm no caminho.
MCKENZIE — (expositivo) — STO. AGOSTINHO dizia que o Novo Testamento está contido no Velho Testamento. Cada profeta e cerimônia anunciam CRISTO no pai ADÃO, progenitor dos santos. No mártir ABEL. Em ENOCH e NOÉ, renovadores do Verbo. Em MELQUISEDEQUE, ISAAC, em JOSÉ, tradutor dos sonhos do FARAÓ.
MCKENZIE — (id. professoral) — Um doador de leis em MOISÉS. Sofredor e abandonado em JÓ. Odiado e torturado na maioria dos profetas...
91. INTERIOR. DIA. TEMPLO
A câmera em PG detém-se, por segundos, na família de HELIO: SHEILA, CARLA E EDUARDO. A ansiedade deles estampada nos rostos e também na expressão facial destes e daqueles ouvintes. E logo o discurso começa a justificar a atenção geral dos fiéis.
MCKENZIE — (compassivo) — Quem é joio? Quem é trigo? Os corações e as mentes estão assimilados, globalizados. Fixados pelo consumismo. A alma coletiva satanizada pela ganância. Pelo querer ter. Ter mais. E mais. Sempre.
92. INTERIOR/EXTERIOR. DIA. HOSPITAIS PÚBLICOS E PRIVADOS. SALAS DE PARTO. BERÇÁRIO
(Enquanto o pastor destila as palavras do sermão, a câmera passeia entre as macas das enfermarias dos hospitais onde estão mulheres abortivas e outras, no repouso aborto.)
MCKENZIE — (explicativo) — Quem não quer mais dinheiro? Quantas mulheres não desejam parir apenas para usar o filho enquanto instrumento de exploração do pai? A pensão do filho é uma forma de salário. Ou não?
MCKENZIE — (incisivo) — A concentração de renda aumenta cada dia mais. E mais. À proporção que aumentam os escravos, os necessitados, os candidatos a pagodeiros, e as galeras sempre dispostas a topar tudo por dinheiro.
— O poder das multinacionais é totalitário. Os esquemas de corrupção e impunidade funcionam apenas para os muito ricos. Os que têm condições de pagar bons advogados e comprar os juízes dos supremos tribunais. Quem não está disponível para ser cooptado?
93. INTERIOR. HOSPITAL. BERÇÁRIO
(Enquanto a câmera passeia entre os berços vazios que seriam ocupados por recém-nascidos, ouve-se os apelos discursivos do pastor.)
MCKENZIE — (profético) — Feliz o ouvinte se observar as coisas que estão sendo ditas. Porque o tempo, este, está chegado. A “amblose disforme” não é para ser temida. Ao contrário, é a maneira da sabedoria divina dizer: BASTA!
MCKENZIE — (solicita) — Levantem-se as MULHERES presentes ao culto, as que abortaram em decorrência do vírus da “amblose disforme”.
(Dezenas de mulheres ficaram em pé, atendendo a solicitação do pastor.)
MCKENZIE — (interpretativo) — A ciência a quase tudo explica. Mas, mesmo no atual estágio de seu desenvolvimento, não há explicação para muitas coisas que aconteceram, acontecem e, principalmente, para as que estão em vias de acontecer. Porque cada ente consciente, desde o nascimento, é mais cinzas do que chamas. Para os olhos Dele (apontando para o alto) a raça humana atingiu o merecimento da inexistência pela exacerbada imperfeição.
MCKENZIE — (didático) — Como não pode ser conduzida à ordem, resta-lhe a extinção. A fêmea humana não mais possui o dote natural de gerar descendência.
94. INTERIOR/EXTERIOR. DIA. IGREJA. (CLOSE-UP. PP. PA. PG. CA)
(PESSOAS saindo do culto dominical. A câmera surpreende alguns rostos. Ora em CLOSE-UP, ora em PP, PA, PG Afastando-se a câmera, gradativamente, até fixar-se em CA.)
(Enquanto saem da Igreja, a voz de MCKENZIE continua ecoando no subconsciente delas):
MCKENZIE — (persuasivo) — Os interesses dos mortos administram o planeta. A mesma compulsão pré-histórica, que dominava a mente reptílica, o sistema límbico, hoje exerce comando, comunicação, controle sobre o neo-córtex. Os seres ditos humanos estão sob a dominação da compulsão do complexo reptílico industrial-militar, da demagogia e da ambição luciferina do REICH DOS MIL ANOS. Do REICH DOS MIL BANQUEIROS...
95. INTERIOR/EXTERIOR. DIA. CARROS. RUAS, PRAIAS. AVENIDAS
A câmera se detém no interior do carro de HELIO. Eles estão sob o efeito hipnótico do discurso profético, religioso, do Pastor MCKENZIE.
CARLA — (em off) — “As PESSOAS, todas as PESSOAS, transformadas em tropas de choque de LÚCIFER. Em todos os lugares do planeta. Milhares de milênios de suposta evolução, e o Homo Sapiens continua pastando no mesmo lugar Demens.”
Os pensamentos de CARLA parecem ecoar nas mentes de seus familiares (PAI, MÃE, IRMÃO). Olham-se de soslaio. Se faz presente um certo ressentimento. Mútuo.
96. INTERIOR. DIA. QUARTO. APARTAMENTO
As DOMÉSTICAS que fazem a limpeza doméstica no quarto de SABRINA levam as mãos aos ouvidos. Ato contínuo, saem do quarto apressadamente.
97. INTERIOR. DIA. APARTAMENTO. SALA DE JANTAR
Crianças sintonizam a TV no canal-10. A BABÁ reclama, amuada, de que estava a assistir a programação da Record, onde um trio de apresentadores, trocam prosa e banalidades sobre amenidades de personagens famosos e suas banalidades, tipo: “FULANA foi vista com BELTRANO na festa de casamento do casal SICRANO”.
As DOMÉSTICAS que haviam saído do quarto de SABRINA estranham a mudança de canal, sem que o controle remoto fosse acionado pelas CRIANÇAS.
A câmera focaliza ora uma, ora outra CRIANÇA em Plano Subjetivo (PS). Elas esboçam apenas um quase imperceptível mover de cantos das bocas, enquanto olham o “filme do dia”.
98. INTERIOR. TARDE. ENTARDECER. NOITE. SALAS DE ESTAR. QUARTOS DE MOTEIS, PADARIAS, BARES. LOCAIS ONDE HÁ UMA TV
(A câmera focaliza a decepção das PESSOAS. Elas tentam inutilmente mudar de canal, sintonizar em programas que costumam visualizar. Não conseguem. Nos monitores de TV aparecem apenas os chuviscos eletrônicos. O único canal de TV que conseguem sintonizar é o canal-10. E seus filmes “full-time”.)
PESSOAS leem os jornais impressos noticiam o impasse dos departamentos de propaganda e publicidade que somam altos prejuízos por não conseguirem posicionar nos monitores das telinhas suas programações. Consequentemente, não estão faturando os comerciais. As empresas de PP&RP sentem-se ameaçadas. A beira da falência.
A imprensa impressa denomina o único canal de TV que os espectadores conseguem sintonizar de “Ghost-TV”. A TV-Fantasma está impedindo os outros canais de ser sintonizados? Há um grande clima de apreensão por parte dos diretores e acionistas dos grandes conglomerados de TV.
99. INTERIOR. NOITE. CONVENÇÃO DE AGÊNCIAS DE PP&RP. RESTAURANTE DO HOTEL MAKSOUD PLAZA. SÃO PAULO
DIANE — (uma funcionária, comenta) — Ninguém parece estar interessado nos outros canais de TV.
CARLA — (fazendo anotações) — Sim, os filmes fantasmas. A TV “full-time”...
RICARDO — (executivo, cheio de razão) — Estou dizendo, há excesso de explosões solares. Elas estão causando esses problemas de sintonia. Tudo está voltando à normalidade. Todos os canais voltaram à sintonia normal.
RUBENS — (executivo, apreensivo) — Pensei em mudar de profissão. Ser técnico em eletrônica. Todos os aparelhos de TV pareciam em pane.
RAQUEL — (confirmando) — A Associação das Senhoras Plugadas Em Novelas superlotaram os ramais de reclamação dos conglomerados de TV.
CARLA — (introspectiva) — Os barões dos conglomerados de TV ficaram apavorados. Muitos foram internados. No Brasil, três deles morreram de AVC.
RUBENS — (relaxando) — Isso é que é “Pânico na TV”. E o bicho ainda está pegando.
RAQUEL — (intrigada) — Crianças e adolescentes parecem saber o que está acontecendo. Há teorias, adolescentes e crianças participaram, de algum modo, das interferências. E dos eventos de superviolência no trânsito.
RICARDO — (irritado) — Isso é bobagem. Não acredito. Conta outra.
CARLA — (buscando conciliar) — Verdade. Todos parecemos, uns mais, outros menos, estar participando dessa espécie de empatia globalizada pelas ondas emitidas pelas transmissões da TV-Ghost. E quase todos somente veem a TV-Fantasma.
RUBENS — (interrogativo) — É complicado. Sei não! Ninguém parece saber o que está acontecendo na realidade. É tudo palpite. A TV-Virtual é como o satélite artificial invisível, ela existe, mais ninguém sabe explicá-la.
(A câmera focaliza os rostos, agora indiferentes, dos participantes da mesa. Algumas PESSOAS sentem a sensação de que estão distanciadas das demais.)
100. INTERIOR. NOITE. SALA DO HOSPITAL DAS CLÍNICAS. SÃO PAULO
(A reportagem do JN prepara-se para entrevistar o dr. TROJAN, infectologista, chefe do plantão noturno do Hospital das Clínicas.)
REPÓRTER — (tenta parecer o mais sem emoção possível) — Dr. TROJAN, qual a explicação científica para essa nova série de infecções motivadas por mutações do vírus H3V?
101. INTERIOR. NOITE. SALAS DE JANTAR E OUTROS AMBIENTES PÚBLICOS E PRIVADOS ONDE PESSOAS ESTÃO A ASSISTIR O JORNAL NACIONAL
(A câmera mostra o dr. TROJAN nos monitores de TV)
DR. TROJAN — (com franqueza) — Não apenas do H3V. As mutações estão ocorrendo com outros segmentos viróticos tipo LULFHC.
REPORTER — (curioso) — Há realmente um campo magnético nas mutações viróticas? Propício à somatização e a indução dos infectados à aceitação da doença? E as mudanças drásticas de comportamento agressivo?
DR. TROJAN (com convicção) — Ainda não é uma teoria reconhecida pela ciência médica. As variantes PT e PMDB do vírus H3V ferra os infectados com manchas na pele de coloração rosácea e avermelhada.
(A câmera focaliza as faces das crianças e adolescentes que observam os adultos com leves, quase imperceptíveis, movimentos nos cantos das bocas.)
102. INTERIOR. ENTARDECER. LUXUOSO SALÃO DE BELEZA NO JARDIM AMÉRICA. SÃO PAULO
(A clínica de beleza é especializada em usar cosméticos especiais para camuflar cada tipo de mutação virótica do H3V: tipo PMDB, PUF. COLL, e outras.)
103. INTERIOR. NOIE. SALA DE ESTAR
Na TV uma família está a assistir no Jornal da Globo, a continuação da entrevista com o DR. TROJAN.
REPÓRTER — (intrigado) — É como se cada infectado estivesse sendo marcado como gado? Os novos medicamentos são os mesmos para todas as variantes?
DR. TROJAN — (explicativo) — As vítimas passam entre doze e quinze meses perdendo a noção do tempo. E a competência orgânica. A impressão é essa. Cada marca de infecção difere dos efeitos. Há um “coquetel” para cada variante virótica.
104. INTERIOR. DIA. SALA DE REUNIÃO. JORNAL
Ao redor da mesa, alguns JORNALISTAS do Conselho Executivo do jornal, debatem a participação do mesmo na “Expedição Norton”. Uma tela de TV transmite o “ghost-movie” do dia.
1° JORNALISTA — Vale o esforço de buscar respostas quando mais ninguém parece ter uma resposta coerente. (Virando-se para a REPÓRTER ao lado de NORTON) — Essa é a fotógrafa Adriane Tauil. ROSSI e ela representam o jornal na “Expedição”.
2° JORNALISTA — No momento não há consenso. Ninguém sabe ao certo de onde provêm as imagens da TV-Full-Time.
ADRIANE — O mundo globalizado está uma babel. Todos opinam. Mas não há consenso sobre os eventos em lugar algum. Do mundo globalizado.
ROSSI — Mesmo nos meios científicos. (Ele aperta um botão no controle remoto) — Este é o “filme do dia” de ontem, da TV-Virtual.
105. INTERIOR. DIA. SALA DE REUNIÃO DO JORNAL
(A câmera focalizada no filme do dia da TV-Virtual, afasta-se da imagem da tela em ZOOM, até fixar em PG a cena da sala de reunião que corresponde à mesma cena vista no monitor da TV.)
ROSSI — Um crítico dos “Cahiers du Cinéma” divulgou ontem num canal de televisão francesa, que a TV-Fantasma divulga em seus filmes, estilos de cineastas europeus do século passado.
2° JORNALISTA — Fellini, Antonioni, Chabrol, Visconti, Fassbinder, Pasolini, Greenaway, Rosseline, Lang, Truffaut, Godard, Losey, Rivette, Resnais, Wenders, Buñuel...
ADRIANE — As opiniões divergem. Um ex-cineasta e crítico de amenidades da política nacional, no JN de ontem afirmou que os últimos cult-movies da TV-Ghost reproduzem o estilo, “desse gênio maior de Hollywood (sic) que foi Samuel Fuller”.
ROSSI — (irônico) — Muita areia demais para meu caminhãozinho...
1° JORNALISTA — (muito afirmativo) — Esses filmes têm duração de um dia. Todo dia um filme diferente. Nem todos os banqueiros fantasmas associados a diretores europeus e hollywoodinos, poderiam estar por trás dessas produções. Não há grana em estúdio nenhum do mundo que possa bancar produções de filmes de 24 horas. Sem intervalo comercial.
ROSSI — (argumentativo) — Não vamos chegar a lugar nenhum reproduzindo opiniões, as mais diversas sobre o que é e de onde vêm as produções de imagens da TV-Fantasma. Daí o investimento deste jornal na investigação dos indícios de que há uma central de transmissão eletromagnética proveniente da Amazônia. De acordo com o “Arquivo Jângal”.
106. INTERIOR. DIA. SALA DE REUNIÃO. HOTEL HILTON. SÃO PAULO
(Executivos de vários países, associados via interesses de conglomerados de TV em todo o mundo globalizado, estão reunidos numa sala com seus “lap-tops”, “iPods”, , equipamentos eletrônicos de vídeo-transmissão de última geração, comunicam-se entre si via “translators”, secretárias-acompanhantes, equipagem de vídeo-conferências.)
Vários idiomas estão sendo falados simultaneamente. A Babel de línguas. A traduzir diversidades de interesses semelhantes, se faz ver e ouvir como se a representação de um grande e impertinente zumbido eletrônico que a todos envolve. Via satélite.
107. INTERIOR/EXTERIOR. ANOITECER. LOCAIS PÚBLICOS E PRIVADOS. SALAS DE ESTAR DE APARTAMENTOS. VITRINES DE LOJAS EM SHOPPINGS
Enquanto a câmera perpassa as faces voltadas (com curiosidade inusitada) para os monitores das Tvs, alguns espectadores se olham (CS) visualizando a perplexidade de estar vivos e ao mesmo tempo presenciando esses fenômenos, que, por serem inexplicáveis, aumentam, cada dia mais o medo. Pessoal. E coletivo da sociedade. Globalizada.
108. INTERIOR/EXTERIOR. ANOITECER. LOCAIS PÚBLICOS E PRIVADOS. SALAS DE ESTAR DE APARTAMENTOS. VITRINES DE LOJAS EM SHOPPINGS
(A câmera faz, com o monitor de TV, um contraponto com o rosto de um TVespectador concentrado, excessivamente atento à reportagem do JN):
APRESENTADOR DO PROGRAMA — A nossa reportagem entrevistou em Londres, o físico STEVE TALKING (câmera mostra o físico Nobel falando):
REPÓRTER JG (de Londres) — O senhor teria uma explicação científica para a realidade inusitada da TV-Virtual?
STEVE TALKING — (professoral) — A transmissão da TV-Virtual parece estar de acordo com padrões de transmissão a partir de raios lasers gravitacionais. A única parte da teoria da relatividade de Einstein que ainda não havia sido testada. É um fenômeno similar aos efeitos mal-sucedidos da Experiência de Filadélfia, quando a marinha americana tornou invisível um destróier durante a II Guerra Mundial.
REPÓRTER — Há uma estação orbital a partir da qual esses raios estão sendo emitidos?
STEVE TALKING — Se for comprovada a existência dessa estação orbital, ela possivelmente é monitorada por uma civilização que domina tecnologias de controle de energias gigantescas. Tipo as emitidas por buracos negros e estrelas de nêutrons.
109. INTERIOR/EXTERIOR. ANOITECER. LOCAIS PÚBLICOS E PRIVADOS. SALAS DE ESTAR DE APARTAMENTOS. VITRINES DE LOJAS EM SHOPPINGS
(Câmera focaliza a atenção de outros espectadores, de um segundo canal de TV, que está a retransmitir de Londres uma entrevista, em inglês, traduzida via legenda eletrônica, do mesmo cientista, para a BBC):
REPORTER DA TV-BBC OUVE RESPOSTA DE STEVE TALKING — Os raios gravitacionais geram efeitos interdimencionais de deslocamento da luz atmosférica ionizada. Como essa transmissão é efetuada?
— Talvez a TV-Virtual seja uma estação de retransmissão em sintonia quântica direcionada via raios laser. Muito além da compreensão no atual estágio de desenvolvimento científico deste planeta.
110. INTERIOR/EXTERIOR. ANOITECER. LOCAIS PÚBLICOS E PRIVADOS. SALAS DE ESTAR DE APARTAMENTOS. VITRINES DE LOJAS EM SHOPPINGS
(A câmera desloca-se da imagem da TV para os rostos surpreendentemente atentos de uma dezena de frequentadores de um restaurante no bairro dos Jardins, na rua Pamplona.)
WANDO PERSON JR. (PhD em Física quântica) — Toda a realidade existente em qualquer lugar depende de uma série de combinações entre matéria e energia. Em diferentes graus de densidade e complexidade. Cada manifestação, em cada uma dimensão (existem, possivelmente, 26 dimensões no continuum espaçotempo) possui um certo conjunto de princípios envolvendo esse contínuum...
REPÓRTER — comente a teoria de que os casos de Combustão Humana Espontânea (CHE), são ocasionados por seres de outra dimensão querendo se instalar em corpos humanos. Há algo de verdade, ou é apenas especulação sem base científica?
DR. WANDO PERSON JR. — “A Experiência de Filadélfia” abriu um portal para outra dimensão. Seres que migram dessa dimensão, teoricamente, para se estabelecerem em corpos humanos, não encontram a congruência quântico-molecular. A radiação resultante dessas tentativas de interação eletromagnética entre esses seres de outra dimensão e os seres humanos, resulta numa espécie de encontro quântico entre átomos de matéria e de anti-matéria. Provocando a mútua desintegração.
REPÓRTER — É científico? Ou ficção científica?
DR. WANDO PERSON JR. — Essa, uma possibilidade de explicar de forma coerente o fenômeno CHE. Nada provado cientificamente.
111. INTERIOR. NOITE. APARTAMENTO. SALA DE JANTAR. (CS)
(Um casal de ADOLESCENTES entra na sala de estar onde um casal de adultos está a dormir no sofá. O monitor da TV está sintonizado no Canal-Virtual, “Efeito 10”.)
1° ADOLESCENTE — (A moça emite um código de sons. Imitam os zumbidos de abelhas. Enquanto fixa o olhar em direção ao namorado. Os cantos da boca levemente se contraem. Há silêncio, porém ele ouve nitidamente as palavras na mente, como se estivessem sendo verbalizadas) — “Você também lê os sonhos deles? São permeados de imagens de medo e horror”.
2° ADOLESCENTE — (O rapaz responde, o olhar fixo e os cantos da boca se contraem de modo quase imperceptível, enquanto emite os zumbidos de resposta) — “Mediados por sentimentos de culpa. Eles não sabem nem podem interferir na realidade. Vão aceitando tudo e todas as coisas como se fossem seres virtuais, sem nenhum mínimo controle sobre os fatos”.
1° ADOLESCENTE — (zumbidos) — Os culpados por esse descontrole são os outros. Ou outros. Sempre são os outros.
2° ADOLESCENTE — (zumbidos) — Os outros são eles. Cada um deles. Eles convivem com os outros. Milhares deles. Como se fossem personagens dos múltiplos filmes e novelas da TV.)
— 1° ADOLESCENTE — (zumbidos) A mesma patologia coletiva manifesta.
112. INTERIOR. NOITE. APARTAMENTO. SALA DE JANTAR. (CS)
(O casal de adultos ameaça despertar, mas os zunidos em suas mentes parece fazê-los adormecer sob o fluxo sussurrante do ruído sibilante da nova patologia.)
(A câmera focaliza o monitor da TV que transmite as notícias do JG:
ÂNCORA DO JG — “Há poucos minutos a NASA divulgou a notícia de que há indícios de um estação receptora subterrânea de sinais da Estação Orbital Interdimensional na Amazônia...).
113. EXTERIOR. DIA. PÁTIO DE PLAY-GROUND
(A câmera focaliza grupo de CRIANÇAS que se comunicam através de uma linguagem de pronúncia muito rápida das palavras. A articulação de sons das letras, sílabas e palavras soa semelhante a zumbidos. Quatro delas se destacam dos grupos que brincam no play-ground e se dirigem ao elevador social, após saírem do pátio.)
114. INTERIOR. DIA. SALA DE TRABALHO. ESCRITORIO
(HELIO aproxima-se da sala onde trabalha CARLA. Senta-se frente a ela e começa um diálogo que resvala para uma tonalidade pouco amigável.)
CARLA — (com certo menosprezo) — Dá um tempo, pai. Não vou vender minha alma para esses reacionários luciferinos em troca de favores para sua aposentadoria aumentar de valor.
HELIO — ("cheio de razão") — Aumentar? Duplicar, você quer dizer. Ética não dá camisa a ninguém, Carla. O sistema capitalista é selvagem por natureza. Nele o que conta é o fator econômico. O fator econômico está acima de tudo e de todas as regras, princípios, ética, religião, o que for. Você lembra do ex-presidente Analfabeto?
CARLA — (afirmativa) — Ele se notabilizou pela capacidade discursiva elogiosa a todos os esquemas de corrupção no país. E saiu da presidência com um índice recorde de apoio popular. Não vou impedir que seus interesses se mantenham vivos na empresa. A Adélia vai me substituir.
HELIO — (querendo negociar) Você saindo da firma minha posição administrativa fica desfalcada. Reconsidere, por favor. Mesmo porque o mercado está escasso de ofertas de trabalho.
CARLA — (decisiva) — Minha decisão é irreversível. Por favor, não insista. (HELIO levanta-se e sai da sala sob o olhar da filha, CARLA.)
(CARLA olhando o pai afastar-se, comenta de si para consigo):
— “Esse agente familiar de uma educação e de uma cultura voltadas para a diluição de qualquer princípio ético. Que tipo de sociedade poderá estar em gestação no inconsciente familiar voltado para o incremento implacável de interesses coletivos os mais escusos?".
115. EXTERIOR. NOITE. RIO E PÂNTANO. ILHA
(Uma jovem no dorso de um crocodilo atravessa a margem de um rio de águas escuras em direção a uma ilha. Um eclipse lunar se desenha no alto. O réptil com oitenta dentes alveolados, de enorme força mandibular, poderia simplesmente esmagar o corpo de CARLA com sua mordida de uma tonelada. Mas ela simplesmente salta de seu perigoso lombo às margens do rio e dirige-se ao interior da ilha.)
116. EXTERIOR. NOITE. LUAR. ILHA
(CARLA observa em meio à grama, numa clareira, um estranho e belo animal a pastar. Os pelos brancos brilham ao luar. A sombra do eclipse começa a escurecer o ambiente selvático. CARLA olha o pai, HELIO, do outro lado do rio. Ela insiste em chamá-lo, suplica que não tenha medo, que monte no lombo de um dos inúmeros crocodilos que parecem estacionados à beira da outra margem do rio à espera de fornecer uma carona até a ilha, do outro lado.
Mas HELIO está em dúvida, tanto hesita que fica, de uma vez por todas, paralisado pelo temor. Ele ignora a oportunidade que esse momento mágico oferece. Ele tem olhos apenas para a aparência hostil e inóspita do réptil. HELIO não sente o momento enquanto uma oportunidade. (E o crocodilo aproxima-se veloz em sua direção com a bocarra aberta.) Apavorado ele desperta do pesadelo.
117. EXTERIOR. NOITE. RUAS. CALÇADAS. PRAIAS. AVENIDAS
(A câmera flagra pessoas sendo assaltadas enquanto veem mercadorias em exposição nas ofertas das vitrines das lojas de varejo com produtos eletrodomésticos. Um assaltante ataca a coronhadas um transeunte, enquanto lhe subtrai violentamente o “blaiser” com alguns de seus pertences pessoais. No monitor de várias TVs sintonizadas no Canal-10, vê-se cena semelhante no “full-time-movie” do dia.)
118. INTERIOR. NOITE. APARTAMENTOS. SALAS DE ESTAR
Pessoas veem nos monitores de TVs ligados no Canal-10 (“Effect-TV”), cenas que são reproduções de acontecimentos violentos de rua. Causa a impressão nos espectadores, que as cenas dos filmes da TV-fantasma, estão a reproduzir as situações cotidianas da violência de rua de que são vítimas as pessoas, cada vez mais amiúde.
Outras pessoas comentam que a “TV-Ghost” antecipa tais acontecimentos.
119. EXTERIOR. NOITE. “POINTS” DA CIDADE DE SÃO PAULO
A câmera migra de um para outro, focalizando por momentos a movimentação ambiental de alguns pontos de encontro, bares e restaurantes, em locais de badalação social da cidade. Uma longa série de acontecimentos onde se acha presente a manifestação da violência urbana, cada vez mais gratuita, são objetos de observação.
(Em off ouve-se locutores de rádio e jornais Tvvisivos narrando acontecimentos policiais promovidos pela gang do marginal conhecido popularmente pela alcunha de “A FÚRIA”.)
A câmera aproxima-se de uma mesa de calçada em PG, e flagra uma conversa entre PESSOAS que trocam impressões sobre os acontecimentos:
1° FREGUÊS HABITUAL DO BAR — Por que a polícia nunca consegue prender “A FÚRIA”?
2° FREGUÊS HABITUAL DO BAR — A FERA poderia falar demais. Revelar os esquemas policiais nos quais está inserido. Muitos oficiais da polícia, civil e militar, estariam comprometidos.
1° ACOMPANHANTE HABITUAL DO BAR — A FERA estaria infectada pela variante mais letal do H3V, a LUL-COLL, que com o PUF aumenta a ira e o furor dos infectados.
2° ACOMPANHANTE HABITUAL DO BAR — O filme de hoje da “TV-Full-Time” mostrou a violência incontrolável dos infectados pertencentes à gang da FERA. E as tentativas inúteis dos esquemas policiais em prendê-la.
120. INTERIOR. DIA. SALA DE REUNIÃO DE EMPRESA
HELIO e a filha CARLA estão sozinhos na sala de reunião. Ele deseja convidá-la a almoçar. Mas, ao contrário de dizer isto a ela, entra sempre em outros assuntos. Ele quer dizer que deseja diminuir a distância entre pai e filha, mas não consegue:
HELIO vê a filha sair da sala de reunião e, de coração aflito, comenta de si para consigo: “Eu queria apenas almoçar com ela”.
121. EXTERIOR/INTERIOR. DIA. PATIO INTERNO DO COLEGIO DANTE ALIGHERI EM SÃO PAULO
Um zelador de disciplina (monitor) do colégio Dante está, furtivamente, gravando a conversa de um grupo de adolescentes.
Ele é observado por uma jovem que, ao passar por ele, nota a intenção do mesmo na proximidade do grupo. E avisa os colegas de que estão sendo gravados.
122. INTERIOR/EXTERIOR. DIA. PATIO INTERNO DO COLEGIO E SALA DO DIRETOR
O monitor entrega um aluno a outro diretor de disciplina que o conduz à sala do diretor onde começa a ser pressionado a falar sobre algo.
123. INTERIOR/EXTERIOR. DIA. PATIO DO COLEGIO EXTERNO DANTE E SALA DO DIRETOR
A jovem que há pouco se aproximava do grupo de colegas, diz:
— A conversa está sendo gravada. Vocês estão falando em linguagem comum, zeenoshri, pelllinngfressshhhisthonn.
— Hossshissthillhunddss. Zhonsnsnsnkhissyt. — Os estudantes sibilam entre si. Começam a se comunicar através de zunidos.
(As faces transmitem aquela mesma expressão de absoluta isenção sensitiva. Os cantos das bocas movem-se quase que imperceptivelmente.)
124. INTERIOR. DIA. SALA DO DIRETOR
(A criança na sala é pressionada a falar sob ameaça do diretor de chamar seus pais. As ameaças vão num crescendo até dizer que pode ser expulsa do colégio. A criança concentra-se fixando os olhos no olhar ameaçador do adulto. A menina emite um zunido quase inaudível.
O diretor leva as mãos aos ouvidos. Protege-se de algo que não vê mas causa grande incômodo mental. O nariz do homem começa a sangrar, e a poltrona de rodas desliza em direção à janela. Seus olhos estão excessivamente irritados e vermelhos. Os cantos da boca da menina se deslocam levemente para os lados.)
125. EXTERIOR. NOITE. AEROPORTO DE GUARULHOS
ROSSI e ADRIANE aguardam o voo para Cuiabá conversando na mesa da lanchonete:
ADRIANE — (indagativa) — Esse NORTON, qual é a dele? Sinto que ele não é nem um pouco confiável. Apesar da aparência em contrário.
ROSSI — (reservado) — O cara é aventureiro. Por trás dele há, talvez, a CIA, o Departamento de Estado americano. Vai saber? Aparentemente deseja explorar uma cidade dita subterrânea. E voltar para contar a proeza.
ADRIANE — (sorrindo) — Você acredita mesmo nesse folclore de cidade perdida? Expedições que sumiram na selva?
ROSSI — (sorrindo também) — Vai saber ao certo?! Sair da rotina para mim já é motivação considerável.
ADRIANE — (curiosa) — Por que um jornalista, uma fotografa brasileira? Que garantia temos? Nessa Expedição há algo muito nebuloso.
ROSSI — (com ironia) — Você tem algo melhor para fazer? Montanhismo também não tem garantias. Quem alpinista sabe ao certo se vai voltar numa excursão pelo K2, ou em direção ao cimo do Everest? Que tempo vai fazer? Haverá avalanches? A vida é incerta. Você gosta de uma aventurazinha, não é?
126. EXTERIOR. DIA. ESTADO DE MATO GROSSO. ÁREA LIMITE ENTRE CUIABÁ E A CHAPADA DOS GUIMARÃES
(ADRIANE fotografa as belezas naturais da área conhecida por “Portal do Inferno” na paisagem limite dos municípios de Cuiabá e da Chapada dos Guimarães. Ela conversa com ROSSI sobre o “corredor eletromagnético BIVAC”. A câmera acompanha a incursão aérea da fotógrafa pelo Mirante Geodésico, de dentro de um bimotor com capacidade para 4 passageiros.)
ROSSI — (enquanto filma ADRIANE ) — Essas fotos da Lagoa Azul, a caverna “Aroe Jari” ( “Morada das Almas”) documentam a primeira etapa da “Expedição Norton”. Até aqui tudo bem. E a proibição dos estrangeiros em terras indígenas?
ADRIANE — (sem parar de fotografar) — A Expedição obteve autorização do Ministério da Justiça, e deferimento do Ministério da Defesa. O NORTON se associou ao jornal para facilitar os trâmites burocráticos e jurídicos. Abrir as portas do Xingu para a Expedição, sem muitas delongas.
ROSSI — (irônico) — E milongas. O cara é esperto.
127. INTERIOR DO AEROPLANO. EXTERIOR. PAISAGEM. DIA. MORRO DE SÃO JERÔNIMO
(ADRIANE pede ao piloto que volte. Ela quer fotografar um cara que está posicionando-se numa borda de pedra no Morro de São Jerônimo. O avião aderna para a esquerda e refaz o trajeto em meio às serras, a tempo de flagar o homem lançar-se no espaço a 900 metros de altitude. ADRIANE observa o “paragliding” precipitar-se no espaço. E planar em direção ao solo.)
128. EXTERIOR. PAISAGEM/INTERIOR CARRO. DIA. ESTRADA
(A picape Xavante roda em direção à cidade de Paratinga. Nela estão ADRIANE, ROSSI e o índio guia UIRE. E um carona, XAMÃ KAPOGI.)
UIRE — Estrada não muito boa. Viagem longa. Até lá, Igapi (chuva miúda).
KAPOGI — (cantando a bola) — Posto Simão Lopes não muito longe. Chegar tarde da noite em hotel Paranatinga.
ADRIANE — (dirigindo-se a ROSSI) — Reservas no Danúbio Palace.
ROSSI — (cochilando) — Isso mesmo. Norte do Mato Grosso. — (Irônico) — Esse “clima tropical”. 460 metros acima do nível do mar.
ADRIANE — (irônica) — A turma do NORTON deve estar por lá.
NORTON — (entreabrindo os olhos vê raposas pretas e malhadas que cruzam a estrada em frente ao carro.)
129. INTERIOR. DIA. RESTAURANTE DO HOTEL
KAPOGI — (aproximando-se da mesa onde se encontra NORTON) — Expedição não pode seguir. Caciques não querer. Senhor precisa falar com Brasília. Indio YURUQUÁ muito influente no Xingu. Ele está em Brasília. E é o diretor geral do Parque.
NORTON — (falando pelo vídeofone) — Senhor YURUQUÁ, temos um trabalho a fazer dentro de um prazo. A Expedição não tem propósitos comerciais.
YURUQUÁ — (no vídeofone) — Os caciques do Xingu sempre temos propósitos comerciais, sr. NORTON. Reuni-los leva tempo...
NORTON — (contendo a irritação) — Essa Expedição inclui interesses dos povos da Floresta. — “A verdadeira natureza dessa Expedição nenhum de vocês nunca vai saber”. (NORTON rumina de si para consigo.)
YURUQUÁ — (irredutível) — Interesses da Floresta sabemos defender, senhor NORTON. Os seus interesses certamente não são os nossos.
130. INTERIOR. DIA. QUARTO DE HOTEL
(O casal de jornalistas brinda em homenagem à continuidade da Expedição. ADRIANA mostra-se sedutora. O corpo sob o jeans ginga sensual sob a atração do olhar atento de ROSSI.)
ROSSI — Chegamos até aqui. Certamente não vamos morrer na praia.
ADRIANE — Os gringos com certeza têm como resolver o impasse.
ROSSI — Grana! Índio quer grana. Índio não quer apenas apito, espelhinhos, colares de vidro. Todos sabem disso.
ADRIANE — Sem verdinhas o Portal do Xingu vai se fechar para NORTON. Algo me diz que a Casa da Moeda vai estar aberta para os caciques.
(A bunda e os gestos de ADRIANE ganham um molejo voluptuoso aos olhos seduzidos de ROSSI. De repente os seios e a cintura dela assim como os gestos e a tonalidade da voz, ficam cheios de graça. Provocantes.)
ROSSI (aproximando-se dela, acaricia os glúteos. Os dedos passeiam suaves, mas decididamente, por sobre as linhas laterais, descendo à parte posterior da fossa ilíaca, acompanhando com a ponta dos dedos o vinco entrevisto no interior da calcinha de rendinha amarela transparente.)
(ADRIANE realça os seios frente às faces excitadas de ROSSI. Ele logo mergulha a língua na greta apertadinha entre eles, concentrando-se a ponta da língua na curvatura que separa os mesmos. Estica os lábios em direção à rosácea da mama esquerda e começa a sugar de uma forma ao mesmo tempo delicada e selvagem.)
O casal mergulhado nos lençóis intensifica a malhação erótica no vai-e-vem dos quadris. A câmera afasta-se aos poucos enquanto se intensificam os gritos e sussurros da mulher sob a influência de um longo e gradativo orgasmo.
131. EXTERIOR. DIA. INTERIOR. HELICÓPTERO
YURUQUÁ — (entrando no helicóptero, enquanto conversa com NORTON) — Reuni-los, leva tempo. E dinheiro. O senhor manda buscar caciques para a reunião no Posto Leonardo. ARITANA influente. Ele vai fazer sair a permissão de entrada nas terras Kalapalo.
NORTON — (põe uma pasta de mão sobre os joelhos) — A autorização precisa sair amanhã. Os recursos dessa Expedição são limitados. Há um cronograma a cumprir.
YURUQUÁ — (confiante e persuasivo) — ARITANA lidera outros caciques. O que conseguir com ele vale para LOKAJARA e AFUKARAN, líder dos Kuicuros. Eles decidem descida pelo rio, passando pelas aldeias. Assembléia dos caciques fácil de reunir com helicóptero trazendo-os para o local da reunião.